Por Daniel Theodoro

O discurso da esperança não chega às trincheiras da batalha onde mortos se amontoam e futuros são mutilados. Esvazia-se de sentido antes mesmo de alcançar a linha de frente da guerra, lá a verdade é a primeira vítima a morrer.

É comum sujeitos vocacionados à esperança sentirem-se inúteis em meio a grandes tragédias humanitárias, episódios que espalham o sabor do luto rapidamente. Eles sabem que mesmo as palavras certas não podem trazer de volta vidas encerradas, nem oferecer pleno consolo a familiares e amigos.

Então vem a dúvida: qual o sentido da esperança quando a gente perde a expectativa em esperar pelo melhor?

O escritor e acadêmico C. S. Lewis viveu a desesperança de duas guerras. Na primeira guerra mundial, Lewis fez parte da infantaria britânica. Perdeu amigos no campo de batalha e criou aversão a discursos vazios acerca da esperança em meio ao caos humano. Talvez para o jovem Lewis, o frágil eco esperançoso na tragédia tenha soado como um ruído, uma tautologia verborrágica sem propósito.

Durante o horror da segunda guerra mundial, o autor de Crônicas de Nárnia encontrava-se reconciliado com a fé cristã e acabou sendo convidado pela BBC de Londres para participar de uma série de programas de rádio. O objetivo do show era transmitir aos britânicos melhores perspectivas a respeito da vida diante de tanto sofrimento diário. A tarefa de Lewis era arriscada, porque ele poderia se tornar aquilo que criticara no passado, se transformar num insensível teórico da dor alheia.

Mais tarde, as falas de Lewis em defesa da esperança sob a perspectiva judaico-cristã seriam reunidas num livro. Cristianismo Puro e Simples é um clássico da literatura cristã mundial e um refúgio ao intelecto cansado. Mais que isso: nela Lewis convoca todos os vocacionados à esperança para que deixem de lado o discurso e passem a viver a esperança de modo efetivo.

Lewis propõe que a esperança capaz de produzir efeito real é resultado da reafirmação de princípios essenciais à existência humana e adoção de simples práticas que conectam o sujeito ao eterno. Diante da iminência da morte, não se deve perder tempo com devaneios filosóficos/teológicos que empurram o sujeito para longe do propósito para o qual ele foi criado; nem se esquecer que somos todos muito mais que simples acidente cósmica, somos seres criados à imagem e semelhança de algo muito maior.

Uma esperança pura e simples ancora-se na convicção de que Deus rege o universo e a humanidade, a qual um dia rebelou-se contra o Criador e foi destituída, porém reconciliada por meio de Jesus Cristo, aquele cuja presença faz nosso coração transborda de esperança através do Espírito Santo que habita em todos os vocacionados.

Essa certeza aponta para uma vida prática de contemplação por meio da adoração e oração, ações que trazem a eternidade para dentro do sujeito, lançando fora o medo de finitude trazido pela morte.

Ao contrário do discurso esperançoso – cuja retórica lembra um falatório motivacional sem alcance -, a esperança viva, pura e simples é um diálogo entre Deus e a humanidade, uma conversa que rompe barreiras e ganha espaço por meio do exemplo de vida pacífico e corajoso de seus vocacionados, os quais sabem que somente a virtuosa esperança pode colocar um prazo de validade ao sofrimento humano.

  • Daniel Theodoro, 33 anos. Cristão em reforma, casado com a Fernanda e pai do Matteo. Formado em Jornalismo e Letras.

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