Palavra do leitor
- 31 de outubro de 2024
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Mergulhados na cultura, mas batizados na santidade (parte 2)
A adoração verdadeira será em espírito e em verdade, não em montes.
Essa dinâmica instrumentalizada, no entanto, pode distorcer a natureza do relacionamento cristão com Deus e com o mundo. Ao ver o isolamento como uma técnica para alcançar um fim desejado, corre-se o risco de reduzir a vida cristã a uma transação utilitária, onde as ações são motivadas pela busca de segurança ou preservação cultural, e não por uma resposta genuína ao chamado de Deus para transformar o mundo. Essa atitude técnica, como explica Ellul, está profundamente enraizada na modernidade e reflete uma abordagem que prioriza a eficiência e o controle sobre os meios de interação com o divino e com o social.
Em contraste, a dinâmica em U oferece uma visão mais alinhada com a teologia bíblica da graça. Na dinâmica em U, a relação com Deus não é uma troca condicional, mas uma resposta à generosidade divina. Deus age primeiro, abençoando o ser humano de forma gratuita, sem que haja qualquer mérito ou ação inicial que justifique essa bênção. A resposta humana, portanto, é uma reação de gratidão e obediência, não como uma tentativa de garantir benefícios futuros, mas como uma expressão de amor e reconhecimento pelo que Deus já fez.
Aplicando essa dinâmica em U ao debate contemporâneo sobre a Opção Beneditina, podemos argumentar que o cristianismo não deve buscar se isolar do mundo em uma tentativa de preservar sua pureza ou assegurar seu futuro, mas sim responder à graça de Deus atuando no mundo, mesmo em meio à sua decadência. O teólogo neocalvinista Abraham Kuyper oferece uma perspectiva útil nesse ponto, ao afirmar que Deus estabeleceu diferentes esferas de autoridade – como a igreja, a ciência, a política e a família – e que cada uma delas deve funcionar de acordo com sua própria natureza, mas sob a soberania de Deus. Segundo Kuyper, os cristãos não são chamados a se retirar dessas esferas, mas a influenciá-las com a justiça e a graça divinas.
Nesse sentido, a Opção Beneditina pode ser vista como uma forma de rejeição à responsabilidade que o Cristianismo tem de engajar-se com a cultura. Ao isolar-se, os cristãos abdicam de seu papel de agentes de transformação no mundo, limitando sua atuação a subcomunidades fechadas que, embora preservem sua integridade interna, perdem a capacidade de impactar o restante da sociedade. Herman Dooyeweerd, outro pensador reformacional, destaca que esse tipo de isolamento contribui para a crise de desumanização e coletivismo que aflige a civilização ocidental. Quando os cristãos se retiram, deixam de oferecer uma alternativa ao individualismo radical e à massificação que caracterizam a modernidade, contribuindo indiretamente para a deterioração da sociedade.
Portanto, a dinâmica em U sugere que a resposta cristã à decadência cultural não é a retirada, mas o envolvimento ativo e amoroso com o mundo. O Cristianismo é chamado a atuar publicamente, demonstrando a justiça de Deus em todas as esferas da vida, sem ceder à tentação de criar subculturas isoladas. Em vez de esperar passivamente por uma oportunidade de reintegração, os cristãos devem trabalhar pela renovação cultural agora, à medida que aguardam o retorno de Cristo. Essa vivência cristã, baseada na graça e no serviço, reflete a confiança de que Deus está no controle de todas as coisas e que a fidelidade ao evangelho não exige isolamento, mas presença ativa no mundo.
Assim, enquanto a Opção Beneditina pode parecer atraente em tempos de crise cultural, ela representa uma forma de lidar com o desafio contemporâneo que se alinha mais à dinâmica em N, onde o isolamento é visto como um meio de garantir a preservação da fé. A alternativa oferecida pela dinâmica em U, entretanto, chama os cristãos a permanecerem engajados com o mundo, confiantes na soberania de Deus, e a viverem sua fé de maneira pública, como uma resposta à graça de Deus, que já foi dada livremente e sem condições. Essa abordagem oferece uma esperança mais robusta e ativa, que busca o bem comum e a renovação da sociedade, sem sacrificar o compromisso com a verdade e a justiça do evangelho.
Referências:
DOOYEWEERD, Herman. No Crepúsculo do Pensamento Ocidental. [Trad.] Brasília. Ed. Monergismo. 2018.
Dreher, Rod. A Opção Beneditina: Uma Estratégia para Cristãos em uma Nação Pós-Cristã. São Paulo: Ecclesia, 2021.
DREHER, Rod. A opção Beneditina: uma estratégia para cristãos no mundo pós-cristão. [Trad.] Campinas. Ed. Ecclesia. 2018.
Ellul, Jacques. A Técnica e o Desafio do Século. São Paulo: Paz e Terra, 1968.
KUYPER, Abraham. Calvinismo. [Trad.] São Paulo. Ed. Cultura Cristã. 2019
_________. Sphere Sovereignty. A Public Address Delivered at the Inauguration of The Free University (Oct. 20, 1880), 12
SMITH, James K.A. Aguardando o Rei. [Trad.] São Paulo. Ed. Vida Nova. 2020.
VOEGELIN, Eric. História das Ideias Políticas (vol. II). [Trad.] São Paulo: É Realizações, 2012
Essa dinâmica instrumentalizada, no entanto, pode distorcer a natureza do relacionamento cristão com Deus e com o mundo. Ao ver o isolamento como uma técnica para alcançar um fim desejado, corre-se o risco de reduzir a vida cristã a uma transação utilitária, onde as ações são motivadas pela busca de segurança ou preservação cultural, e não por uma resposta genuína ao chamado de Deus para transformar o mundo. Essa atitude técnica, como explica Ellul, está profundamente enraizada na modernidade e reflete uma abordagem que prioriza a eficiência e o controle sobre os meios de interação com o divino e com o social.
Em contraste, a dinâmica em U oferece uma visão mais alinhada com a teologia bíblica da graça. Na dinâmica em U, a relação com Deus não é uma troca condicional, mas uma resposta à generosidade divina. Deus age primeiro, abençoando o ser humano de forma gratuita, sem que haja qualquer mérito ou ação inicial que justifique essa bênção. A resposta humana, portanto, é uma reação de gratidão e obediência, não como uma tentativa de garantir benefícios futuros, mas como uma expressão de amor e reconhecimento pelo que Deus já fez.
Aplicando essa dinâmica em U ao debate contemporâneo sobre a Opção Beneditina, podemos argumentar que o cristianismo não deve buscar se isolar do mundo em uma tentativa de preservar sua pureza ou assegurar seu futuro, mas sim responder à graça de Deus atuando no mundo, mesmo em meio à sua decadência. O teólogo neocalvinista Abraham Kuyper oferece uma perspectiva útil nesse ponto, ao afirmar que Deus estabeleceu diferentes esferas de autoridade – como a igreja, a ciência, a política e a família – e que cada uma delas deve funcionar de acordo com sua própria natureza, mas sob a soberania de Deus. Segundo Kuyper, os cristãos não são chamados a se retirar dessas esferas, mas a influenciá-las com a justiça e a graça divinas.
Nesse sentido, a Opção Beneditina pode ser vista como uma forma de rejeição à responsabilidade que o Cristianismo tem de engajar-se com a cultura. Ao isolar-se, os cristãos abdicam de seu papel de agentes de transformação no mundo, limitando sua atuação a subcomunidades fechadas que, embora preservem sua integridade interna, perdem a capacidade de impactar o restante da sociedade. Herman Dooyeweerd, outro pensador reformacional, destaca que esse tipo de isolamento contribui para a crise de desumanização e coletivismo que aflige a civilização ocidental. Quando os cristãos se retiram, deixam de oferecer uma alternativa ao individualismo radical e à massificação que caracterizam a modernidade, contribuindo indiretamente para a deterioração da sociedade.
Portanto, a dinâmica em U sugere que a resposta cristã à decadência cultural não é a retirada, mas o envolvimento ativo e amoroso com o mundo. O Cristianismo é chamado a atuar publicamente, demonstrando a justiça de Deus em todas as esferas da vida, sem ceder à tentação de criar subculturas isoladas. Em vez de esperar passivamente por uma oportunidade de reintegração, os cristãos devem trabalhar pela renovação cultural agora, à medida que aguardam o retorno de Cristo. Essa vivência cristã, baseada na graça e no serviço, reflete a confiança de que Deus está no controle de todas as coisas e que a fidelidade ao evangelho não exige isolamento, mas presença ativa no mundo.
Assim, enquanto a Opção Beneditina pode parecer atraente em tempos de crise cultural, ela representa uma forma de lidar com o desafio contemporâneo que se alinha mais à dinâmica em N, onde o isolamento é visto como um meio de garantir a preservação da fé. A alternativa oferecida pela dinâmica em U, entretanto, chama os cristãos a permanecerem engajados com o mundo, confiantes na soberania de Deus, e a viverem sua fé de maneira pública, como uma resposta à graça de Deus, que já foi dada livremente e sem condições. Essa abordagem oferece uma esperança mais robusta e ativa, que busca o bem comum e a renovação da sociedade, sem sacrificar o compromisso com a verdade e a justiça do evangelho.
Referências:
DOOYEWEERD, Herman. No Crepúsculo do Pensamento Ocidental. [Trad.] Brasília. Ed. Monergismo. 2018.
Dreher, Rod. A Opção Beneditina: Uma Estratégia para Cristãos em uma Nação Pós-Cristã. São Paulo: Ecclesia, 2021.
DREHER, Rod. A opção Beneditina: uma estratégia para cristãos no mundo pós-cristão. [Trad.] Campinas. Ed. Ecclesia. 2018.
Ellul, Jacques. A Técnica e o Desafio do Século. São Paulo: Paz e Terra, 1968.
KUYPER, Abraham. Calvinismo. [Trad.] São Paulo. Ed. Cultura Cristã. 2019
_________. Sphere Sovereignty. A Public Address Delivered at the Inauguration of The Free University (Oct. 20, 1880), 12
SMITH, James K.A. Aguardando o Rei. [Trad.] São Paulo. Ed. Vida Nova. 2020.
VOEGELIN, Eric. História das Ideias Políticas (vol. II). [Trad.] São Paulo: É Realizações, 2012
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