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- 09 de março de 2018
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Deus fez muito mais com a minha vida do que o meu nascimento sinalizava!
Por Gabriele Kumm
Minha história começou em 1947 numa Alemanha pós-guerra, destruída em todos os sentidos. As tropas dos aliados dividiram o território alemão entre si. A minha família vivia na região ocupada pelas tropas inglesas. Havia muitos filhos de aliados; meu pai era inglês.
Depois de uma guerra longa e brutal, os mais jovens queriam somente viver. A minha geração ficou muito perturbada com os acontecimentos terríveis do regime nazista, que causaram vergonha e uma profunda desconfiança em relação aos adultos, que se silenciaram diante de nossas indagações e perplexidades. A nossa educação escolar tinha como objetivo principal formar jovens críticos. A obediência cega era vista como tendo sido um ingrediente importante para o nazismo alcançar sua magnitude para destruição de vidas. A minha geração se criou numa série crise de identidade. A fé cristã não era um assunto a ser tratado; na minha família a ‘religião’ era o trabalho.
Havia muita pobreza, amenizada pelos alimentos enviados pelos americanos, cuja distribuição era feita pelo pastor. Os dois anos de aulas sobre a fé luterana não deixaram marcas. Continuei em busca de algo que pudesse dar um sentido maior à minha vida. Não tinha recursos para permanecer na escola e comecei bem jovem a me preparar em hotelaria. O território ocupado pelos russos encostou na nossa pequena cidade. A guerra fria era uma realidade, diante dos campos com minas terrestres com fugas que terminaram em mortes.
Depois de formada trabalhei num hotel longe da minha família. Apesar de a frustração ter grudado em mim, continuei buscando um sentido maior para minha vida. Um hotel é um lugar onde se espera que alguém encontre a fé em Deus? Isto aconteceu comigo. Uma mulher que se hospedou certa vez no hotel em que eu trabalhava chamou logo a minha atenção. Nós nos aproximamos, ela me deu um folheto evangelístico, no final de uma conversa oramos e eu fiz uma entrega consciente da minha vida a Jesus. Achei meu lugar ao lado de Cristo e em Deus Pai. A Bíblia tornou-se um meio de comunicação com Deus, ensinando-me o caminho da fé.
Junto com esta experiência veio um desejo muito forte de servir a Deus, fazer algo que daria sentido para mim e outras pessoas, como visitar idosos. Num estudo bíblico sobre o semeador e a terra fértil tive a convicção de que a vida frutífera, a que faz referência o texto, no meu caso seria viver como diaconisa, uma religiosa evangélica, dedicada à prática do amor cristão. Alguns anos depois ingressei numa casa de diaconisas com mais de 800 irmãs. Foi muito significativa a formação teológica, depois em enfermagem e a experiência num trabalho em comunidades.
Estava feliz e realizada quando apareceu um chamado que veio a ser o amor da minha vida, com o nome Brasil. Deixei tudo na Alemanha e em 1978 desembarquei em Curitiba. Tive o privilégio de estudar português no Rio de Janeiro, cidade que me fascinou. Nos primeiros anos trabalhei numa comunidade no interior. Em Segredo, no Paraná, não havia energia elétrica, água encanada, nem telefone, o que contrastava fortemente com Frankfurt, ondem morei nos anos anteriores. Foram bons anos de muito aprendizado.
Uma experiência foi um sinal ao que viria me dedicar com paixão. Ele era um menino franzino, cheio de bicho de pé, barriga estufada, muito maltratado pela madrasta, pai omisso. Anos depois fugiu da casa e se escondeu. Os pais já tinham perdido o pátrio poder. Um policial contou-me sobre a sua fuga e disse para minha surpresa: “se achar o menino pode ficar com ele”. Achei o menino que ficou comigo até ser aceito em um lar adequado. Hoje é um homem feliz que se tornou um pai exemplar.
Havia lido o livro de Stefan Zweig, o autor do clássico “Brasil, o país do futuro”. Compartilhava o entusiasmo do autor com relação ao Brasil, enxergava os grandes potenciais e o espaço para criar algo novo.
Em 1980 foi fundada a Irmandade Evangélica Betânia com irmãs brasileiras e alemãs para servir a Deus, a partir da palavra em Romanos 12,1 e 2. Aos poucos encontramos o nosso chamado principal. Em 1986 assumi a liderança da Irmandade e no mesmo ano iniciamos programas de educação infantil e fundamental, com uma proposta educacional que se fundamentava na visão bíblica do ser humano, favorecendo a formação em que conhecimento e valores cristãos andassem juntos. Desde o início houve espaço para crianças de famílias sem recursos. Quem tivesse meios para pagar a mensalidade o fazia, ajudando assim a financiar os alunos bolsistas. Em 1997 abrimos uma unidade educacional numa vila com grandes problemas sociais, sendo todas as crianças bolsistas e iniciou-se um trabalho missionário e social na comunidade. Em 2003 aceitamos em nossa casa crianças da vila que viviam em condições miseráveis e de abusos. Duas delas ficaram conosco e hoje são adultos com alegria de viver e com uma boa formação escolar.
A Irmandade Betânia atende atualmente nas suas unidades 900 crianças, destes 360 bolsistas, a maioria em período integral. E na Escola Aldeia são atendidas mais 100 crianças, aproximadamente, no programa da inclusão. Diaconia busca dar uma resposta àquilo que é a real necessidade.
Uma nova unidade está sendo construída para atender uma vila com famílias em diversas situações de vulnerabilidade social, num terreno próximo a ela, para 400 crianças com a mesma proposta educacional que visa fortalecer a inclusão da família na formação, abrindo espaço na própria escola. Para familiares desempregados oferecemos um curso básico em hotelaria para promover um ingresso no mercado de trabalho.
A minha felicidade continua sendo a comunhão ente nós, associadas, no exercício da diaconia. E o que aconteceu com meu entusiasmo com o Brasil? Recuso-me a perder a esperança. Estou inconformada com a tolerância com o intolerável.
Agradeço a Deus porque estamos investindo em vidas através da educação. Gostaria que os cristãos se dedicassem mais à educação, transmitindo valores e conhecimento para ter uma geração de cidadãos que possam cantar a pátria amada, porque quem ama torna-se responsável pelo bem coletivo.
Gabriele Kumm é Diretora Conselheira na Irmandade Betânia, em Curitiba (PR).
Leia mais:
Crer em Cristo é o que há de mais valioso
Solteira no campo missionário… e agora?
Minha história começou em 1947 numa Alemanha pós-guerra, destruída em todos os sentidos. As tropas dos aliados dividiram o território alemão entre si. A minha família vivia na região ocupada pelas tropas inglesas. Havia muitos filhos de aliados; meu pai era inglês.
Depois de uma guerra longa e brutal, os mais jovens queriam somente viver. A minha geração ficou muito perturbada com os acontecimentos terríveis do regime nazista, que causaram vergonha e uma profunda desconfiança em relação aos adultos, que se silenciaram diante de nossas indagações e perplexidades. A nossa educação escolar tinha como objetivo principal formar jovens críticos. A obediência cega era vista como tendo sido um ingrediente importante para o nazismo alcançar sua magnitude para destruição de vidas. A minha geração se criou numa série crise de identidade. A fé cristã não era um assunto a ser tratado; na minha família a ‘religião’ era o trabalho.
Havia muita pobreza, amenizada pelos alimentos enviados pelos americanos, cuja distribuição era feita pelo pastor. Os dois anos de aulas sobre a fé luterana não deixaram marcas. Continuei em busca de algo que pudesse dar um sentido maior à minha vida. Não tinha recursos para permanecer na escola e comecei bem jovem a me preparar em hotelaria. O território ocupado pelos russos encostou na nossa pequena cidade. A guerra fria era uma realidade, diante dos campos com minas terrestres com fugas que terminaram em mortes.
Depois de formada trabalhei num hotel longe da minha família. Apesar de a frustração ter grudado em mim, continuei buscando um sentido maior para minha vida. Um hotel é um lugar onde se espera que alguém encontre a fé em Deus? Isto aconteceu comigo. Uma mulher que se hospedou certa vez no hotel em que eu trabalhava chamou logo a minha atenção. Nós nos aproximamos, ela me deu um folheto evangelístico, no final de uma conversa oramos e eu fiz uma entrega consciente da minha vida a Jesus. Achei meu lugar ao lado de Cristo e em Deus Pai. A Bíblia tornou-se um meio de comunicação com Deus, ensinando-me o caminho da fé.
Junto com esta experiência veio um desejo muito forte de servir a Deus, fazer algo que daria sentido para mim e outras pessoas, como visitar idosos. Num estudo bíblico sobre o semeador e a terra fértil tive a convicção de que a vida frutífera, a que faz referência o texto, no meu caso seria viver como diaconisa, uma religiosa evangélica, dedicada à prática do amor cristão. Alguns anos depois ingressei numa casa de diaconisas com mais de 800 irmãs. Foi muito significativa a formação teológica, depois em enfermagem e a experiência num trabalho em comunidades.
Estava feliz e realizada quando apareceu um chamado que veio a ser o amor da minha vida, com o nome Brasil. Deixei tudo na Alemanha e em 1978 desembarquei em Curitiba. Tive o privilégio de estudar português no Rio de Janeiro, cidade que me fascinou. Nos primeiros anos trabalhei numa comunidade no interior. Em Segredo, no Paraná, não havia energia elétrica, água encanada, nem telefone, o que contrastava fortemente com Frankfurt, ondem morei nos anos anteriores. Foram bons anos de muito aprendizado.
Uma experiência foi um sinal ao que viria me dedicar com paixão. Ele era um menino franzino, cheio de bicho de pé, barriga estufada, muito maltratado pela madrasta, pai omisso. Anos depois fugiu da casa e se escondeu. Os pais já tinham perdido o pátrio poder. Um policial contou-me sobre a sua fuga e disse para minha surpresa: “se achar o menino pode ficar com ele”. Achei o menino que ficou comigo até ser aceito em um lar adequado. Hoje é um homem feliz que se tornou um pai exemplar.
Havia lido o livro de Stefan Zweig, o autor do clássico “Brasil, o país do futuro”. Compartilhava o entusiasmo do autor com relação ao Brasil, enxergava os grandes potenciais e o espaço para criar algo novo.
Em 1980 foi fundada a Irmandade Evangélica Betânia com irmãs brasileiras e alemãs para servir a Deus, a partir da palavra em Romanos 12,1 e 2. Aos poucos encontramos o nosso chamado principal. Em 1986 assumi a liderança da Irmandade e no mesmo ano iniciamos programas de educação infantil e fundamental, com uma proposta educacional que se fundamentava na visão bíblica do ser humano, favorecendo a formação em que conhecimento e valores cristãos andassem juntos. Desde o início houve espaço para crianças de famílias sem recursos. Quem tivesse meios para pagar a mensalidade o fazia, ajudando assim a financiar os alunos bolsistas. Em 1997 abrimos uma unidade educacional numa vila com grandes problemas sociais, sendo todas as crianças bolsistas e iniciou-se um trabalho missionário e social na comunidade. Em 2003 aceitamos em nossa casa crianças da vila que viviam em condições miseráveis e de abusos. Duas delas ficaram conosco e hoje são adultos com alegria de viver e com uma boa formação escolar.
A Irmandade Betânia atende atualmente nas suas unidades 900 crianças, destes 360 bolsistas, a maioria em período integral. E na Escola Aldeia são atendidas mais 100 crianças, aproximadamente, no programa da inclusão. Diaconia busca dar uma resposta àquilo que é a real necessidade.
Uma nova unidade está sendo construída para atender uma vila com famílias em diversas situações de vulnerabilidade social, num terreno próximo a ela, para 400 crianças com a mesma proposta educacional que visa fortalecer a inclusão da família na formação, abrindo espaço na própria escola. Para familiares desempregados oferecemos um curso básico em hotelaria para promover um ingresso no mercado de trabalho.
A minha felicidade continua sendo a comunhão ente nós, associadas, no exercício da diaconia. E o que aconteceu com meu entusiasmo com o Brasil? Recuso-me a perder a esperança. Estou inconformada com a tolerância com o intolerável.
Agradeço a Deus porque estamos investindo em vidas através da educação. Gostaria que os cristãos se dedicassem mais à educação, transmitindo valores e conhecimento para ter uma geração de cidadãos que possam cantar a pátria amada, porque quem ama torna-se responsável pelo bem coletivo.
Gabriele Kumm é Diretora Conselheira na Irmandade Betânia, em Curitiba (PR).
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