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Palavra do leitor

Ano-Novo: Tempo para reescrever a vida

"Ao me olhar, diante do espelho, como eu sou mesmo, possa dialogar com as lágrimas’’.

Êxodo 32.1-6

A minha infância e, quem sabe, a de muitos, foi marcada por escutar, por ler e por assistir as histórias da Branca de Neve, do João e o Pé de Feijão, da Cinderela, de João e Maria e outras narrativas que fecundaram o nosso imaginário e a ideia de um final feliz, como se ser feliz não houvesse espaço para reescrever a vida. De observar, certa feita, li sobre uma peça teatral, não me vem o nome agora do autor, a qual discorria de que a Branca de Neve ouve do príncipe que queria ser aventureiro; de que a esposa do Gigante, morto pelo João, desce, com seus dois filhos, também, gigantes, para se vingarem; de que o lobo tinha sido injustiçado pela Chapeuzinho Vermelho. Ora, onde quero chegar, sem nenhuma ladainha? Muitas pessoas ou muitos de nós, crescemos com as ideias de sonhos que não acabam ou não devem ser reescritos, quando isso não condiz com a verdade. Quantos encontros começam no fluir da mais intensa e sincera alegria, mas terminam nos estilhaços das acusações, das hostilidades, das ofensas e dos abusos. Vale dizer, como isso se desdobra para todas as vicissitudes ou as alternâncias da vida ou será que venho, aqui, dissertar palavras fúteis, tolas e sem efeito? Nessa linha de abordagens, retomo a mencionar sobre Moisés e o seu sonho de que aquele povo seria a referencia de uma liberdade alicerçada segundo a responsabilidade pelo outro, de que conseguiria formar um povo regido por princípios éticos e morais elevados, de que aquele povo deixaria um legado de transformações e modificações benéficas e o resultado disso aconteceu? Ao abrir as gavetas da trajetória de Moisés, o mesmo enfrentou respostas nada apetecíveis ou apreciáveis e poucos não foram os eventos de decepções. Então, como proceder diante de sonhos dissolvidos, projetos desmoronados, relacionamentos sem mais nenhum significado? Não sou Deus, não quero ser também e muito menos me apresento como a verdade de ninguém e, diametralmente oposto, um dos caminhos mais efetivos para se levantar, quando Moisés enfrenta o episódio do Bezerro de Ouro, com as tábuas se espatifando, coopta ou agrega três fundamentos. A começar, por aceitar, sem fatalismo ou remorso, de que não temos controle sobre tudo e isso nos faz passar para constatação de que nem tudo o que acontece é por nossa causa e, por fim, situações se apresentam, porque faltou algo do outro lado. Digo tais colocações, até para evitar o desembocar de especulações disso, daquilo e acolá (olha talvez você não fez isso ou deveria agir assim ou ouvir outros) e permitir aos atingidos pelos sonhos despedaçados dialogarem com as lágrimas, olharem para os pedaços para não submergir nos desfiladeiros obscuros e gélidos da culpa, da condenação e do coitadismo. O interessante, referente a situação do Bezerro de Ouro, porque as tábuas quebradas não foram apagadas e permanecidas nos registros, ao lado das tábuas inteiras e, mesmo assim, Moisés retorna com a versão das tábuas inteiras e prossegue, sem ilusões e sem ser falso consigo mesmo. Por fim, os nossos pedaços não serão deletados, não serão destruídos, são partes de nossas lembranças e memórias, mas sem o poder de ditarem o que podemos vir a ser, sem desmerecer até os momentos bons que vivenciamos.

Baruch Há Shem!
São Paulo - SP
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