Diplomacia da Reconciliação
Por Daniel Theodoro
Enquanto os líderes de Estados Unidos e Coreia do Norte, Donald Trump e Kim Jong-un, conversam com seus botões e discutem o futuro da humanidade via Twitter, uma interação menos belicosa foi realizado nesta semana na tensa e discreta vila de Panmunjom, na zona desmilitarizada entre as Coreias do Norte e do Sul. Separados apenas por uma mesa, representantes dos países irmãos papearam por mais de onze horas e mostraram ao mundo que o caminho para uma possível reconciliação sempre se inicia no reestabelecimento do diálogo.
Tecnicamente em guerra desde 1953 – quando assinaram apenas um armistício e não um tratado de paz -, as duas Coreias viram os canais de comunicação se fecharem nos últimos anos por dois motivos. Em primeiro lugar, em função da crescente retomada dos testes nucleares por parte do regime ditatorial de Pyongyang, um movimento que preocupa toda comunidade internacional e até resultou em sanções econômicas aplicadas pelo Conselho de Segurança da ONU. Em segundo lugar, porque a histórica instável interlocução entre as partes perdeu seu equilíbrio com a posse de Trump, jovem governo marcado pela falta de habilidade na geopolítica. Coreia do Sul e Estados Unidos, parceiros nas áreas econômica e militar, assistiram passivamente ao aumento da tensão na península coreana e contribuíram para o aumento da mesma por causa da falta de clareza em dialogar com o ditador norte-coreano.
Por outro lado, contrariando a expectativa de muita gente, o encontro entre autoridades das duas Coreias teve um resultado positivo imediato: a confirmação do envio de uma delegação de norte-coreanos para os jogos olímpicos de inverno na Coreia do Sul, em fevereiro. Um seleto grupo de atletas, militares e torcedores do regime de Pyongyang terá acesso livre às atividades olímpicas em território sul-coreano. Historicamente, ações de diplomacia desportiva são temporárias e contribuem pouco para o fim de conflitos ou rumores de guerra, contudo a reaproximação das Coreias nos próximos jogos de inverno ganha significado relevante quando lembramos que desde Atenas-2004 as nações vizinhas não marcham juntas em uma cerimônia de abertura. Existe ainda a chance de que a temporária reconciliação entre as Coreias durante a realização dos jogos abra novos canais de diálogo entre os membros das duas delegações. Longe de gabinetes oficiais e do excesso de formalismo, acredita-se que os coreanos poderão se redescobrir irmãos nas arenas esportivas. Um avanço inquestionável.
Talvez a esperada coroa de louros fique mesmo para depois da cerimônia de encerramento dos jogos. Caso Estados Unidos e Coreia do Sul mantenham a suspensão dos exercícios militares programados para março na península Coreana, o mundo poderá comemorar a vitória parcial da paz na tumultuada região.
Há aqueles que dizem que Kim Jong-un não irá recuar e só aceitou enviar sua delegação olímpica porque quer melhorar sua imagem perante o mundo e diminuir os impactos das sanções econômicas sofridas. Dentro dessa perspectiva, a participação da Coreia do Norte nos jogos de inverno estaria longe de ser considerada uma mudança na relação com a Seul, seria apenas mais uma estratégia para se firmar como uma potência bélica mundial.
Uma reflexão mais profunda mostra que, antes de ser uma característica da boa diplomacia, o diálogo é um valor divino. Sob a ótica celeste, a reconciliação só pode ser estabelecida mediante conversa entre as partes, resultando na pacificação final. No exemplo máximo da reaproximação do Reino do Céu com súditos rebeldes, a comunicação teve papel fundamental a partir do momento em que Deus substituiu a provisória linguagem dos profetas pelo Verbo definitivo. Pensando nesse sentido, ainda é possível acreditar em um desfecho sensato para a crise na região do Mar Amarelo, embora seja impossível prever os próximos capítulos dessa novela coreana que preocupa a todos nós. Mas há esperança, porque há diálogo.
Daniel Theodoro, 33 anos. Cristão em reforma e presbítero na Igreja Presbiteriana Maranata de Santo André (SP). Casado com a Fernanda. Formado em Jornalismo e Letras.