Opinião
- 18 de fevereiro de 2013
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A culpa é da internet?
A maioria dos diretores de companhias que oferecem serviços para encontros e possíveis namoros através da internet reconhecem que o aumento da oferta desse tipo de ferramenta certamente virá acompanhada de uma diminuição do compromisso nas relações entre casais. Um diretor de um serviço baseado no Reino Unido entrevistado pela revista “The Atlantic” de fevereiro, afirma que “o futuro verá melhores relacionamentos, mas também mais divórcios”. Alguns desses diretores afirmam inclusive que ao colocarem pessoas interessantes em contato umas com as outras, essa “oferta” fará com que o casamento se torne obsoleto.
Outros sugerem que muitas pessoas se inclinariam a romper relacionamentos atuais influenciadas pela noção de que há literalmente um mundo de oportunidades e alternativas lá fora. A comunicação e a conexão com tanta gente de tantos lugares levaria a uma diminuição do esforço e do compromisso em direção a uniões mais duradouras.
De todos os executivos envolvidos com esse tipo de serviço na internet entrevistados para um livro lançado recentemente1, somente um discordou da visão de que esse empreendimento levaria a uma diminuição dos compromissos e a um aumento dos divórcios. Para esse, um serviço de namoros online não muda o comportamento de cada indivíduo, os seus interesses, se é um tipo que só busca relações fortuitas ou se busca uma relação duradoura. “Encontrar o seu par pela Internet é um serviço que nada mais faz do que remover uma barreira para que esse encontro suceda”. O resto teria a ver com a personalidade e as escolhas de cada um, e isso independe do serviço brindado por sua companhia.
Fiquei pensando nessa única voz discordante da ideia de que os serviços de encontros on line seriam os grandes vilões da história. Sei que possivelmente sua real intenção seja apenas a de proteger a reputação de seu negócio, numa jogada defensiva. Mas ainda que sua preocupação seja somente monetária, pensemos por um momento se ele não teria razão em sugerir que cada um é responsável pelo que faz, sejam quais forem as circunstâncias.
“Conheci tanta gente interessante lá!” E esse “lá” pode ser uma viagem, um curso, um novo ambiente de trabalho, ou os famigerados serviços que arranjam encontros pela rede. “Só depois de 20 anos de casado é que vim a descobrir a paixão de minha vida!” Sim, é bastante possível que quanto mais o tempo passe, mais gente interessante você venha a conhecer. Mas, sob todos os aspectos, a vida é feita de decisões que você toma a cada dia. Podem ser pequenas ou grandes, mas desconfio que justamente esses detalhes das escolhas diárias, aparentemente sem tanta importância, os que mais diferença trarão ao longo prazo, na minha vida ou em minha relação a dois.
Ou seja, eu não posso, com o risco de ser profundamente desonesto, transferir a culpa para situações externas do contexto. Sabe aquela manchete de jornal: “Chuva mata cinco pessoas em um acidente na Dutra”? Depois, ao ler a reportagem, você descobre que a precipitação pluviométrica estava longe de ser uma psicopata assassina em série. Ainda que forte, a chuva muitas vezes é somente o contexto em que um motorista imprudente conduz acima da velocidade de segurança para aquelas condições. Sua imprudência os matou, não a chuva.
Faz já um tempo que li no "El País"2 uma reportagem sobre a suposta “descoberta” dos “genes do adultério”. Um certo alelo 334 levaria a uma propensão à busca contínua por novos parceiros sexuais. “Desculpe aí, querida, foram os meus genes”. Varões, tremei (ou alegrem-se, dependendo de sua disposição moral e espiritual), pois dois homens em cada cinco teriam o gene ou a variante do alelo que os levaria à infidelidade sexual e à poligamia. Menos mal que uma pesquisadora entrevistada para a mesma matéria tenha saído para aclarar que o tal gene não seria em si um argumento sólido para justificar a infidelidade: “Sabendo que há pontos fracos em nosso sistema biológico, isso proporciona ao menos a possibilidade de buscar ajuda para superá-los. Um homem que tem esse gene em seu cérebro pode manejar ou utilizar seu conhecimento e caráter para fazer-lhe frente e resistir a essa inquietação que faz tremer o matrimônio ou a relação do casal.” Também acrescentou: “O alelo 334 pode ser relativamente dominado, é como o caso do alcoólatra que se casa e se controla ou cura o seu vício”.
Voltemos ao tema dos serviços de namoro online e os divórcios que supostamente crescem por sua causa. Não me coloco em posição para julgar a ninguém que tenha passado pelas tragédias da infidelidade e do divórcio. Não as desejo para ninguém e busco ser empático e apoio àqueles que sofreram (ou sofrem!) por conta delas. Tampouco minha intenção aqui é falar mal dos serviços de busca de um par pela Internet (tenho bons amigos que aí encontraram o seu cônjuge), nem é a de ser um ludita que desmereça o potencial para o bem das redes sociais ou de outras tecnologias. É importante entender bem os desafios de cada época e contexto, e não sermos ingênuos para enfrentá-los de forma correta. Também não devo recusar-me a crescer e a amadurecer. Antes o alvo é ser responsável, reconhecer meus limites e buscar ajuda quando necessário. Ou seja, sempre. Não dá para viver sem mentores, amigos e referentes.
Ouvi recentemente que o problema das redes sociais ou de outras tecnologias é que elas criam oportunidades que antes não existiam. Com mais possibilidades, pecariam mais. Ora, se essa lógica estiver certa e se eu não peco só “porque não tive oportunidade”, sou o mais infeliz e medíocre dos pecadores. Porque nesse caso meu ser já estaria tomado por essa covardia vil e débil que se esconde detrás de uma aparente capa de santidade. Deus me livre do momento em que essas “oportunidades” supostamente “aparecerem” sem que eu busque estar preparado.
Minha oração na verdade deveria ser: “Senhor, tem misericórdia de mim, porque o pecado não está lá fora, na multidão de oportunidades e de contextos ameaçadores, mas está bem aqui, dentro de mim. Sou pecador, e por isso preciso do único Santo, o Senhor. Débil sou, mas em ti forte serei.” Não serão Facebook, serviços de encontros on line ou genes engraçadinhos que irão ocupar o protagonismo que cabe somente a um pecador que busca aquele que, levando-me pela mão, pode salvar-me e conduzir-me pelo bom caminho. Cuidado, que essa é uma decisão para cada dia.
Notas:
1. Dan Slater, Love in the Time of Algorithms: What Technology Does to Meeting and Mating, Penguin Group, 2013.
2. Hallaron el gen de la infidelidad masculina, 7 de setembro 2008, El País, Uruguay.
Leia mais
O princípio de Jó e a internet
Por um pouco de decência
Por que (sempre) faço o que não quero?
Outros sugerem que muitas pessoas se inclinariam a romper relacionamentos atuais influenciadas pela noção de que há literalmente um mundo de oportunidades e alternativas lá fora. A comunicação e a conexão com tanta gente de tantos lugares levaria a uma diminuição do esforço e do compromisso em direção a uniões mais duradouras.
De todos os executivos envolvidos com esse tipo de serviço na internet entrevistados para um livro lançado recentemente1, somente um discordou da visão de que esse empreendimento levaria a uma diminuição dos compromissos e a um aumento dos divórcios. Para esse, um serviço de namoros online não muda o comportamento de cada indivíduo, os seus interesses, se é um tipo que só busca relações fortuitas ou se busca uma relação duradoura. “Encontrar o seu par pela Internet é um serviço que nada mais faz do que remover uma barreira para que esse encontro suceda”. O resto teria a ver com a personalidade e as escolhas de cada um, e isso independe do serviço brindado por sua companhia.
Fiquei pensando nessa única voz discordante da ideia de que os serviços de encontros on line seriam os grandes vilões da história. Sei que possivelmente sua real intenção seja apenas a de proteger a reputação de seu negócio, numa jogada defensiva. Mas ainda que sua preocupação seja somente monetária, pensemos por um momento se ele não teria razão em sugerir que cada um é responsável pelo que faz, sejam quais forem as circunstâncias.
“Conheci tanta gente interessante lá!” E esse “lá” pode ser uma viagem, um curso, um novo ambiente de trabalho, ou os famigerados serviços que arranjam encontros pela rede. “Só depois de 20 anos de casado é que vim a descobrir a paixão de minha vida!” Sim, é bastante possível que quanto mais o tempo passe, mais gente interessante você venha a conhecer. Mas, sob todos os aspectos, a vida é feita de decisões que você toma a cada dia. Podem ser pequenas ou grandes, mas desconfio que justamente esses detalhes das escolhas diárias, aparentemente sem tanta importância, os que mais diferença trarão ao longo prazo, na minha vida ou em minha relação a dois.
Ou seja, eu não posso, com o risco de ser profundamente desonesto, transferir a culpa para situações externas do contexto. Sabe aquela manchete de jornal: “Chuva mata cinco pessoas em um acidente na Dutra”? Depois, ao ler a reportagem, você descobre que a precipitação pluviométrica estava longe de ser uma psicopata assassina em série. Ainda que forte, a chuva muitas vezes é somente o contexto em que um motorista imprudente conduz acima da velocidade de segurança para aquelas condições. Sua imprudência os matou, não a chuva.
Faz já um tempo que li no "El País"2 uma reportagem sobre a suposta “descoberta” dos “genes do adultério”. Um certo alelo 334 levaria a uma propensão à busca contínua por novos parceiros sexuais. “Desculpe aí, querida, foram os meus genes”. Varões, tremei (ou alegrem-se, dependendo de sua disposição moral e espiritual), pois dois homens em cada cinco teriam o gene ou a variante do alelo que os levaria à infidelidade sexual e à poligamia. Menos mal que uma pesquisadora entrevistada para a mesma matéria tenha saído para aclarar que o tal gene não seria em si um argumento sólido para justificar a infidelidade: “Sabendo que há pontos fracos em nosso sistema biológico, isso proporciona ao menos a possibilidade de buscar ajuda para superá-los. Um homem que tem esse gene em seu cérebro pode manejar ou utilizar seu conhecimento e caráter para fazer-lhe frente e resistir a essa inquietação que faz tremer o matrimônio ou a relação do casal.” Também acrescentou: “O alelo 334 pode ser relativamente dominado, é como o caso do alcoólatra que se casa e se controla ou cura o seu vício”.
Voltemos ao tema dos serviços de namoro online e os divórcios que supostamente crescem por sua causa. Não me coloco em posição para julgar a ninguém que tenha passado pelas tragédias da infidelidade e do divórcio. Não as desejo para ninguém e busco ser empático e apoio àqueles que sofreram (ou sofrem!) por conta delas. Tampouco minha intenção aqui é falar mal dos serviços de busca de um par pela Internet (tenho bons amigos que aí encontraram o seu cônjuge), nem é a de ser um ludita que desmereça o potencial para o bem das redes sociais ou de outras tecnologias. É importante entender bem os desafios de cada época e contexto, e não sermos ingênuos para enfrentá-los de forma correta. Também não devo recusar-me a crescer e a amadurecer. Antes o alvo é ser responsável, reconhecer meus limites e buscar ajuda quando necessário. Ou seja, sempre. Não dá para viver sem mentores, amigos e referentes.
Ouvi recentemente que o problema das redes sociais ou de outras tecnologias é que elas criam oportunidades que antes não existiam. Com mais possibilidades, pecariam mais. Ora, se essa lógica estiver certa e se eu não peco só “porque não tive oportunidade”, sou o mais infeliz e medíocre dos pecadores. Porque nesse caso meu ser já estaria tomado por essa covardia vil e débil que se esconde detrás de uma aparente capa de santidade. Deus me livre do momento em que essas “oportunidades” supostamente “aparecerem” sem que eu busque estar preparado.
Minha oração na verdade deveria ser: “Senhor, tem misericórdia de mim, porque o pecado não está lá fora, na multidão de oportunidades e de contextos ameaçadores, mas está bem aqui, dentro de mim. Sou pecador, e por isso preciso do único Santo, o Senhor. Débil sou, mas em ti forte serei.” Não serão Facebook, serviços de encontros on line ou genes engraçadinhos que irão ocupar o protagonismo que cabe somente a um pecador que busca aquele que, levando-me pela mão, pode salvar-me e conduzir-me pelo bom caminho. Cuidado, que essa é uma decisão para cada dia.
Notas:
1. Dan Slater, Love in the Time of Algorithms: What Technology Does to Meeting and Mating, Penguin Group, 2013.
2. Hallaron el gen de la infidelidad masculina, 7 de setembro 2008, El País, Uruguay.
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O princípio de Jó e a internet
Por um pouco de decência
Por que (sempre) faço o que não quero?
É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), serve globalmente como secretário adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e também apoia a equipe da IFES América Latina.
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