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Palavra do leitor

A volta de Deus na teologia contemporânea

Deus é o encanto da teologia. Mas, a despeito do interesse que a teologia tem por Deus, nem sempre conseguiu manter homens atentos para com a realidade de Deus. Em diversos momentos da história a realidade de Deus foi questionada e o centro onde Ele reinava foi desejado. Vejamos neste breve ensaio como isto aconteceu e como o interesse pela realidade divina retornou em épocas recentes.

Antes da modernidade se inserir como uma lente com a qual a realidade seria compreendida, esta era discernida como tendo o seu ponto de partida em Deus. Ou seja, Deus era a base da realidade. Destarte, a teologia, que se propunha a explicar a relação entre Deus e a realidade, dominava o discurso. Não apenas o discurso religioso, mas também os demais campos do conhecimento, pois estes, embora seculares, também estavam sujeito à análise teológica. A Teologia, portanto, buscava encontrar o elo de encadeamento entre Deus e as expressões do conhecimento humano. Este conhecimento estava influenciado e até mesmo aprisionado pelo dogma religioso. A autoridade religiosa falava em nome de Deus como seu porta-voz . A idéia de representação no mundo pré-moderno era intensa. A monarquia absolutista, por exemplo, era a expressão política da compreensão pré-moderna de representação. O soberano rei era ordenado por Deus e esta doutrinação política era resultado do discurso dogmático da religião no que tange este campo de ação . Assim, Deus, era a causa e explicação de tudo quanto existia. O discurso teológico lastreava todas as tentativas de compreensão e descobertas. Assim Deus era a explicação, o encanto, o assombro e “a medida perfeita de todas as coisas” .

Como na pré-modernidade Deus era o fundamento da realidade, o conhecimento sobre Ele era estimulado e para, de fato conhecê-LO, o acesso era a revelação. As Escrituras Sagradas conferiam este acesso, pois suas páginas apresentavam Deus, revelando-se em Cristo. Era desta forma que os teólogos patrísticos e medievais, personagens da era pré -moderna, entendiam. Deus era o Mistério Último .

Este cenário dominou o pensamento ocidental por séculos. Houve, sem dúvida, questionamentos e alternativas, mas a tese sobreviveu até a René Descartes, quando então, um novo paradigma foi apresentado e novas lentes passaram a fazer a leitura acerca da realidade. A razão entre em cena, enquanto que Deus, isto é, o discurso que o tinha como fundamento da verdade, sai.

A Ausência de Deus na Modernidade
Em 1637, em Leiden, na França, René Descartes, publica seu tratado matemático e filosófico, conhecido como "O Discurso do Método". Obra que celebra a razão como critério da verdade. O discurso teológico (e a autoridade eclesiástica) passou a ser questionado. O Cartesianismo foi uma proposta epistemológica, isto é, uma doutrina do conhecimento, porquanto o discernimento da realidade dependeria tão somente do crivo da razão.

A razão passou a ser a autoridade. Para se conhecer era necessário empregar métodos, onde a experiência, a observação científica (empirismo), estabeleceria o que deveria ser crido e o que deveria ser descartado como falso. Este método influenciou profundamente a cosmovisão da sociedade ocidental, até então marcada pelos axiomas do cristianismo. Os campos de saber foram marcados pela ênfase do cartesianismo. A própria teologia foi influenciada, pois, sendo uma área de conhecimento, a razão deveria também ser utilizada na teologia como critério da verdade teológica. A observação cientifica também seria convocada para julgar o discurso religioso.

A própria existência de Deus passou a ser analisada sob o viés do racionalismo. Como os métodos científicos não podiam satisfatoriamente responder as questões levantadas quanto à realidade de Deus, o agnosticismo (a impossibilidade de se conhecer conclusivamente), o deísmo (um Deus existente, mas distante), o panteísmo (um Deus imanente), o panenteísmo (um Deus em que todas as coisas estão contidas), e até mesmo o ateísmo (Deus inexistente) foram confirmados como propostas para explicar tal realidade. David Tracy afirma que “a realidade de Deus foi reformulada a fim de ser adequadamente entendida por uma mente moderna” . Ou seja, como na era moderna o homem se emancipou da religião e a razão tornou — se senhora e juíza de tudo e de todos, as afirmações teológicas precisariam convencer esta razão. Deus, então, que está contido no discurso teológico, semelhantemente, precisava ser analisado sob a perspectiva racionalista.

A influência do racionalismo soprou sobre a teologia. O Liberalismo Teológico Alemão, movimento do final do século XVIII e que chegou ao seu auge no século XIX, empregava elementos do racionalismo para questionar doutrinas históricas do cristianismo.

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