A unção do cachorro e do gato

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Talvez você já tenha lido o livro "A teologia do cachorro e do gato" de Bob Sjogren e Gerald Robson. Os autores fazem uma criativa comparação entre o comportamento desses bichos domésticos em relação aos seus donos com as atitudes das pessoas no modo como se relacionam com Deus. Mas será que você também já ouviu falar em "unção do cachorro e do gato"?

Pois é, senhoras e senhores. Foi isso mesmo que eu ouvi, ou melhor, li, com esses meus olhos carnais. Um pastor divulgou em seu perfil do Instagram um post com o seguinte apelo: "Tragam seus queridos bichinhos de estimação para receberem a unção com óleo e serem abençoados". A princípio pensei que fosse fake ou meme, mas analisei com atenção e vi que se tratava de uma prática real. Aquele homem, de fato, ungia cães e gatos.

A concorrência no mercado religioso está muito voraz. Os pastores mais pragmáticos, capazes de tudo para não perder clientela, investem pesado em lançamento de produtos e serviços diferenciados, criativos, mirabolantes, místicos e exóticos que atendem aos mais variados gostos dos consumidores da fé. Esse pastor que citei acima, por exemplo, percebeu que esse negócio de ungir objetos e bens dos fiéis já não está mais tão em alta. Muitos já fazem isso. Aí, em uma bela manhã de sol, suponho eu, sentado no aconchegante sofá de sua sala de estar, ele pensou: "por que não oferecer a unção para cachorros e gatos"? E logo mandou uma mensagem pelo WhatsApp ao líder de comunicação e mídia da igreja: "Faça um anúncio bem interessante e jogue na rede".

Creio que você concordará comigo que esse pastor é inteligente e captou bem uma demanda que ainda não era suprida pela indústria religiosa. Segundo uma matéria publicada no site InfoMoney em 13 de Abril desse ano, o mercado pet no Brasil é o terceiro do mundo em faturamento. A jornalista da revista Você S/A, Mariana Poli, diz que esse crescimento ocorre "graças a mudanças no comportamento dos donos de animais de estimação".

Quando eu era criança lá em Itaperuna (e olha que isso não faz muito tempo), cachorro era só cachorro, gato era só gato. Hoje, eles alcançaram o status de filhos e, muitas vezes, substitutos afetivos na vida de casais modernos e independentes que acham super brega ter filhos humanos. O pet tem um custo financeiro e emocional muito menor (não vai para a faculdade, não se rebela na adolescência e não atrapalha a independência do casal super descolado, viajado, emancipado e empoderado).

Se investidores espertos aquecem o mercado pet com produtos e serviços inovadores para conquistar um dono ou dona("pai" ou "mãe") cada vez mais exigente, os empresários da religião não iriam ficar para trás, não é mesmo?

Ficará cada dia mais difícil para os pastores sérios competirem com figuras desse tipo. Imaginem a proporção que isso pode tomar. Um cara vai chegar no pastor e dizer: "trouxe aqui o meu cachorrinho para ser batizado". Uma jovem pedirá: "pastor, minha gatinha morreu e quero que o senhor faça o culto fúnebre". Um casal suplicará: "meu "filhinho" está gravemente enfermo; quero que o senhor o unja com óleo santo". O pastor fiel às suas tradições não atenderá aos pedidos e os insatisfeitos abandonarão a igreja e se unirão ao pastor dos pets. Novas igrejas surgirão!

Os críticos dizem que, apesar do explosivo crescimento numérico dos evangélicos no Brasil, não ocorrem grandes impactos na sociedade e na cultura. Quem sabe, então, uma nova geração de cachorros e gatos ungidos fará a diferença na nossa nação?

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Opinião do leitor