Tudo pago?
Por Rafaela Senfft
Minha trajetória artística começou no curso de Artes Plásticas da Escola Guignard/UEMG. Especializei-me em fotografia e pintura, embora meu trabalho se estenda por outras técnicas. Meu ponto focal na fotografia é a figura humana, trabalho com modelo vivo e tenho investido nas suas expressões porque dão movimento às imagens num sentido dramático, precipitando a força da mensagem.
Percebo que é muito natural para quem faz Arte Contemporânea a dificuldade de conseguir expressar, quase que integralmente, o que se idealiza para determinada obra, de forma que o espectador capte uma percentagem, considerável do pensamento fundamental do artista. Na maioria das vezes que visito exposições de Arte Contemporânea, a essência da obra só vem depois que leio algo sobre ela, ou se eu já conhecia algum ponto da trajetória do artista.
Concordo que a arte deve ser uma ponte entre o pensamento do artista e a leitura do espectador, mas creio que deve haver um equilíbrio entre as expectativas artista–espectador, já que muitas vezes a linguagem conceitual do artista é diluída, somente lhe restando suas cruas formas, que para a arte pós-conceitual já não é o suficiente.
Esse é o maior desafio, proporcionar um equilíbrio entre a minha visão e a de quem vê meu trabalho. O equilíbrio é o desafio da Arte da pós-modernidade, onde é muito fácil que a ideia principal do artista se perca num turbilhão de informações imediatas, num tempo de escassa assimilação, mistura e superficialidade que nossa cultura atual nos leva.
Encontro no meio de arquivos antigos este trabalho que foi feito em 2008. São retratos, para os quais carimbei a testa de algumas pessoas com a palavra “pago” em vermelho; com um desses carimbos que as lojas usam quando compramos uma mercadoria. As pessoas que foram fotografadas admitem e professam o sacrifício de Jesus de Nazaré por suas vidas, são pessoas que vivem essa realidade, e o termo “pago” significa que elas foram compradas por Ele, foram restituídas, transformadas, aceitas e humanizadas.
Afinal de contas, todos nós carregamos em nós um “pago”, mas pago pelo quê? Quem ou o que tem nos comprado? Quantos hoje são como mercadorias compradas pelo materialismo, pelo hedonismo, pelo suborno em detrimento à justiça, etc. Qual é o preço de cada um de nós? Estes e outros possíveis questionamentos em torno de uma cultura materialista e individualista abraçam a reflexão deste trabalho que resgatei com imensa alegria.
- Rafaela Senfft é artista plástica formada pela Escola Guignard/UEMG, onde é professora de História da Arte Ocidental no curso de extensão. É membro de CIVA (Christian in Visual Arts) e congrega na Caverna de Adulão, em BH.