Cinema: “Praia do Futuro” e a busca pelo outro
Por Gabriel Brisola
“Praia do futuro” é um filme que permite várias entradas. Como boa experiência cinematográfica que é, nos abre portas, nos mostra caminhos diversos nos quais caminhar. Experiências do tipo são raras, aprofundam nossa relação com a realidade, nos fazem perceber novos lados de um real que é ao mesmo tempo nosso e exterior a nós. Talvez venha daí minha dificuldade em escrever sobre o filme, uma obra que me oferece tantos nós, formando uma constelação de imagens que por sua vez me levam a outras e a sentimentos tão bem guardados dentro do peito. Karim Aïnouz é, por essa e muitas outras razões, considerado o maior diretor brasileiro em atividade atualmente.
Dividido em três capítulos, o filme conta a história de Donato, um salva-vidas, em sua relação com um turista alemão, quando o salva de um afogamento na praia do futuro, em Fortaleza. O turista, Konrad, acaba perdendo seu amigo nesse incidente. O filme segue com Donato indo para Berlim e, anos após o ocorrido, seu irmão mais novo segue a procura dele.
Creio que há núcleos comuns no filme de Karim: seus personagens, em sua maioria, estão em alguma fase de passagem e precisam passar por uma travessia para chegar ao outro lado, seja no sentido emocional e/ou físico. No caminho encontram o outro, no qual podem se apoiar, dividir, encontrar novas perspectivas. Ao serem abandonados, os personagens precisam abandonar o passado, o que não lhes é mais útil, o que não faz mais sentido no momento.
Donato e Konrad fazem esse movimento. O alemão encontra no brasileiro apoio quando seu amigo morre afogado, força pra fazer a travessia. Posteriormente é Konrad quem vai ser o apoio de Donato, quando este vai a Berlim. As mudanças são bruscas, dolorosas: é no olhar o outro, no ver-se com o outro e no outro que a travessia é feita. Nunca sozinho, nunca isolado, o outro faz parte do mecanismo de movimento do ser. Em “Viajo porque preciso, volto porque te amo”, o protagonista fotografa e conversa com prostitutas, numa tentativa de completar a travessia. Não sei dar nome a isso, mas a verdade está posta: só é possível conhecer-se no outro.
Mas o passado assombra. O passado é sempre atualizado, tal qual nossas voltas para a casa da infância. A travessia quase nunca é feita sem percalços, e em nossas tentativas de passagem há a marca indelével da debilidade e fraqueza humana. Donato some sem deixar vestígios. Vira um fantasma para a família e agora fala alemão. Seu irmão, Ayrton, vai em busca dessa sombra, e é confrontado com sua própria travessia: a busca para entender o irmão e seus motivos também é uma busca por si. Donato e Ayrton são quase o mesmo: calejados, brigam para alargar os caminhos estreitos que a vida oferece. E no confronto de irmãos, existe apenas aquilo que não é dito, que nunca foi dito, por estar enterrado fundo no peito, na dor, no confronto.
A vida se encarrega de tornar expresso aquilo que não cabe em nós, e não é diferente para Donato e Ayrton. No embate há conhecimento, no outro há conhecimento, construção, mesmo que doa, mesmo que sangre. Dizem por aí que a praia do futuro é um lugar lindo, mas ao mesmo tempo suas águas são muito perigosas.
As entradas continuam, as possibilidades do filme não se esgotam tão rápido: é um filme que nos eleva. Entrei por uma porta nesse texto e espero que quem assista entre por outras. Um último comentário: não citei em lugar algum a homossexualidade do casal retratado no filme. Antes de tudo, creio ser um filme sobre pessoas em suas buscas e travessias pela vida. Pessoas, gente de carne e osso, como eu e você. Espero que o carimbo “homossexual” não marque o filme de maneira negativa, como tenho visto acontecer.
Entristece-me profundamente os crentes terem facilidade e até prazer em assistir Capitão Nascimento torturar um morador de favela, mas condenar “Praia do futuro” por ter o mesmo ator em cenas de sexo com outro homem. Tal atitude e pensamento, que considero mesquinho, os privarão de um dos melhores filmes do ano.
Tendo dito essas coisas, considero os elementos levantados pelo filme como sendo profundamente relevantes para nós, cristãos ou não. E por que não dizer que os elementos são, em si, profundamente cristãos?
• Gabriel Brisola tem 24 anos, é formado em jornalismo e fotógrafo.
Nota da redação:
O texto acima é um resenha sobre um filme e foca a discussão sobre as relações humanas. O autor convidado não escreveu um texto sobre a questão da homossexualidade. Este não era seu foco. Vale informar que a Editora Ultimato é contra a prática da homossexualidade, mas não apoia a homofobia. Para saber a posição da Ultimato sobre a homossexualidade, clique aqui.
Paulo Henrique
Amigo, vc perdeu a oportunidade de fazer um bom texto. Vc quer que a galera vá ao cinema assistir a este filme? É isso mesmo? Se é tão bom como vc está falando, por que pouco mais de 100.000 pessoas assistiram? Isto segundo a última publicação da VEJA, ah, deixe-me advinhar: as pessoas não tem bom gosto. Por isso que o filme não decolou, né?
Amigo, como assim tenho o “pensamento mesquinho” por não querer ver cena de sexo entre dois homens? Se esta matéria fosse publicada em uma mídia secular, tudo bem, seria normal, mas em uma publicação CRISTÃ? Sério isso?
Que Bíblia está escrito que este tipo de relação é permitida? Vc ainda tenta salvar seu texto querendo puxar os seus argumentos para o Cristianismo, sinceramente, fico espantado com isso, como já disse anteriormente, esperava isto de uma mídia secular, não de uma dita Cristã.
Também tenho 24 anos, sou universitário, estudo a Bíblia diariamente, sou criado no Evangelho e muito esclarecido quanto a este tema. Inclusive já participei de inúmeras discussões na faculdade defendendo a posição cristã.