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Palavra do leitor

A tabacaria, o quarto e o jardineiro

Descolamento
Enquanto tudo é sonho, coisa real por dentro
Lá está a tabacaria do outro lado da rua, coisa real por fora

Dividido entre a lealdade que devo aos dois
Não sou nada
Nunca serei nada
Não posso querer ser nada
A parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo

O que existe no sonho
O que existe fora de mim
Por que não são um?

Os sonhos que me habitam
O tempo não os respeita
As intempéries, tão pouco
As doenças, menos ainda
Tudo é suor do rosto e ervas daninhas
A realidade, fora, se impõe, e os devolve, dentro
Onde cabem todos, sem apertos
No espaço infinito do coração
Dilatado pela eternidade posta nele

Já tentei de tudo e seu oposto
Abraçar o real de fora, esquecendo do real dentro
Mas não foi possível falsificá-lo em sonho impossível
Mesmo que o gosto do vinho me alegre o coração
E a beleza da brisa do fim de tarde me abrace
Não é possível, uma vez tendo sonhado
Ser Esteves sem metafísica

Mil vezes tentei e fracassei, pois os sonhos não adormecem
Quando então decidi ser o que sonhei
Mas, só no sonho, sem necessidade da física,
Sonhei até o alto, cheguei ao infinito
Mas quando acordei, estava sozinho
E a realidade se aproximava de um pesadelo tangível
Pois os homens, estes sim, envelhecem,
Passam voando, deixando pra trás os sonhos
Estes caminhantes sem pressa, de outro relógio

Assim passei meus dias
Atravessando aquela rua,
Ora num sentido, ora no outro
Entre os aromas da tabacaria com gosto de saudade dos sonhos só sonhados
E todos os rascunhos que tentei,
Inadequados para aquele quarto úmido, embora com a janela aberta
A angústia era a faixa de pedestre pela qual atravessava a rua
A dúvida, o sinal vermelho que me atrasava o retorno
Às noites, vez de quando, atravessava-me o sono
E me visitava a realidade inteira, crua
Não separada pela extensão do universo,
E, consciente de que estava sonhando,
Tudo era de fato, até que acordasse.

Assim vivi, nestas idas e vindas,
Até que vi um jardineiro preparando o canteiro da próxima estação
Fazia sulcos na terra, e em cada um não colocava uma, mas muitas sementes
Afinal, ele não sabe qual vai vingar
Havia também alguns brotos, já nascidos,
Porém, entremeados se atrapalhavam
Dariam belas flores se houvesse espaço, tempo
Mas sabendo o jardineiro que precisam de raiz
Arrancou alguns, para deixar crescer outros
Aqueles, porém, ainda serviriam de adubo para estes
Havia enfim, outras flores, já prontas,
Cujo aroma leve mudava os ares daquela rua

E assim, aquele jardineiro, sem falar me mostrou
Que no canteiro da existência
Sonhos são como sementes
E há que se cultivá-los nos sulcos do coração
Não só um, nem só dois, pois não se sabe qual irá germinar
Não é possível, porém, sonhar todos de uma vez
Pois a terra produz ervas daninhas
E no espaço-tempo não cabe o infinito do coração
Mas aqueles, passados, ainda adubam estes, presentes

Sonhos são sementes, plantadas no coração
E as flores são os sonhos que acordaram do lado de fora
A enfeitar a vida com seus aromas, reais, dentro e fora

De modo que, a vida possível, real,
Não é nem dentro, nem fora
Mas encarnação, de dentro pra fora
Síntese, que acolhe o sonho, para que se tornem, fora

É preciso ser jardineiro
Que semeia no chão da existência
E contar com sol e chuva
Não importando se caminho é árido
Pois a esperança de colher,
As mãos que se sujam de terra,
E as lágrimas que o regam,
Fazem manancial

De modo que a realidade,
Teimosa, imprudente, imprevisível
É tanto o canteiro que limita o sonho
Quanto o chão onde ele pode nascer
Único lugar possível do real
E a vida um semear insistente
Que a despeito da imensidão do sonho caminho
Não desiste de prosseguir

Assim é, não só com o sonho,
Mas com tudo que é eterno, amor
Que só pode ser real
Se projetado no tempo e encarnado no espaço

Por enquanto,
Não há outra chance além deste rascunho,
Semente, tentativa, insustentável ser por fora
Densa de esperança, eternidade pesada por dentro
Nem há metafísica possível,
Fora desta finitude presente
E sem a substância física com sabor de suor

Até que tudo se conserte, se ligue
E todos os sonhos possam florescer em paz, sem fim
Quando quarto, tabacaria e rua serão um só e,
Sonhando de olhos abertos, acordar não será preciso

Artur Fassoni
Dresden, outubro de 2024
Unaí, janeiro de 2025
Itajubá - MG
Textos publicados: 1 [ver]
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