Por Vitória Maria

A busca por sentido, origem e destino da humanidade são questões que permeiam os esforços da filosofia desde o seu fundamento. Essa procura pode ser localizada no livro Confissões. Nessa obra, nos deparamos com as aflições e questões que atingem a vida de Agostinho. Em cada página, o Bispo de Hipona narra muito mais que uma autobiografia, pois discorre também sobre a sua busca de sabedoria.

Apesar da distância temporal, essa também é uma questão que nos atinge. Buscamos onde repousar. Para isso, precisamos de um lugar para chamar de lar, onde encontramos respostas que transmitem segurança. Agostinho soa como um contemporâneo, pois é possível que nos identifiquemos com suas aflições.

Assim como ele, buscamos nos encontrar, entretanto, por vezes adotamos a mesma postura do filósofo: olhamos para fora, quando a luz está em nosso interior. Debruçados sobre as histórias encontradas nas Confissões, localizamos um imigrante fora da sua terra natal, em busca de respostas satisfatórias para as agruras que atingiam a sua existência.

Essas não foram respondidas nem pela cultura, muito menos pelos países onde ele passou, elas só puderam ser obtidas quando o próprio encontra a Deus. Agostinho conta que “alcançar a Deus, isto é, conhecer e amar a verdade, é a única felicidade que pode satisfazer o espírito humano”(AGOSTINHO, 2005, p. 14).

James K. A. Smith nos auxilia a compreender um pouco mais sobre as inquietações de Agostinho, no tocante ao não pertencimento a um lugar físico. Visto que, “aqui ele nunca estará em casa. (…) ele fica entre mundos, entre classes, caindo pelas rachaduras do pertencimento em virtude de sua emigração e retorno”. (SMITH, 2020, p. 63).

Assim, entendemos que enquanto criaturas feitas por Deus, encontramos nosso refúgio nele, mas também sabemos que essa terra não é o nosso destino final, somos imigrantes. Assim, a nossa plena alegria está em “chegar ao lar em que nunca” (SMITH, 2020, p. 63) estivemos.

O verdadeiro refúgio

Apesar de nos encontrarmos em uma posição intermediária, do ‘já, mas ainda não’, é necessário contentamento para podermos caminhar. Um dos primeiros passos para isso é entender a soberania de Deus em todas as questões que permeiam a nossa existência. “Todo o conhecimento aqui nesta terra continua a ser parcial: caminha pela fé, e não por vista” (BAVINCK, 2019, p. 77).

Por meio das nossas próprias competências, compreender essa realidade pode ser um convite tentador para desenvolvermos o “sentimento de frustração, futilidades, de jamais chegar e de nunca se sentir firme consigo” (SMITH, 2020, p. 57). De fato, não estamos. Precisamos de um refúgio e ele existe. Deus é o único capaz de nos trazer o verdadeiro contentamento. Portanto, percebemos que a estrada trilhada por Agostinho mostra que todos os esforços empenhados para conhecer, ter, saber e nos encontrarmos são vãos se estiverem atrelados a uma negação do Criador.

Confissões nos auxilia a entender que não pertencemos a esse mundo, mas enquanto estamos nele precisamos ser servos obedientes em toda nossa forma de viver. “Sem ti, o que sou eu para mim, senão um guia a caminho do abismo?” (AGOSTINHO, 2005, p. 67). Não somos capazes de salvar a nós mesmos, muito menos de resolvermos todas as nossas inquietações a partir das nossas limitações. Enquanto imagem e semelhança de Deus, pertencemos a Ele e só nEle conseguimos a segurança de saber que um dia o imperfeito não mais existirá.

Referências

AGOSTINHO, Aurélio (Santo Agostinho). Confissões. Tradução de Maria Luiza Amarante. 3. ed. São Paulo, SP: Paulus, 2002. Edição Kindle.

ANTISERI, Dario; REALE, Giovanni. Filosofia: Antiguidade e Idade Média, vol. 1. Tradução: José Bortolini. Edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2017. 704 p.

BAVINCK, Herman. A filosofia da revelação. Tradução de Fabrício Tavares de Moraes. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2019. 342 p.

HALL, Stuart; HUGHES, Helen; KHOURY, Yara Aun. Raça, cultura e comunicações: olhando para trás e para frente dos estudos culturais. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados de História, v. 31, 2005.

SMITH, James K. A. Na estrada com Agostinho: uma espiritualidade do mundo real para corações inquietos. Tradução de Elissamai Bauleo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020, 264 p.


  • Vitória Maria é jornalista, estudante dos programas de tutoria em teologia e filosofia do Invisible College, mestranda em comunicação pela UFRB. Congrega na igreja Assembleia de Deus, em Tanquinho, Bahia.

 

 


Saiba mais:

» A influência de Agostinho sobre os reformadores: Um coração flechado pelas Escrituras

» Uma lição sobre política em Agostinho de Hipona

» Nem que eu bebesse o mar

» As orações de Mônica em favor do maior teólogo da antiguidade

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *