Opinião
- 10 de fevereiro de 2010
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Essas mulheres de hoje
Tais Machado
O que dizer desses dias? Logo os primeiros de 2010 já repletos de tragédias, dentro de fora de nosso país? Tempo de tristezas, de compaixão, de reflexão, de mobilização.
E o que nos mostram a vida de algumas mulheres de nosso tempo em dias de dificuldades?
Perdemos uma missionária, uma evangelista brasileira que não via o Brasil como sua única paróquia. Zilda Arns morreu em missão, e, como diz a reconhecida jornalista Eliane Cantanhêde, “ela morreu como viveu: chacoalhando em desconfortáveis jipes militares, aos 75 anos, numa guerra contra a pobreza, a sujeira, a ignorância. A favor da vida. Morreu para que tantos outros vivessem no pequeno Haiti, o mais miserável país da América Latina. Sua história e seus ideais se confundem com os de um ícone mundial: Madre Tereza de Calcutá. Mas Zilda não era freira, não usava o hábito e dedicou sua vida à vida alheia, mantendo-se bonita, vaidosa, imensamente feminina. Não interpretou um papel. Era apenas ela mesma em ação. Zilda, definitivamente, não passou pela vida em vão”. E como a vida e a morte de alguns nos fazem repensar a nossa, não?
A morte da doutora Zilda nos convida a prestar maior atenção à vida e a agradecer por sua existência entre nós. Sua compreensão do evangelho e seu testemunho têm sido lembrados e celebrados em muitos cantos de nosso Brasil. O sociólogo André Ricardo de Souza, por exemplo, falou do trabalho dela na pastoral da criança e disse que se trata da “entidade nacional que mais reúne voluntários, 260 mil pessoas, sendo 92% de mulheres e a absoluta maioria de pobres. Mas o feito que a coloca em posição destacada na história foi ter ensinado mães humildes a orientar mães semelhantes a como salvar e fortalecer seus filhos”. Frei Betto repercutiu escrevendo sobre como ela “nos deixa, de herança, o exemplo de que é possível mudar o perfil de uma sociedade com ações comunitárias da sociedade civil, ainda que o poder público e a iniciativa privada permaneçam indiferentes ou adotem simulacros de responsabilidade social”. A jornalista Barbara Gancia falou do contraste da vida de dona Zilda, pois, em tempos de brigas por espaços por aparecer, intrigas entre celebridades, instantes de fama sendo disputadíssimos, uns querendo aparecer mais do que outros em nosso mundo de espetáculos, não fosse a tragédia, a maioria de nós nem saberia que Dona Zilda havia deixado suas férias sagradas, enquanto boa parte de nós desfrutávamos desse tempo, para ir servir lá no Haiti. Ela não era de perder oportunidades, sabia da urgência e da importância da obra.
Ruy Castro até comentou que “dona Zilda, aos 75 anos, parecia tão ativa quanto na época em que começou a Pastoral da Criança em 1983 – talvez até mais, porque, em 2004, ajudara a fundar a Pastoral do Idoso”. Isso nos remete à história bíblica de Calebe, com toda sua fibra e disposição mesmo em idade avançada: “Aqui estou hoje, com oitenta e cinco anos de idade. Ainda estou tão forte como no dia em que Moisés me enviou; tenho agora tanto vigor para ir à guerra como tinha naquela época.” (Js 14.10-11).
E como também disse o professor Fernando Altemeyer Junior: “Obrigado, querida e amada doutora Zilda. Por tua missão e por tua entrega. Grato por nos ensinar a ver milagres de Deus dentro das entranhas da dor. Grato por ver com teus olhos ressurreição onde todos só conseguem ver fatalidade. Grato por experimentar e gestar vida onde tudo revela dor”. Gente assim me faz celebrar com maior força e alegria a história de salvação de Deus que continua a ser construída. Também me anima a prosseguir vivendo pela esperança viva em Cristo.
Atentar respeitosamente para as que se vão e as lições que ficam, mas também observar e celebrar a vida de outras entre nós. Então o que dizer de Marina Silva ao olhar para sua vida, sua história, seu testemunho e sua dedicação? Como não se emocionar ao ver a reação natural do público do Fórum Social Mundial, aliás, que teve em sua maioria mulheres (59,3%), quando Marina foi chamada à frente – aplaudida em pé. Reconhecido público e notório da vida de uma mulher que fala com seus atos, que evangeliza com sua própria vida. Uma mulher nascida no interior do Acre, negra, pobre, analfabeta até aos 16 anos, que exercita sua capacidade e inteligência, inclusive esforçando-se para recuperar anos de atraso nos estudos devido às condições desfavoráveis, para não dizer total falta de condições. Ela não só consegue seu diploma universitário e se especializa, como continua desenvolvendo e servindo com conscientização, fazendo um trabalho digno de respeito e admiração por tantos estudiosos e envolvidos na área ambiental e fora dela. Mesmo em meio à tanta sujeira do jogo e intrigas políticas, é reverenciada como senadora por seu trabalho e sua ética exemplar; e assim se vão anos de coerência. E ainda, Marina não se cansa de proclamar que “uma das formas de amar a Deus e ao próximo é lutar por um mundo melhor”.
Mulheres que fazem história, que compreenderam a integralidade do evangelho e impactam tão positivamente a sociedade. Obrigada, Senhor, por essas mulheres de hoje.
• Tais Machado, paulistana, é psicóloga clínica e professora em seminários teológicos. É secretária nacional de capacitação da Aliança Bíblica Universitária do Brasil.
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O que dizer desses dias? Logo os primeiros de 2010 já repletos de tragédias, dentro de fora de nosso país? Tempo de tristezas, de compaixão, de reflexão, de mobilização.
E o que nos mostram a vida de algumas mulheres de nosso tempo em dias de dificuldades?
Perdemos uma missionária, uma evangelista brasileira que não via o Brasil como sua única paróquia. Zilda Arns morreu em missão, e, como diz a reconhecida jornalista Eliane Cantanhêde, “ela morreu como viveu: chacoalhando em desconfortáveis jipes militares, aos 75 anos, numa guerra contra a pobreza, a sujeira, a ignorância. A favor da vida. Morreu para que tantos outros vivessem no pequeno Haiti, o mais miserável país da América Latina. Sua história e seus ideais se confundem com os de um ícone mundial: Madre Tereza de Calcutá. Mas Zilda não era freira, não usava o hábito e dedicou sua vida à vida alheia, mantendo-se bonita, vaidosa, imensamente feminina. Não interpretou um papel. Era apenas ela mesma em ação. Zilda, definitivamente, não passou pela vida em vão”. E como a vida e a morte de alguns nos fazem repensar a nossa, não?
A morte da doutora Zilda nos convida a prestar maior atenção à vida e a agradecer por sua existência entre nós. Sua compreensão do evangelho e seu testemunho têm sido lembrados e celebrados em muitos cantos de nosso Brasil. O sociólogo André Ricardo de Souza, por exemplo, falou do trabalho dela na pastoral da criança e disse que se trata da “entidade nacional que mais reúne voluntários, 260 mil pessoas, sendo 92% de mulheres e a absoluta maioria de pobres. Mas o feito que a coloca em posição destacada na história foi ter ensinado mães humildes a orientar mães semelhantes a como salvar e fortalecer seus filhos”. Frei Betto repercutiu escrevendo sobre como ela “nos deixa, de herança, o exemplo de que é possível mudar o perfil de uma sociedade com ações comunitárias da sociedade civil, ainda que o poder público e a iniciativa privada permaneçam indiferentes ou adotem simulacros de responsabilidade social”. A jornalista Barbara Gancia falou do contraste da vida de dona Zilda, pois, em tempos de brigas por espaços por aparecer, intrigas entre celebridades, instantes de fama sendo disputadíssimos, uns querendo aparecer mais do que outros em nosso mundo de espetáculos, não fosse a tragédia, a maioria de nós nem saberia que Dona Zilda havia deixado suas férias sagradas, enquanto boa parte de nós desfrutávamos desse tempo, para ir servir lá no Haiti. Ela não era de perder oportunidades, sabia da urgência e da importância da obra.
Ruy Castro até comentou que “dona Zilda, aos 75 anos, parecia tão ativa quanto na época em que começou a Pastoral da Criança em 1983 – talvez até mais, porque, em 2004, ajudara a fundar a Pastoral do Idoso”. Isso nos remete à história bíblica de Calebe, com toda sua fibra e disposição mesmo em idade avançada: “Aqui estou hoje, com oitenta e cinco anos de idade. Ainda estou tão forte como no dia em que Moisés me enviou; tenho agora tanto vigor para ir à guerra como tinha naquela época.” (Js 14.10-11).
E como também disse o professor Fernando Altemeyer Junior: “Obrigado, querida e amada doutora Zilda. Por tua missão e por tua entrega. Grato por nos ensinar a ver milagres de Deus dentro das entranhas da dor. Grato por ver com teus olhos ressurreição onde todos só conseguem ver fatalidade. Grato por experimentar e gestar vida onde tudo revela dor”. Gente assim me faz celebrar com maior força e alegria a história de salvação de Deus que continua a ser construída. Também me anima a prosseguir vivendo pela esperança viva em Cristo.
Atentar respeitosamente para as que se vão e as lições que ficam, mas também observar e celebrar a vida de outras entre nós. Então o que dizer de Marina Silva ao olhar para sua vida, sua história, seu testemunho e sua dedicação? Como não se emocionar ao ver a reação natural do público do Fórum Social Mundial, aliás, que teve em sua maioria mulheres (59,3%), quando Marina foi chamada à frente – aplaudida em pé. Reconhecido público e notório da vida de uma mulher que fala com seus atos, que evangeliza com sua própria vida. Uma mulher nascida no interior do Acre, negra, pobre, analfabeta até aos 16 anos, que exercita sua capacidade e inteligência, inclusive esforçando-se para recuperar anos de atraso nos estudos devido às condições desfavoráveis, para não dizer total falta de condições. Ela não só consegue seu diploma universitário e se especializa, como continua desenvolvendo e servindo com conscientização, fazendo um trabalho digno de respeito e admiração por tantos estudiosos e envolvidos na área ambiental e fora dela. Mesmo em meio à tanta sujeira do jogo e intrigas políticas, é reverenciada como senadora por seu trabalho e sua ética exemplar; e assim se vão anos de coerência. E ainda, Marina não se cansa de proclamar que “uma das formas de amar a Deus e ao próximo é lutar por um mundo melhor”.
Mulheres que fazem história, que compreenderam a integralidade do evangelho e impactam tão positivamente a sociedade. Obrigada, Senhor, por essas mulheres de hoje.
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