Por Alan César

Eu tinha ido a Jerusalém para participar da Páscoa. Fazia essa viagem uma vez por ano. Caminhava quilômetros e quilômetros para sacrificar um cordeiro.

Dessa vez, a cidade de Jerusalém estava tão cheia que tive que conseguir um lugar para me hospedar no campo. Quando foi sexta-feira bem cedo, fui até Jerusalém para comprar algumas coisas. Afinal, assim que ocorresse o pôr do sol, seria sábado e não poderia fazer mais nada.

Enquanto entrava na cidade, notei um enorme corredor humano…

Aproximei-me para ver do que se tratava e foi então que o vi pela primeira vez. Seu rosto estava desfigurado, mas seu semblante transmitia mansidão.

Não deu nem tempo de perguntar qual crime aquele homem cometeu para estar sendo condenado. Lembro-me que um soldado enorme me agarrou pelo braço e me obrigou a carregar a trave de sua cruz.

Era um madeiro pesado e sujo de sangue. Colocaram-no em minhas costas e agora quem chegasse ao corredor humano pensaria ser eu o criminoso. Que vergonha! Toda hora eu tinha que dizer “é ele o pecador, eu sou inocente, só estou ajudando”.

Carreguei  aquela cruz até o final da via dolorosa. Então, pegaram a cruz e pregaram nela aquele homem de rosto desfigurado e semblante manso.

Distanciei-me da cruz com pena do criminoso. Minha mente se perturbava dentro de mim, pois não deveria ter pena desse homem. Ele era um criminoso, afinal. Merecia estar ali.

A pena que tinha dele não me permitiu ficar olhando seu rosto, ficar assistindo sua vida se ofuscar na cruz. Fui cuidar dos meus afazeres. Desci do monte e me dirigi à feira de Jerusalém. Antes não tivesse ido. Chegando lá, de repente, ficou tudo escuro, mesmo sendo meio dia. Teve até terremoto. Virou uma confusão aquela cidade cheia de gente.

Voltei para o campo e perguntei para diversas pessoas se alguém sabia quem era aquele homem. Disseram-me que se tratava de um revolucionário que ameaçava o trono de César e que, por isso, foi crucificado.

Mas teve um centurião que falou algo diferente. Ele me contou que já tinha presenciado diversas pessoas morrerem na cruz, mas que aquela morte era diferente, pois mesmo em tal circunstância esmagadora, sua vida exalava Glória. Como “Glória” diante da derrota da cruz? Não fui capaz de entender. Além disso, o mesmo centurião me garantiu que verdadeiramente aquele homem era justo.

Hoje eu sei que se tratava do Messias, o Cristo. Sei, inclusive, que a cruz que carreguei era minha, e não a dele. Era eu quem merecia estar ali, pendurado nela. Descobri a razão de seu silêncio. Ele ficou calado, pois era a ovelha muda do profeta Isaias. Arrependo-me de ter reclamado de carregar sua cruz. Não devia nem ter levado meu cordeiro ao templo, não precisava ter feito isso. Eu já tinha estado diante do verdadeiro Cordeiro.

 

* Este texto é uma ficção. Não deve ser tomado como “real”.

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Alan César Corrêa

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