Keyla Thyxaya (sobrenome indígena que vem da palavra txahá, que significa flor) tem 27 anos, é uma indígena da etnia Pataxó e faz doutorado em direito na Universidade de Brasília (UnB). Com uma trajetória diferente da maioria dos jovens indígenas, saiu de casa para cursar a faculdade de direito, tornou-se protestante e hoje trabalha com temas jurídicos relacionados ao seu povo.

Como você conheceu a Jesus?
Comecei a ter uma experiência com Cristo aos 13 anos quando tive contato com a Bíblia por meio de irmãs de caridade da Igreja Católica. Porém, a minha decisão de seguir a Jesus aconteceu quando eu tinha cerca de 19 ou 20 anos. Mudei-me para Belo Horizonte para iniciar meus estudos no curso de direito e, por ter ido morar com uma prima cristã, que frequentava uma igreja batista, comecei a acompanhá-la. Depois de um ano, participei de uma conferência e tive uma experiência verdadeira com Deus e a revelação de quem é Cristo. Lembro-me muito bem de que, desde aquele dia, eu afirmo que nada do que me disserem poderá tirar a certeza da vinda, morte e ressurreição de Cristo. Após essa experiência retornei para minha cidade natal, Carmésia, MG, para ser batizada na recém-fundada Igreja Indígena Pataxó.

Quais dificuldades enfrentam os indígenas cristãos?
Os indígenas cristãos, especialmente os universitários, enfrentam dificuldades para lidar com sua fé, sua cultura e os conhecimentos acadêmicos. Por outro lado, em alguns momentos parece que não somos “aceitos” em nenhum dos lados: para alguns cristãos, não somos considerados cristãos por mantermos a nossa cultura e, para alguns indígenas, estamos negando nossa identidade quando praticamos uma religião diferente da religião indígena. É uma situação complexa.

Há alguma barreira para o cristianismo nas tribos?
As dificuldades de se evangelizar sempre existirão e serão diferentes a depender do povo. Em alguns povos o medo de se perder a cultura é muito grande, em outros a influência da religiosidade dificulta o conhecimento do evangelho, e em alguns casos a barreira poderá vir de fora do povo indígena.

O que a levou a cursar direito?
Ao presenciar as diversas reivindicações por direito do meu povo, percebi como era necessário ter pessoas entre nós com conhecimento jurídico. Vi muitas vezes o povo indígena ser enganado com falsas promessas devido à pouca ou à total ausência do conhecimento de leitura e escrita de algumas lideranças. Esse tipo de acontecimento fortaleceu o meu interesse pelo direito.

Na sua comunidade, é comum que os jovens saiam da aldeia para estudar?
Faz pouco tempo que os jovens começaram a sair, e eu fui uma das primeiras a sair pra estudar. Posso dizer que a cada dia há mais jovens interessados em iniciar e concluir um curso superior.

Depois da formação, os jovens retornam à aldeia ou seguem a vida fora dela?
De modo geral os indígenas se formam e voltam para a sua comunidade, mas a ideia da nossa formação é para que tenhamos estratégias de sobrevivência e que ocupemos cargos fora da aldeia, mantendo a ligação com indígenas.

Para você, quais são as causas jurídicas mais urgentes para os indígenas no Brasil?
A demarcação de terras sempre será uma causa urgente. Para que tenhamos acesso às políticas públicas e ao básico para o desenvolvimento, é preciso haver demarcação. Não se trata de supervalorização do direito à terra em detrimento de outros direitos, mas de uma realidade jurídica que ajudará na efetivação deles.

Como a população brasileira pode contribuir para causas como essa?
Reconhecer a realidade indígena no Brasil e a diversidade cultural como um ganho, e não como perda. Saber que os indígenas são diferentes, não inferiores ou primitivos, e que querem ser respeitados em suas diferenças.

Publicado originalmente da seção Altos Papos da edição nº 376 da Revista Ultimato.

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