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Palavra do leitor

Atração Fatal

Há alguns anos atrás, o cristianismo evangélico, no Brasil, possuía uma conotação negativa para a sociedade brasileira. Ser "crente" (como era conhecido o cristão evangélico), na visão do povo, era equivalente a ser: analfabeto, irracional, doido, inculto, pobre, ignorante, entre outros adjetivos que nos era atribuído. Parte desta imagem negativa nós mesmos passamos, outra parte, vem da imaginação fértil de quem está de fora, e, certa parcela, deve ser atribuída a satanás, em seu afã de sempre querer depreciar a obra de Deus.

Vivíamos meio que na defensiva, cheios de suspeita e desconfiança por tudo que era novo. O rádio, a TV, a política, a cultura, a tecnologia e até o avanço da ciência eram vistos com maus olhos por alguns, considerados inimigos que deviam ser combatidos.

Os pobres, e quase somente eles, eram o alvo na evangelização. A igreja, em sua maioria, era composta de pessoas das classes menos favorecidas da população brasileira. Muita coisa era importada de outras culturas e países (músicas, instrumentos, estilo e até alguns costumes). Os usos e costumes, a liturgia e as práticas cristãs experimentavam pouca evolução. Algumas eram bizarras, outras incompreensíveis e não faltavam as que eram inexplicáveis. Os seminários não eram bem vistos por alguns. De literatura, havia grande escassez.. os poucos livros que tínhamos eram de autores estrangeiros (infelizmente, esta é uma área em que não avançamos muito até o presente e esta tendência ainda insiste em permanecer).

Visivelmente, não havia grandes atrativos na fé evangélica. Mas foi nesse contexto que a igreja cresceu, avançou, desbravou e se estabeleceu no país como a maior força religiosa do mundo. Apesar da aparente "falta de atrativos", as pessoas afluíam aos pés de Cristo. Foi uma época de grande fervor e fortes convicções. Nos tornamos o celeiro do mundo, a maior parcela evangélica dele (até então os EUA podiam ser assim considerados, antes recebíamos missionários, hoje enviamos).

Atingimos camadas antes inalcançadas. Entramos na política, no rádio, na TV, nas faculdades, nos hospitais, na internet. Temos arrebanhado pessoas dos mais variados meios como: artistas, músicos, empresários, intelectuais, universitários, homens e mulheres da alta sociedade (já se chegou a falar num possível presidente evangélico). Temos atuado em áreas sociais como um dos principais parceiros do país na recuperação de pessoas, e cooperado ativamente em tragédias de cunho nacional que por vezes assolam a nação.

O quadro mudou, a liderança e a mentalidade e também o número. Muito do que importávamos, hoje exportamos. Agora temos estilo próprio. Cantamos nossas músicas, adoramos e cultuamos a Deus de maneira toda nossa. Tornamo-nos relevantes, fortes e atrativos. Agora dá até status ser evangélico. Temos atraído multidões (o que realmente as tem atraído?), todos nos apreciam e admiram com respeito. Alguns interpretam isto como sendo o mundo entrando na igreja para corrompê-la. Outros, mais otimistas, pensam que, enfim, a igreja entrou no mundo para transformá-lo.

Em meio a todo entusiasmo e euforia devido ao incrível poder de atração da igreja, é preciso algum cuidado. Há elementos do passado que devem ser preservados, outros, substituídos. Mas a pergunta chave é: O que temos atraído para as nossas igrejas, espectadores ou discípulos? Espectadores são atraídos pela visão do belo, confortável, agradável, admirável. Discípulos são atraídos pela Palavra pregada e vivida. Palavra que entra na mente desce ao coração e atua na vontade, chamando a um compromisso verdadeiro e a uma real mudança de vida. Enquanto houver shows, ali estarão os espectadores. Mas eles são volúveis, e se tornam cada vez mais exigentes. Somente com discípulos se pode contar. Os espectadores formam os grandes ajuntamentos; discípulos, por vezes, são em pequeno número. Espectadores dão resultados rápidos e fáceis pois são superficiais (assemelham-se às folhas de uma frondosa árvore). Discípulos dão muito trabalho para se formar, gasta tempo, mas, no fim, dão muitos frutos porque tem raízes profundas. O resultado é seguro. Espectador espera. Discípulo faz. Espectador gosta de ser servido. O discípulo serve. Nem sempre Jesus se animou muito com as multidões, embora nunca as desprezasse. Ele falou algo do seu poder de atração: "E eu, quando for levantado da terra, todos atrairei a mim" (Jo 12.32).

É preciso muito cuidado se o nosso principal alvo for números, estatística, grandeza e honra, pois nem sempre indicam resultados reais ou frutos dignos. Além do que, é Jesus quem deve atrair, não são as coisas, nem as pessoas, nem as formas, nem mesmo os resultados. Então, todo cuidado é pouco pois a atração pode ser fatal.
Belo Horizonte - MG
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