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Palavra do leitor

As Jeremiadas

"Se não queres ser bem visto ou aceito, distorça a verdade, mas como poderás manter a sua consciência livre e digna, sem a mesma?’’

‘’O evangelho não nos promete a eternidade, como um estado de espírito, mas viver no Eterno e este que chega, até nós, todos os dias, para nos alcançar, em nossas singularidades e diferenças’’.

‘’A vida sem Deus pode ser definida como uma vida sem gente, sem compaixão, sem canto, sem sonhos e redigida por uma fé chata. Afinal, toda vida cristã se estiver de portas fechadas para a vida, sem sombra de dúvida, não compreendeu que a alma da vida eterna é o amor, é a esperança e é a paz’’.

Jeremias 38.4 e Lamentações de Jeremias 2.12-14

O mau agouro, o pessimismo, a derrota, a tristeza, o não vai dar, o não será possível não são termos bem vistos e aceitos pelas pessoas, na sua parcela majoritária, como também, parece haver uma desconfiança, uma olhadela de incredulidade e desdém para aqueles que evocam a alegria, o otimismo, a conquista, o vai ser possível, o há meios para ir adiante. Seja de um ou de outro lado, ao desembarcamos no texto de Jeremias 38. 4 e de Lamentações de Jeremias 2. 12 a 14, com o título dessa prosa ora denominado de as Jeremiadas, encontramos um profeta e suas avessas posições, porque declara o não prevalecer do Reino de Judá, visto, então, como uma boca de calunia, de difamação, de impropérios, de vituperações, como um convidado inoportuno e não bem recebido, um estraga prazer. Ora, num discurso até abstruso ou confuso, para muitos, num primeiro momento, o profeta Jeremias, o autor de a síndrome das Jeremiadas, aponta para o chamado a vivenciar a verdadeira alegria, a mais autêntica felicidade, a mais pura e específica liberdade e dignidade, porque suas palavras atacam a mentira, o engano, o faz de conta, o me engana que eu gosto, as aparências, as manipulações sórdidas e imundas. Presumidamente, as Jeremiadas descortinam a passividade e a hipocrisia das consciências indiferentes, das almas enredadas pelas divagações e pelos corações insensíveis, duras, fechadas e aversivas. Não por menos, vale-se do martelo do que é certo para despedaçar as carapaças das conveniências (de que está tudo bem e não está; de que a vitória virá e não virá; de que vai haver um jeito e não vai; de que tudo acontece, por causa do destino, da malignidade, do outro, de Deus, mas é por suas escolhas e decisões).

Ao ler e caminhar pelos meandros ou enredos das Jeremiadas, encontro o profeta Jeremias sem papa na língua, sem se mancomunar, sem se aliar em apenas remover nossas ilusões e nos leva para encarar nossas desilusões de frente, sem nos fazer complacentes com a desesperança, com a infelicidade, com o comodismo, com o é assim mesmo, está tudo bem, Deus sabe de todas as coisas e tudo compõe sua vontade soberana. Não e não, tanto aquele que quer se esconder em seus desastres quanto aquele que acredita em permanecer numa bolha, ambos, tem suas misérias reveladas como misérias mesmas (porque muitos se acomodam em tais) e não poupa nem supostas vangloriações (por pertencermos a idéia de termos sido o povo escolhido, predestinados, santos e etc), por serem superficiais e sem valia nenhuma.

Quantos não se escondem nos naufrágios das perdas e das ilusões (do casamento que se foi, dos amigos que se foram, dos filhos que se foram, do emprego que se foi, do projeto que se foi, do convite que se foi, dos sonhos que se foram e afins), como um recanto seguro para não mais arriscar, para não mais ousar, para não mais se refazer, para não mais prosseguir para o alvo (o alvo de fazer com que a vida valha sentido, destino e motivo). Em meio a essas capilaridades, como um reduto, as Jeremiadas desmorona todas essas pretensas satisfações, contentamentos e credulidades medíocres, pífias, irrisórias e sem importância. Nada e ninguém escapa, seja o melancólico ou o fanfarrão, seja o cético ou o crente, seja o racional ou o espiritual, o místico ou o empírico, seja o progressista ou o conservador, seja o de direita ou o de esquerda, seja o otimista ou o pessimista, seja os aderidos a movimentos sociais ou não.

Grosso modo, as Jeremiadas procura nos mostrar e nos demonstrar de que não há como obter o caminho da alegria, da felicidade, da esperança, quando desprezamos e anulamos a verdade, a justiça e a paz (quando negamos nossa própria verdade), quando não consideramos o quanto ser simples é ser verdadeiro, é ser livre e é ser modificador e não preso as vaidades ou as ilusões daquilo que não somos, não devemos ser e não precisamos ser. Ademais, implica romper em não permanecer na ofensa da raiva e do orgulho e se abrir para a oferta da alegria, da verdade e do recomeçar.
São Paulo - SP
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