Por Lucas Pedro

NÃO CONTÉM SPOILERS 

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Li a seguinte crítica sobre o filme do Coringa: “Trata-se de um filme errado, numa hora errada”. Achei exagerado. Após assistir, concordei em partes. Foi o primeiro filme que me fez ficar com medo de tomar um tiro de um doido qualquer na saída do cinema. Isso porque o filme parece ser uma sucessão de bons argumentos para qualquer um perder a cabeça, desistir deste arranjo social e moral que vivemos e partir pra anarquia. Uma narrativa de abandonos e desafetos em série, potencializada pela absurda interpretação de Joaquin Phoenix, coopera para entregar a sensação de que tudo aquilo é verídico ou totalmente factível.

Saímos do cinema com aquela indigestão típica dos filmes bons e pesados. Entramos no carro e partimos da crítica para a constatação de que isso está aí, acontecendo sem miséria em diversos lares destroçados, onde pessoas experimentam não só o desafeto das ruas cheias de gente, mas também da falta de intimidade e empatia dos seus.

Milhares de coringas encaram a realidade de não ter quem se interesse. Milhares enfrentam uma espiral descendente de abandono e descaso, muitas vezes sem ter a mínima oportunidade de encontrar apoio médico, emocional e espiritual. Milhões estão sozinhos ao redor de milhões, nas ruas, nos feeds e nos stories, disfarçando a tristeza com likes e memes repetidos.

Essa ausência cruel e tediosa, retratada no filme, acaba revelando o essencial que muitas vezes desdenhamos. A rara e preciosa empatia dos amigos próximos. O cuidado rotineiro dos parentes. A preocupação com a saúde física e emocional daqueles que convivem ao nosso redor. Essas coisas básicas que não podem faltar porque são os fundamentos de nossa vida afetiva e social. Essas coisas imprescindíveis que temos relativizado.

O Coringa é uma caricatura bizarra de todos nós quando usamos esse abandono e descaso social como justificativa para ferir o outro. Somos coringas sempre que aderimos ao mal como saída para essa antipatia e distanciamento do mundo pós-moderno. Afinal, é bem mais fácil ferir o outro que me ignora do que me tratar e entender que também faço o mesmo, vez ou sempre. Somos todos coringas em potencial.

Interpretando de modo otimista, o filme é sobre família, porque revela onde a falta dela pode nos levar. É aí que me lembro da dura orientação de Paulo a seu discípulo Timóteo: Aqueles que não cuidam dos seus, especialmente dos de sua própria família, negaram a fé e são piores que os descrentes (I Timóteo 5.8).

Uma família esfacelada é uma fábrica de Coringas, ainda mais em uma época e cultura onde estar rodeado de gente e seguidores, na maioria das vezes, não representa nenhum sinal de afeto, empatia ou pertencimento.

Chegamos em casa perplexos, mas também gratos a Deus pelo lar que somos. Por perceber que somos invisíveis para muitos, mas não para alguns que se importam. Talvez, olhando por esse ângulo, possa ser um filme errado na hora certa, pra que pelo menos a gente, que se assume cristão, entenda que é preciso ouvir o Mestre e ser Sal e Luz para milhões de invisíveis, antes que eles resolvam assumir sua maldade e pôr um sorriso vermelho na cara.

  • Lucas Pedro é autor do blog Transformai-vos. Atua na área de Comunicação e Web Design e ministra oficinas em diversas igrejas no Brasil.
  1. Eu assisti o filme Coringa. Realmente vivemos num espaço e tempo em que e mais fácil abandonar as pessoas, animais etc. Do que cuidar, dar atencao. Enfim gastar um pouco de tempo nesta correria diária. Muitas vezes somos abandonados por aqueles que menos esperávamos…

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