O castelo que chama
Deus é quem purifica minhas paixões, deixando-as sob controle para se tornarem dons
Por Xanthia

Dallas Willard disse certa vez que, “a graça é o oposto do mérito, não do esforço”. Na caminhada para descobrir sua vocação, lembrar-se disso é essencial, pelo menos foi para mim. Somos encorajados a pensar dentro das zonas de segurança, para termos a vida mais reta e tranquila possível, é isso que nosso coração quer: segurança. Mas, e quando se chega no momento fatídico em que somos jogados no coração do mar e nos gritam para nadar? “Qual meu chamado, Senhor? O que quer que eu faça?!”. Os medos que o mundo cultiva e as dúvidas acabam fazendo duas coisas: ou nos motivam a bater as pernas, ou nos afogam.
Estudei medicina por dois anos. Odiei. Pensei que ser instrumento de cura na vida de outras pessoas era a resposta óbvia para minha vontade de servir, e já que tive a chance, peguei. Em apenas dois anos, ignorei todos os dezoito anos que Deus me impeliu, não, agarrou minha mão sobre o papel e a caneta para criar histórias bizarras e grandiosas.
A ficção, sobretudo a escrita, sempre me fascinou, mas achei que essa área estava fadada a ser um hobbie, nada mais. Se Deus, porém, viesse em nuvens e relâmpagos decretando que eu deveria ser escritora, quem ousaria ir contra? Certamente, eu não.
Então, era isso que eu queria, que, enquanto estivesse no curso “errado”, Ele deixasse claro que não me queria ali, aparecesse, de preferência com uma voz estrondosa ou uma luz cegante e falasse que eu fui separada desde antes da fundação do mundo para escrever.
Porém, caro leitor, isso não aconteceu.
Melhor, Ele me fez entender, que o chamado que eu buscava, o propósito para preencher meus anos, concentrar a vida e sobre onde gastar toda energia, não são cursos nem paixões, é o próprio Senhor. Ele é o chamado.
O Deus perfeito e poderoso nos chama para servi-lo em tudo que criou. Davi foi fiel por, apesar de rei, reivindicar um reino e trono que eram do Senhor, sendo valente para tornar essa verdade conhecida. É assim que reagimos ao chamado da Verdade, evidenciando as mentiras.
Desisti de medicina porque estava presa aos medos e dúvidas que o chamado do Senhor me libertou há muito tempo. Ele é que purifica minhas paixões, deixando-as sob controle para se tornarem dons. Por entender isso, voltei a escrever e entrei no curso de letras. Não sou nenhuma Brontë, mas, para minha surpresa, Deus conduziu cada momento. O primeiro livro que publiquei foi escrito no meio de uma crise na medicina. Angustiada e perdida, escrevi a história em três dias, tendo apenas o título: Castelo Forte. Não é à toa que se chamasse assim: queria me sentir protegida, ouvida, consolada; voltar a sentir dentro de mim a chama que sempre me aqueceu e incentivou em cada passo, mas que passou, pouco a pouco, a se extinguir. Eu queria me refugiar no Senhor, que, no meio das dúvidas, era a constante, O Invariável.
Castelo Forte foi publicado meses depois que mudei para o curso de letras português, atraindo a atenção de uma editora, e foi lançado na mesma livraria onde eu passava minhas tardes quando criança, percorrendo os livros e classificando o estilo de cada editora.
É preciso força e coragem para vencer nossa desconfiança na Providência, pensando que Deus não vai cuidar assim tão bem dos seus. E só conseguimos ambos quando aprendemos a confiar no chamado, no nosso Deus. A tarefa dos crentes é confiar que é a graça que cria e preserva a vida. O nosso esforço é entregarmos essas paixões diante do altar e orar para que Ele mostre o lugar desses dons. Ele é quem decide se vai dar mérito a isso ou não.
Xanthia, escritora de ficção e fantasia cristã. Autora de Castelo Forte e de Senhores da Terra. @ xanthia.autora.
