Opinião
- 06 de junho de 2006
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Mais do que uma Copa do Mundo
“Tende bom ânimo; eu venci o mundo” (Jo 16.33)
Não resta a menor dúvida que a palavra “perfil” está sob os holofotes do linguajar atual. Muitos estão correndo atrás de pessoas com o perfil de sua empresa, igreja, partido político etc. Enfim, temos nos preocupado muito com o ‘perfil’, mas, por outro lado, temos nos esquecido que ele não é sinônimo de identidade e muito menos de caráter ou vida integral. “Perfil” é apenas um contorno, um lado de uma pessoa, não a pessoa em seu todo, um ângulo que vemos do objeto e não o objeto em sua inteireza.
Por isso, Jesus de Nazaré, muito comentado e explorado, mas pouco conhecido nesses dias de ebulição religiosa, acentuava a urgência da metanoia (“mudança da mente”) e não da metamorfose (“mudança da forma”), pois segundo Ele não era o que entrava no homem, gastronomicamente falando, que contaminava seu caráter, mas o que saía dele, pois o que saía vinha de seu interior e revelava suas reais motivações, ou seja, quem este homem realmente era. Desta forma, caso ele não fosse transformado de dentro para fora, o seu exterior seria apenas a expressão de uma hipocrisia requintada e digna somente dos grandes prêmios teatrais, mas não do aplauso de quem nos criou no princípio à imagem e semelhança dele. Não é à toa que até mesmo a sabedoria popular, dentre outros ditados, nos adverte dizendo: “as aparências enganam”, ou ainda: “por fora bela viola, por dentro pão bolorento”.
Quando olhamos a imensa e bela costa marítima do Brasil, suas belas praias e refúgios paradisíacos, ou ainda, quando paramos para contemplar o seu interior marcado por uma riqueza de fauna e flora incomparáveis e extraordinários não temos dúvida em dizer como o cantor que moramos “num país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza”. Todavia, esta beleza natural é apenas uma parte do país, não o país todo.
Sem dúvida alguma, do ponto de vista político, o Brasil é um país, mas ainda está longe de ser uma nação no sentido de comunidade formada por adscrição ou submissão à lei ou leis que estabelece. A violência tão presente em nossos dias somente vem demonstrar o quanto precisamos ser nação. Para isso não basta termos nacionalidade, título de eleitor, CPF, RG ou ainda, sermos organizados politicamente; é preciso mais. Urge a necessidade de demonstrarmos um sentimento de identidade uns para com os outros, um sentimento que não seja efêmero mas permanente, um sentimento que provoque inclusão social e não exclusão, um sentimento que nos torne tutores uns dos outros e não meros expectadores da miséria alheia. Precisamos de um sentimento que esteja acima da ordem e do progresso. Aliás, alguém já disse que o pensamento positivista de Augusto Comte expresso nos dizeres da bandeira brasileira continha em suas origens, por influência da obra de Thomas Kempis intitulada “A imitação de Cristo”, não só ordem e progresso, mas ordem, progresso e amor.
Este sentimento de amor a que nos referimos aqui certamente não é algo que se compra ou se produz de forma laboratorial, mas é uma demonstração constante e visível de rejeição a todo tipo de indiferença com relação ao nosso semelhante seja ele quem for. Não há exemplo maior e melhor com relação a isso do que o próprio Senhor Jesus. Segundo a narrativa do Novo Testamento Ele nos mostra que o amor, dentre outras coisas, é primordialmente uma doação visível para relacionar-se com fidelidade, humildade e responsabilidade. Sem fidelidade o amor deixa de ser uma aliança, e quando isto acontece temos enorme dificuldade em construir famílias saudáveis, relacionamentos maduros e sadios. Por sua vez, sem humildade e responsabilidade é impossível fazer com que os filhos deste solo fértil cresçam e compreendam que a maior riqueza da nação não é necessariamente o seu produto interno bruto mas o respeito entre todos os cidadãos e o empenho dos mesmos em preservar não só o meio ambiente, mas, também, uma justiça que assegure vida com dignidade e qualidade.
Finalmente, mais do que vencer uma copa do mundo, precisamos ser identificados com este amor e conquistar diariamente a condição ser uma nação livre, justa e abençoada por Deus.
Uéslei Fatareli é pastor da Igreja Presbiteriana de Itatiba, SP. É também compositor e mestrando em Ciências da Religião
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