Um fim de ano agridoce
Por Ioná Nunes
Ano Novo sempre traz um sabor agridoce. Você sente o gostinho amargo de 2020 misturado à doce esperança de que 2021 seja melhor. Desta vez, a gente não esperou dezembro chegar para refletir sobre a vida, a pandemia empurrou todo mundo desse precipício. Em queda livre, apenas certos das incertezas, refletimos sobre o significado da vida, prioridades e nossa total capacidade para sermos impotentes. Estar vivo em dezembro é um privilégio, mas ele chegou muito antes para todos nós.
Nada como tropeçar na finitude de nossa existência para buscarmos o Infinito. Se 2020 provou alguma coisa, foi que o aviso de “frágil” não vem somente em caixas com produtos delicados, mas também em cada ser humano.
Entre o pânico e a ansiedade, a gente dava uma puxada de ar para tentar respirar, porque até o ato realizado regularmente pelo nosso corpo tornou-se privilégio. O pulmão de milhares de pessoas ao redor do mundo parou… Os nossos ficaram assustados com a possibilidade de terem o mesmo destino…
A ansiedade fez todo mundo tremer na base e nos deu uma amostra de como nos sentiríamos se o ar faltasse. Finalmente o fôlego soprado em nossas narinas tornou-se tão valioso quanto o tempo perdido com individualismos e vaidades. Cada manhã em que o cheiro do café era inalado era uma vitória. A gratidão apressou-se em fazer as malas e morar em nosso coração. A simplicidade do cotidiano, os detalhes que perdíamos por estar sempre correndo começaram a saltar aos nossos olhos. O canto dos pássaros, o sol aparecendo por trás das cortinas de nuvens…
A impressão que eu tenho é de que a pandemia foi o divisor de águas que precisávamos para fazer cair as escamas da pressa e da desvalorização das primeiras e mais importantes coisas caírem dos nossos olhos.
A nossa vida poderia ter acabado em 2020. Não foi o muito querer ou incontáveis petições para não morrermos, foi apenas a misericórdia do Senhor. Se ela não tivesse nos consumido, nos teríamos sido consumidos. O medo de partir revelou o quanto estamos envolvidos com as coisas desta terra. Para nossa vergonha, apontou que nosso tesouro era qualquer coisa menos o próprio Cristo. Se assim fosse, a alegria que infecta nosso corpo e se replica como um vírus ao pensarmos em estar com ele teria dominado nosso coração. Mas porque Deus é bom, Ele tratou os nossos olhos como a lente de uma câmera e reajustou o foco.
2020 foi um lembrete da brevidade dos nossos dias e como a busca pelo Reino é constante e primária. 2020 é um memorial de que existem milhões de pessoas carentes de redenção e a igreja DE DEUS está aqui para leva-las até ela. 2020 foi um chá de semancol para qualquer cristão, um chá que com gosto de “a Bíblia é a ordem e Deus para o homem” e com cheiro de “e ela diz que sua vida deve ser moldada desde agora nos padrões do Reino vindouro”.
Mesmo que tenha sido agridoce, Deus fez todos os 365 dias de 2020 e mostrou a sua soberania sobre cada um, deixando bem claro que temos uma missão e que, morrendo ou vivendo, estaremos junto com Cristo.
Meu desejo é que você não gaste tempo fazendo uma lista de metas totalmente centrada em você mesmo em 2021, mas que você invista tempo em seu relacionamento com Deus e com o próximo. E que assim como Deus mudou minha oração desde que a pandemia atacou, que Ele também mude a sua. “Senhor, não me deixa ser inútil”, foi o que Ele me levou a dizer. E nada é mais inútil do que uma vida focada no eu.
Que em 2021, invés de deixar o medo tomar o lugar da gravidade e te prender ao chão, você deixe-o ser substituído pela esperança de estar com Cristo e de poder contar tudo como perda. Que você não fique triste ao esbarrar com as amargas mazelas temporárias desta terra, às quais você não controla, mas sorria ao pensar na doce alegria que a eternidade trará.
- Ioná Nunes, 24 anos. É jornalista e congrega na Igreja Cristã Evangélica.