História de um milagre
Por Daniel Theodoro
Sejamos francos: melhor que viver a experiência de um milagre é só mesmo a oportunidade de contá-lo às pessoas. Milagres são histórias sem ponto-final, ecos no presente contínuo, uma aliança com o tempo. Quando o sujeito agraciado der o último suspiro, o milagre vivido por ele não morrerá, continuará sendo contado por outros irmãos, persistindo por anos.
Repare o leitor que não me refiro aqui ao maior e mais importante milagre de todos – Jesus Cristo! Falo de milagres menores, ocasiões que acontecem na vida daqueles que se dispõe a viver o cotidiano da fé, verdadeiros asteriscos escritos por Deus em nossa biografia. Que nem um anel de casamento recuperado via internet 20 dias após ter sido perdido por um marido descuidado numa pelada de society com os amigos numa véspera de feriado.
Penso que maridos carecem muito da intervenção sobrenatural divina, afinal somos seres atrapalhados. Aconteceu que fui convidado para bater bola com irmãos e padrinhos de casamento. Tudo gente da melhor qualidade, com um futebol humilde, mas sincero. Entre (poucas, mas) rápidas subidas ao ataque, perdi o fôlego em algum cruzamento para a área e me restou recuperar o ar no gol, o refúgio dos peladeiros incompreendidos. Sob a proteção das três traves, combati o bom combate, guardei a meta, e completei boas defesas.
Ao final da partida, contudo, percebi que estava sem o anel de casamento. Me senti nu, de chuteiras. Acredito que, em algum esforço digno de deixar os goleiros Cássio e Vanderlei enciumados, minha mão deve ter recebido o impacto da bola, e essa jogou o metal longe. Comuniquei às testemunhas presentes minha perda e o fim da minha carreira de goleiro para a ocasião.
Depois de gastar o resto do horário de reserva da quadra procurando o máximo símbolo matrimonial, me restou encarar a realidade, voltar para casa e dizer a verdade para a Fernanda. A verdade, porém, é sempre melhor aceita na companhia de um pote de sorvete, por isso antes passei no mercado e comprei o sabor preferido dela. Em casa, o leitor que estivesse presente diria que a cena foi qualquer coisa parecida com o retorno do filho pródigo ao lar.
Triste e cheio de vergonhas, apresentei minhas explicações e o sorvete, aceitando ficar com as sobras que ela deixaria no pote. Surpreso, dividimos generosas colheradas, um sorriso e um abraço. Como o sorriso da Fernanda é algo difícil de descrever, vou simplesmente narrar que vi nele um brilho mais puro que o ouro do anel, seguido pelas palavras: “tudo bem, acontece, vamos procurar”.
Há quem diga que o verdadeiro milagre da história vem só agora. Com a ajuda do gerente do society, três semanas depois e através do Facebook, descobri que o anel estava em posse da namorada de um garoto peladeiro que encontrou a joia naquela noite chuvosa de véspera de feriado.
Entendo, mas prefiro ver o milagre em algo mais simples, no sorriso da minha esposa. Ela tinha todo motivo para dar vazão à ira dela e me espinafrar, porque ela já tinha chamado minha atenção para o fato de que o anel estava largo e, mais cedo ou mais tarde, eu o perderia. Mas aquele sorriso e aquele abraço (e aquelas colheradas de Ben & Jerry’s) me ensinaram na prática que sempre é importante deixar a raiva secar antes de julgar. Tenho buscado agir assim desde então.
Às vezes buscamos grandes sinais sobrenaturais. Um machado flutuante, uma boca de felino fechada ou uma boca de jumenta aberta. Sim, eles acontecem e têm o potencial de mudar o rumo da História. Por outro lado, há os pequenos milagres do cotidiano. São eles que mudam as pessoas.
Espero que um dia eu tenha a oportunidade de contar essa história para meus filhos e netos; dizer-lhes que o maior milagre de todos os tempos segue sendo Jesus, e o segundo – menor, mas não menos importante – é ver Jesus na atitude das pessoas; contar-lhes que, por causa das nossas falhas, os anéis se vão, mas a aliança fica.
- Daniel Theodoro, 33 anos. Cristão “em reforma” e membro nascido na Igreja Presbiteriana Maranata de Santo André (SP). Casado com a Fernanda. Formado em Jornalismo e Letras.
Thales Rios
Bela história, mano! O natural é apenas um sobrenatural que a gente já se acostumou.
Deus abençoe aí!
Amoacy Ferreira Lima Filho
Legal cara. Que história legal. E a sua esposa ainda dividiu o sorvete contigo hehe
São através destes pequenos-grandes milagres que vem grandes lições e aprendizados, além de experiências muito importantes. 😀
Grande abraço, mano!
Deus abençoe vocês!
Mara Lucena
Um pequeno milagre, um lindo sorriso, uma grande aliança. Chuva de bençãos. ❤️❤️
Terezinha Almeida
Benção, primo! Adorei
Bjs a vcs.