Eu os reduzi a pó, pó que o vento leva. (Sl 18.42.)

Não é a poeira das estradas, não é a poeira das eiras, não é a poeira dos desertos, não é a poeira dos lixões, não é a poeira das fábricas, não é a poeira das usinas atômicas, não é a poeira dos vulcões, não é a poeira do espaço sideral.

No sentido mais solene, o “pó que o vento leva” (Sl 18.42) é o que sobra do corpo humano algum tempo depois da morte somatopsíquica, quando se rompe o cordão de prata, quando se despedaça o cântaro junto à fonte e quando se quebra a roda junto ao poço. Então “o pó volta à terra, de onde veio, e o espírito volta a Deus, que o deu” (Ec 12.6,7).

A ordem “Retornem ao pó, seres humanos” (Sl 90.3) é radical, inflexível e irreversível.

O “pó que o vento leva” é também o último estágio dos grandes poderes que se deixam embriagar pelo poder e pela glória. No sonho da grande estátua, Nabucodonosor assistiu à derrubada do Império Babilônico. Viu o ferro, o barro, o bronze, a prata e o ouro virarem pó, “como o pó da debulha do trigo na eira durante o verão”. O mais sinistro, porém, foi a última cena: “O vento os levou sem deixar vestígio” (Dn 2.35).

O “pó que o vento leva” é o que resta da soberba física, da soberba intelectual, da soberba racial, da soberba tecnológica, da soberba científica, da soberba social, da soberba econômica, da soberba humanista, da soberba artística, da soberba filosófica, da soberba política, da soberba bélica, da soberba pornográfica, da soberba teológica.

Texto originalmente publicado no livro Um Ano com os Salmos.

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