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Opinião

Por que precisamos de intelectuais cristãos?

Por Igor Miguel
 
Há muitos estereótipos sobre o que seria um intelectual. Há quem o imagine como aquele sujeito imerso em uma biblioteca, cercado de livros, pouco afeiçoado ao convívio social, ostentando um vocabulário pedante e pouco acessível, contemplativo e descolado da realidade. Acusações exageradas? Sem dúvida. Sem razão? De modo nenhum!
 
Como todo ofício, há aquela tentação de se condicionar o ser ao fazer, a identidade ao talento. Não é óbvio para muita gente, mas nossa cultura promove um tipo de salvação pelas obras, o que se torna evidente quando nos referimos a pessoas por sua profissão ou colocamos um título de ofício antes dos nomes, insistimos em “pastor Fulano” ou “doutor Ciclano”.
 
Entre os chamados à reflexão, o risco é o mesmo, o intelectual pode fundir ou procurar construir identidade em cima de sua vocação. Tal confusão origina-se em um tipo de soteriologia performática, uma busca por identidade pública associada ao empenho “cult”, a certo domínio vocabular ou de controle de um certo repertório cultural qualquer. O ar altivo pode funcionar como um mecanismo de defesa psicológica, carregado, com é de praxe, de muita jactância e narcisismo. Mas, engana-se que tal tentação é exclusividade daqueles inclinados aos livros, na verdade, é um mal que acomete o ser humano indiscriminadamente. O uniforme muda apenas de acordo com a escola farisaica que se está associado, no fim, é o velho traje improvisado com “folhas de figueira”, porém, com ares de sofisticação.
 
Entre evangélicos, tradição cristã a qual me identifico explicitamente, o problema pode estar no anti-intelectualismo, comum em algumas tendências pietistas. Com raízes na segunda geração da reforma protestante, o pietismo, com razão, denunciava certo formalismo dogmático que encontrava pouca consonância na vida espiritual daqueles que professavam a fé reformada. De fato, o intelectualismo entre cristãos confunde consentimento proposicional e doutrinário com vida efetiva e autenticamente cristã.
 
A reação pietista, inclusive entre seus descendentes modernos, foi empurrar o pêndulo do orgulho dogmático para o orgulho espiritualista e místico. Como disse, o orgulho é um mal humano com várias texturas, inclusive, nos contextos onde se enfatiza a experiência espiritual e mística em lugar da alegada frieza doutrinária e dogmática.
 
A saída à polaridade entre intelectualismo-racionalista e misticismo-experiencialista não é escolher um dos lados, mas está justamente em se negar a cair nesse falso dilema. Considere a possibilidade de uma intelectualidade que adora e de uma adoração que pensa. O problema é que associamos intelectualidade com racionalismo, mas na verdade, a intelectualidade é sempre serva de alguma coisa, seja Deus ou um ídolo. O problema não é a intelectualidade, mas a quem ela serve.
 
 
Como escrevo em meu livro A Escola do Messias, Deus nos deu faculdades cognitivas por razões doxológicas, isto é, pensamos porque adoramos. Se adoramos o Deus das Escrituras Hebraicas revelado em Jesus, tal adoração produzirá espanto e maravilhamento, o “temor do Senhor” que é o “princípio da sabedoria”.
 
Não basta dizer que precisamos de intelectuais, mas que precisamos de intelectuais que sejam realmente cristãos. Mas, o que isto significa? Cristãos têm razões próprias para sua vida intelectual. Sua intelectualidade não é neutra, antes, funda-se na maneira como Deus se revelou. Os ritmos, os princípios, a motivação e propósito para que um cristão se dedique à reflexão, contemplação, análise e leitura de livros e da vida, possuem como ponto de partida e chegada a revelação e a glória do Deus Trino.
 
O intelectual cristão não adere a jogos filosóficos cativos de ídolos culturais. Não importa quão fascinante ou elegante sejam os pensamentos de Kant, Hegel, Marx ou Foucault. Apesar de eventuais momentos de verdade, todas essas tradições intelectuais já nasceram obsoletas diante da sabedoria que jorra torrencialmente da revelação de Deus em Jesus Cristo e que foi entesourada pela Igreja de Cristo em sua longa tradição de reflexão, confissões, escritos e mestres. Historicamente, a Igreja Cristã é um depositum fidei, um contexto de sabedoria comunitária, lugar de obra do Espírito Santo. Por isso é essencial insistir que a intelectualidade cristã não pode ser mera reprodução de outras intelectualidades, há uma economia cognitiva que corresponde ao próprio cristianismo, sua tradição canônica, teológica e espiritual.
 
Uma boa ilustração da peculiaridade da intelectualidade cristã é a gravura de Philippe de Champaigne de 1650 em que retrata Agostinho de Hipona. Nela, o grande doutor do cristianismo é descrito segurando um coração inflamado diante das Escrituras, cujas chamas se dirigem a sua mente, igualmente em fogo. Tudo isso, enquanto Agostinho contempla a “Veritas” (Verdade) vindo do alto, refugindo em raios de luz, dirigidas a seus olhos e rosto brilhantes. A gravura retrata a maneira como Agostinho integrava a revelação de Deus nas Escrituras, mente e coração. O teólogo, insistentemente, rejeitava uma racionalidade apóstata, suas reflexões eram orantes e suas orações reflexivas.
 
Precisamos de intelectuais cristãos nos termos do que isso significa. Refiro-me a gente chamada por Deus para discernir o mundo, o tempo, as escrituras, a tradição e a teologia, e assim, orientar perplexos sob um profundo senso de dependência da graça de Deus. Gente com o coração aquecido pelo Espírito de Cristo, movidos por humildade e que adoram na medida que pensam e oram na medida que leem. O intelectual cristão equipa ministros, universitários, gestores, pesquisadores, cientistas, profissionais, políticos, servidores públicos, envolvidos com projetos sociais, professores e diretores de instituições de ensino a serem mais intencionais e a fazerem o que fazem de modo mais inteiramente cristão.
 
Enfim, intelectuais cristãos são como profetas que desnudam ídolos seculares e que apontam com arte, imaginação e boa retórica a glória do Deus Trino. Intelectuais cristãos foram chamados para levar todo pensamento cativo a Cristo, na medida que seu próprio pensamento se curva de espanto diante do espetáculo de um Deus que se revela e salva. O intelectual, no fim, não está a serviço de si ou de suas inquietações, mas da glória de Deus em Jesus Cristo.
 
“Transmitimos a sabedoria de Deus em mistério, a sabedoria que estava oculta e que Deus predeterminou desde a eternidade para a nossa glória” (I Coríntios 2:7).

• Igor Miguel é casado, pais de dois filhos, teólogo, pedagogo e mestre em hebraico pela Universidade de São Paulo. Diretor da ONG e-Missão e pastor na Igreja Esperança em Belo Horizonte (MG). Redes sociais (Facebook/Instagram/Twitter @igorpensar).

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