Opinião
- 05 de abril de 2022
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Uma lição dos cristãos da Ucrânia para os cristãos do Brasil sobre a importância de congregar-nos
Por Paulo Teixeira
O povo da antiga aliança é povo que congrega, primeiro na itinerante tenda da congregação, o tabernáculo, posteriormente substituído pelo templo – e quando este faltou, ainda no exílio babilônico, nasceram as sinagogas, casas de convívio, estudo e ajuntamento dos que temiam o Deus de Abraão, Isaque e Jacó e queriam relembrar a sua fé, transmitindo-a às novas gerações.
Escrevo estas linhas numa manhã de domingo, bem cedo. A guerra na Ucrânia preocupa o mundo todo. Prestes a sair com minha esposa para a igreja, chega no meu celular um motivo de oração. É um bom amigo e irmão ucraniano que pede: “Por favor, ore pelas famílias que hoje não puderam ir à igreja aqui na Ucrânia. Que a paz logo chegue!”
O caro leitor pode imaginar como um pedido assim me sacudiu neste tempo em que o povo de Deus – forçado ao isolamento na pandemia – acostumou-se aos telecultos e reuniões virtuais, na comodidade dos sofás de suas casas.
Sim, talvez a igreja nunca mais volte a ser apenas analógica, mas daí a querer vivê-la unicamente na modalidade digital no mínimo afrontaria o pedido do irmão ucraniano que recebi e compartilhei no culto híbrido – presencial e virtual – de minha igreja em São Paulo.
Muita coisa – meios de transporte (que quase não pararam), o comércio em geral e centros de entretenimento (cinemas e parques) – já voltou praticamente à normalidade. Mas o vírus ainda parece ser mais letal na igreja, pois o povo está custando a voltar, mesmo com todos os cuidados e protocolos cuidadosamente observados. Que mensagem se transmite com isso?
Congregar é um dos jeitos mais básicos de testemunhar a fé, de dar força aos outros, de mostrar ao mundo que Deus existe e que ele tem filhos e filhas que convivem e o adoram como família espiritual. A comodidade do sofá às vezes reflete acomodação espiritual. Igrejas vazias representam uma conformação com o mundo, que põe amizades de redes sociais no mesmo patamar daqueles relacionamentos cultivados e vivenciados por anos e anos.
O conceito de povo traz em si as ideias de coletivo, de identidade e de interação. O Antigo Testamento fala de ´am (povo) e qahal (ajuntamento, arraial ou congregação de Israel). O Novo Testamento menciona o laós (povo, grupo) e ekklésia (igreja, congregação). É povo chamado e constituído por Deus com a missão de abençoar todas as famílias da terra e de ser sal e luz do mundo.
O povo da antiga aliança é povo que congrega, primeiro na itinerante tenda da congregação, o tabernáculo, posteriormente substituído pelo templo – e quando este faltou, ainda no exílio babilônico, nasceram as sinagogas, casas de convívio, estudo e ajuntamento dos que temiam o Deus de Abraão, Isaque e Jacó e queriam relembrar a sua fé, transmitindo-a às novas gerações.
No cativeiro, aliás, o salmista expressa a saudade do templo; mas no regresso à Judá, o profeta Ageu precisou exortar o povo a que aquela saudade não ficasse apenas nas palavras do Salmo 137, mas se materializasse em mobilização para a reconstrução da Casa de Deus, em Jerusalém. Embora a reedificação de uma estrutura arquitetônica fosse o mote do pós-cativeiro, o que estava em jogo era a reconstrução do povo da aliança, que, ao somar forças para erigir paredes, renasceria como povo reunido em torno de Deus e de sua Palavra, em aliança com Deus e uns com os outros.
O ponto alto da história bíblica é a vinda de Jesus Cristo ao mundo. O Filho pré-encarnado já se manifestara em momentos críticos do povo da antiga aliança como o mal´akh Yahweh – o Mensageiro do SENHOR, como na voz que falou com Moisés na sarça ardente (Êx 3) e em diversas outras ocasiões. Mas foi no nascimento de Jesus Cristo que Deus claramente deixou o modo virtual para estar entre nós, em carne e osso, em graça e verdade. O Emanuel, o Deus-conosco, substituiu o tabernáculo e o templo, andou entre nós, abraçou, aconselhou, advertiu, perdoou, restaurou, morreu e ressuscitou, dando-nos acesso ao Pai e à vida eterna. Subindo ao céu, deixou-nos a tarefa de testemunhar suas palavras e feitos, constituindo-nos seus embaixadores e mensageiros, seus pés, braços e bocas para semear a Palavra e plasmar o reino neste mundo.
Com a pandemia sob relativo controle – graças a Deus pelas vacinas! – e sem um conflito da proporção daquele que acomete a Ucrânia, como justificar a baixa assistência presencial em muitos de nossos templos? O pedido de oração daquele irmão da Ucrânia em favor dos cristãos impedidos de ir à igreja por causa da guerra ainda ecoa no meu coração, soando-me como inquietante clamor profético para trazer o povo de Deus de volta aos cultos e reuniões presenciais nas igrejas do nosso Brasil.
“Não deixemos de nos congregar...” (Hb 10.25a, NAA) para que não fique apenas na saudade o “Oh! Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos!” (Sl 133.1, NAA).
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