Opinião
- 10 de janeiro de 2020
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Os incêndios na Austrália
Por Tácito Maranhão Pinto
Pedimos a Tácito Maranhão Pinto para escrever sobre os incêndios na Austrália. Ele é assinante da Ultimato e mora com a família nesse país há oito anos. Tácito, hoje aposentado, foi consultor de empresas e professor nos programas de pós-graduação da FAAP e FIAP, em São Paulo. Ele e a esposa tornaram-se cidadãos australianos em 2016 e congregam na igreja Life Christian Centre, em Adelaide.
As queimadas na Austrália são realmente sem precedentes. Porém, convém lembrar que desde que os aborígenes eram os únicos habitantes da região – há 60 mil anos – todos os anos tem havido queimadas. A vegetação da Austrália precisa do fogo para se renovar. As queimadas são provocadas de forma natural, principalmente por raios. É certo que hoje há incêndios criminosos – cerca de 85 pessoas já foram presas, somente no estado de South Austrália, desde setembro de 2019. Eu particularmente acredito que em decorrência do aquecimento global houve pouca chuva em 2019 o que tornou os incêndios desta temporada muito mais intensos e destrutivos do que os de anos anteriores. A época das queimadas começou em setembro e outubro de 2019 quando o normal seria meados de novembro, e vai durar até março. A área queimada até agora equivale a toda a extensão da Inglaterra.
Com pequenas cidades formadas por vilas e povoados com até duas mil pessoas e áreas destinadas, principalmente, à agricultura e à pecuária, as regiões atingidas pelos incêndios na Austrália são consideradas de baixa densidade populacional. Mas, ao mesmo tempo, mais de duas mil casas, quatro mil depósitos e galpões, cerca de trezentos automóveis e máquinas agrícolas foram destruídos pelo fogo. O número de rebanhos e animais silvestres divulgado pela imprensa é de quinhentos milhões a 1 bilhão de animais.
As cidades maiores não foram e, acredito, não serão atingidas pelo fogo. Porém, em Sidney, Melbourne e Canberra há presença de fuligem no ar e as autoridades recomendam o uso de máscaras especialmente em crianças e idosos. A presença da fumaça tem elevado o número de casos de problemas respiratórios.
No meio deste grande problema ambiental, os australianos revelam uma das coisas que sua cultura tem de melhor. A doação de tempo e de recursos é parte da cultura australiana. Possivelmente, herança dos valores dos primeiros emigrantes que aqui chegaram em 1788. Eram, muitos deles, prisioneiros vindos da Grã-Bretanha. Junto com eles vieram também os pastores anglicanos para organizar as igrejas onde estes pioneiros congregariam. Valores cristãos estão na matriz da cultura australiana, e são muito mais fortes inclusive, ainda que somente 15% da população do país frequente uma igreja.
Mais de 35% da população australiana pratica o voluntariado. É comum, na época de férias, que as escolas organizam oportunidades para que os estudantes sejam voluntários em residências para idosos ou em abrigos para animais durante alguns dias.
Dados da Philanthropy – organização que incentiva a filantropia na Austrália – revelam que cerca de 14,9 milhões de australianos adultos – 80,8% da população – doaram 12,5 bilhões de dólares australianos a instituições de caridade e organizações sem fins lucrativos em 2015/2016. A doação média é de 764,08 dólares australianos.
A grande maioria dos bombeiros envolvida no combate aos incêndios do país é voluntária. Somente no estado de Victoria (cuja capital é Melbourne) há 34.597 voluntários que não recebem salário algum e 1.321 funcionários do governo.
Com o agravamento dos incêndios, no final de 2019, uma atividade intensa de doações teve início com a participação de muitas pessoas doando água, gêneros alimentícios, roupas, sapatos para as áreas atingidas. Toda esta movimentação é administrada por organizações como a Cruz Vermelha, o Exército da Salvação e muitas outras. O movimento em favor de doações foi tão intenso que em Melbourne pessoas passaram duas horas no congestionamento esperando a vez para entregar a sua doação. O impacto no trânsito da cidade de 5 milhões de habitantes foi tão grande, e a quantidade de doações alcançou tal volume, que o governo pediu que aos australianos que passassem a fazer doações apenas em dinheiro.
Em todas as grandes redes de lojas é possível fazer uma doação no momento do pagamento das compras. O atendente de caixa pergunta: "Quer fazer alguma doação para os atingidos pelos incêndios? 2, 5 ou 10 dólares?”.
Voluntários que estão sem trabalhar em seus empregos fixos e, portanto, também estão sem receber um salário, receberão do governo federal e estadual um pagamento pelos dias de trabalho contra o incêndio.
Vários artistas australianos fizeram doações de 500 mil dólares. Empresas e bancos doaram entre 1 e 5 milhões. Um empresário do setor de mineração, junto com sua família, doou 70 milhões de dólares australianos e declarou: “Para você que perdeu tudo, que foi atingido pela queimada, isto é uma doação da minha família para sua família”. Uma comediante australiana que mora nos Estados Unidos lançou uma campanha para seus seguidores nas redes sociais e já arrecadou 49 milhões de dólares.
Diante deste quadro, sinceramente, penso que a Igreja aqui não precisa fazer algo. Os membros delas já estão doando. Vários deles, em todo o país, são bombeiros voluntários. As famílias estão doando dinheiro e, onde ainda são aceitos, gêneros alimentícios e roupas. O crente aqui é também australiano e faz parte da cultura dele doar-se, socorrer e ser voluntário. A Igreja não precisa falar disso.
A única coisa que a igreja pode fazer é orar. A oração é um recurso que somente o cristão tem. As igrejas podem se mobilizar e clamar para que Deus mande chuva, dê discernimento aos governantes para agir e fazer frente à mudança climática, e por livramento para os milhares de bombeiros voluntários que colocam suas vidas em risco. Os cristãos e a igreja também podem orar para que o Deus Todo-poderoso proteja a Austrália e para que em crises como a que está acontecendo a ferocidade da tragédia natural ajude as pessoas a se darem conta de que existe um Deus Altíssimo que mesmo em meio às mais trágicas circunstâncias da vida, oferece seu amor e amizade, e que isso traz significado maior do que todos os bens e conforto que podemos ter na vida.
Leia mais:
» O gemido da criação e a missão da igreja
Pedimos a Tácito Maranhão Pinto para escrever sobre os incêndios na Austrália. Ele é assinante da Ultimato e mora com a família nesse país há oito anos. Tácito, hoje aposentado, foi consultor de empresas e professor nos programas de pós-graduação da FAAP e FIAP, em São Paulo. Ele e a esposa tornaram-se cidadãos australianos em 2016 e congregam na igreja Life Christian Centre, em Adelaide.
As queimadas na Austrália são realmente sem precedentes. Porém, convém lembrar que desde que os aborígenes eram os únicos habitantes da região – há 60 mil anos – todos os anos tem havido queimadas. A vegetação da Austrália precisa do fogo para se renovar. As queimadas são provocadas de forma natural, principalmente por raios. É certo que hoje há incêndios criminosos – cerca de 85 pessoas já foram presas, somente no estado de South Austrália, desde setembro de 2019. Eu particularmente acredito que em decorrência do aquecimento global houve pouca chuva em 2019 o que tornou os incêndios desta temporada muito mais intensos e destrutivos do que os de anos anteriores. A época das queimadas começou em setembro e outubro de 2019 quando o normal seria meados de novembro, e vai durar até março. A área queimada até agora equivale a toda a extensão da Inglaterra.
Com pequenas cidades formadas por vilas e povoados com até duas mil pessoas e áreas destinadas, principalmente, à agricultura e à pecuária, as regiões atingidas pelos incêndios na Austrália são consideradas de baixa densidade populacional. Mas, ao mesmo tempo, mais de duas mil casas, quatro mil depósitos e galpões, cerca de trezentos automóveis e máquinas agrícolas foram destruídos pelo fogo. O número de rebanhos e animais silvestres divulgado pela imprensa é de quinhentos milhões a 1 bilhão de animais.
As cidades maiores não foram e, acredito, não serão atingidas pelo fogo. Porém, em Sidney, Melbourne e Canberra há presença de fuligem no ar e as autoridades recomendam o uso de máscaras especialmente em crianças e idosos. A presença da fumaça tem elevado o número de casos de problemas respiratórios.
No meio deste grande problema ambiental, os australianos revelam uma das coisas que sua cultura tem de melhor. A doação de tempo e de recursos é parte da cultura australiana. Possivelmente, herança dos valores dos primeiros emigrantes que aqui chegaram em 1788. Eram, muitos deles, prisioneiros vindos da Grã-Bretanha. Junto com eles vieram também os pastores anglicanos para organizar as igrejas onde estes pioneiros congregariam. Valores cristãos estão na matriz da cultura australiana, e são muito mais fortes inclusive, ainda que somente 15% da população do país frequente uma igreja.
Mais de 35% da população australiana pratica o voluntariado. É comum, na época de férias, que as escolas organizam oportunidades para que os estudantes sejam voluntários em residências para idosos ou em abrigos para animais durante alguns dias.
Dados da Philanthropy – organização que incentiva a filantropia na Austrália – revelam que cerca de 14,9 milhões de australianos adultos – 80,8% da população – doaram 12,5 bilhões de dólares australianos a instituições de caridade e organizações sem fins lucrativos em 2015/2016. A doação média é de 764,08 dólares australianos.
A grande maioria dos bombeiros envolvida no combate aos incêndios do país é voluntária. Somente no estado de Victoria (cuja capital é Melbourne) há 34.597 voluntários que não recebem salário algum e 1.321 funcionários do governo.
Com o agravamento dos incêndios, no final de 2019, uma atividade intensa de doações teve início com a participação de muitas pessoas doando água, gêneros alimentícios, roupas, sapatos para as áreas atingidas. Toda esta movimentação é administrada por organizações como a Cruz Vermelha, o Exército da Salvação e muitas outras. O movimento em favor de doações foi tão intenso que em Melbourne pessoas passaram duas horas no congestionamento esperando a vez para entregar a sua doação. O impacto no trânsito da cidade de 5 milhões de habitantes foi tão grande, e a quantidade de doações alcançou tal volume, que o governo pediu que aos australianos que passassem a fazer doações apenas em dinheiro.
Em todas as grandes redes de lojas é possível fazer uma doação no momento do pagamento das compras. O atendente de caixa pergunta: "Quer fazer alguma doação para os atingidos pelos incêndios? 2, 5 ou 10 dólares?”.
Voluntários que estão sem trabalhar em seus empregos fixos e, portanto, também estão sem receber um salário, receberão do governo federal e estadual um pagamento pelos dias de trabalho contra o incêndio.
Vários artistas australianos fizeram doações de 500 mil dólares. Empresas e bancos doaram entre 1 e 5 milhões. Um empresário do setor de mineração, junto com sua família, doou 70 milhões de dólares australianos e declarou: “Para você que perdeu tudo, que foi atingido pela queimada, isto é uma doação da minha família para sua família”. Uma comediante australiana que mora nos Estados Unidos lançou uma campanha para seus seguidores nas redes sociais e já arrecadou 49 milhões de dólares.
Diante deste quadro, sinceramente, penso que a Igreja aqui não precisa fazer algo. Os membros delas já estão doando. Vários deles, em todo o país, são bombeiros voluntários. As famílias estão doando dinheiro e, onde ainda são aceitos, gêneros alimentícios e roupas. O crente aqui é também australiano e faz parte da cultura dele doar-se, socorrer e ser voluntário. A Igreja não precisa falar disso.
A única coisa que a igreja pode fazer é orar. A oração é um recurso que somente o cristão tem. As igrejas podem se mobilizar e clamar para que Deus mande chuva, dê discernimento aos governantes para agir e fazer frente à mudança climática, e por livramento para os milhares de bombeiros voluntários que colocam suas vidas em risco. Os cristãos e a igreja também podem orar para que o Deus Todo-poderoso proteja a Austrália e para que em crises como a que está acontecendo a ferocidade da tragédia natural ajude as pessoas a se darem conta de que existe um Deus Altíssimo que mesmo em meio às mais trágicas circunstâncias da vida, oferece seu amor e amizade, e que isso traz significado maior do que todos os bens e conforto que podemos ter na vida.
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