Por Amanda Almeida

Lewis afirma que “a amizade nasce no momento em que uma pessoa diz para a outra: ‘O quê? Você também! Pensei que eu era o único’”. Sendo assim, acho que somos capazes de criar um tipo de afeição direcionada a pessoas com as quais nem convivemos. Pelo menos é desse jeito comigo e com os autores que admiro.

Lá pelos primeiros períodos da faculdade, quando meu interesse por jornalismo cultural começou a ficar bem forte, foi crescendo também a vontade de entender melhor as relações entre arte e cristianismo. Mas parecia difícil encontrar em terras tupiniquins conteúdos que tratavam do tema com qualidade e profundidade. Até que encontrei A Arte e a Bíblia numa livraria, fui procurar por mais livros sobre o tema no catálogo de Ultimato, e vi que eu estava longe de ser a única a buscar um diálogo entre esses campos.

Francis Schaeffer, Rookmaaker e Steve Turner hoje são alguns desses autores que têm um lugar especial na minha estante. Desses que, enquanto lia, o pensamento “O quê? Você também! Pensei que eu era o único” era recorrente. Acredito que esse vá ser o caso de muitos cristãos interessados em arte. Se você precisa de um guia, de algumas indicações, aqui vão elas:

A Arte e a Bíblia

Glorificar a Deus com as artes significa simplesmente que o cristão deve usar as artes como uma forma de evangelismo? Francis Schaeffer, um dos pensadores cristãos mais influentes do século XX, defende que não. O dever do cristão é produzir e consumir a arte como algo belo para a glória de Deus.

A Arte e a Bíblia já é um clássico, no qual Schaeffer faz uma análise do registro da utilização de várias formas artísticas na narrativa bíblica, estabelecendo a partir disso uma perspectiva cristã sobre a arte. Ele desmitifica algumas noções comuns no meio cristão, propõe critérios de avaliação sobre a arte, e aponta caminhos claros para a relação do cristão com esse campo. E termina dizendo: “o cristão é alguém cuja imaginação deve voar além das estrelas”.

A Arte Não Precisa de Justificativa

Hans R. Rookmaaker é, talvez, o principal historiador e crítico cultural protestante do século 20. A Arte Não Precisa de Justificativa é um livro para quem produz arte e deseja usar seus talentos para a glória daquele que lhe entregou esses dons. Também é um livro para quem quer entender melhor qual deve ser o papel da arte em nossas vidas hoje. Em qualquer um dos casos, o apanhado histórico e a argumentação quem entende do assunto vão ajudar a clarear muitos dos pensamentos de quem se interessa por arte.

Ver os artistas como gurus da cultura ou como bobos da corte, e cobrar deles um sucesso que só virá se aderirem à moda do momento, por exemplo, não são problemas novos.  É preciso ter discernimento para interpretar o que está por trás disso e buscar soluções para o cenário de hoje. E para começar a compreender a afirmação do título, fica uma frase de Rookmaaker: “As coisas têm valor por aquilo que são, e não pelas funções que exercem, por mais que estas sejam importantes”.

A Arte Moderna e a Morte de Uma Cultura

Em A Arte Moderna e a Morte de uma Cultura, Rookmaaker faz reflexões mais profundas, apresentando os movimentos e a turbulência cultural dos anos sessenta e seu impacto especialmente sobre o mundo das artes. Você consegue imaginar como a produção musical, a arte performática, as artes visuais ou o cinema contemporâneo atingem nossas crenças fundamentais, surtindo efeitos em nossa caminhada cristã?

O que o autor defende é que esses movimentos do século XX não colocaram em jogo somente questões sociais, mas também as espirituais. Como relacionar a fé cristã com os diferentes campos da cultura em um terreno tão movediço? Em sua argumentação, Rookmaaker envolve-se com o mundo da arte no lugar de simplesmente condená-lo. Ele critica fortemente a arte moderna, mas foca no que acredita ser o cerne de sua aparente destrutividade: uma sensação de perda e desespero, que ainda vemos no século XXI.

Cristo e a Criatividade

Michael Card já gravou mais de 37 álbuns. Também já escreveu mais de 25 livros. Cristo e a Criatividade é um deles. Nele, fala sobre nosso desejo pela beleza, nosso chamado para sermos criadores, à imagem do Deus Criador, sobre a criatividade cultivada e desfrutada em comunidade, e muito mais em torno do tema.

A experiência da leitura fica ainda melhor porque sendo ele mesmo artista, Michael Card consegue unir os ensinamentos bíblicos e os exemplos de busca e concretização daquilo na prática. Minha reflexão preferida é sobre sermos “pessoas Estrela do Norte”, aquelas que apontam o Caminho, enquanto o mundo não para de girar. Ao final do livro, Card ainda deixa uma lista com 11 conselhos práticos para crescermos em criatividade.

Cinema e Fé Cristã

Brian Godawa, um premiado roteirista, dedica o livro à memória de Schaeffer e Rookmaaker, que o “ensinaram a perceber as visões de mundo apresentadas pela arte”. E é esse o exercício que o autor procura fazer em Cinema e Fé Cristã, ao apresentar temas como redenção, existencialismo, pós-modernismo, fé e vários outros ao longo dos capítulos.

Descritivo e didático, Brian traz exemplos de inúmeros filmes, com várias tabelas para demonstrar os arcos narrativos das histórias abordadas, dicas de referências externas, e propostas de exercícios, com um guia para que o leitor assista a certos filmes com o olhar treinado para observar aspectos específicos que tornarão a experiência mais proveitosa.

Engolidos Pela Cultura Pop

Eu nem suspeitava que Engolidos Pela Cultura Pop se tornaria um dos meus livros preferidos. Nele, o jornalista Steve Turner traz reflexões bem lúcidas quanto às nossas formas de produção e consumo das expressões artísticas e culturais presentes em cada capítulo. Literatura, propaganda, novas tecnologias, celebridades, cinema… Ninguém está imune à cultura da nossa época. Como lidar então com a influência dela no nosso dia a dia?

A base sobre a qual Turner constrói seu pensamento por todas as páginas é essa: é preciso tentar enxergar a arte, a mídia, a cultura em geral e tudo que permeia nossa vida toda como Deus vê. Essa caminhada pode ser penosa, mas é, em muito maior grau, graciosa. Ao final de cada capítulo, Turner propõe perguntas para discussão, sugere ações práticas e indica livros e sites para mais referências, o que expande a reflexão.

A Morte da Razão

Mais um de Schaeffer, que dessa vez não é necessariamente sobre arte, mas nos ajuda muito a contextualizar e a entender certas coisas. Em A Morte da Razão o autor aborda as transformações dos pensamentos vigentes na sociedade ao longo dos séculos, algo que pode ser observado – e muito – através da arte de cada tempo.

O livro foi publicado originalmente em 1968 e já trazia a noção de que é a razão e não “o que você está sentindo no coração” que deve ser a base para a busca da verdade. Quase 50 anos depois, em tempos de “pós-verdade”, essa é uma reflexão ainda mais necessária. Como entender uma sociedade assim? Como comunicar o evangelho a ela? As duas respostas passam pela arte.

Ser Evangélico Sem Deixar de Ser Brasileiro

O que faz do brasileiro, brasileiro? O que faz do evangélico, evangélico? O que o cantor, compositor e pastor Gerson Borges percebeu é que muitas vezes parece que entrar na igreja é sair do Brasil. Temos dificuldade de aceitar as manifestações culturais do país, mas criamos versões “gospel” de quase tudo. E aí vêm as perguntas: como ser evangélico sem deixar de ser brasileiro? Que lugar a cultura brasileira deve ter na vida dos cristãos?

O que Gerson faz é convidar o leitor para bater um papo sobre cultura e graça, o que funciona muito bem, por conta do estilo adotado por ele no livro, bastante dinâmico. Se somos evangélicos, precisamos redescobrir a música, a poesia e a literatura nacional. E, para sermos brasileiros em nossa adoração, é preciso também redescobrir o que a Bíblia diz sobre arte e cultura. Vale a pena aceitar o convite para essa conversa.

 

Ah! E pra quem gosta de biografias, fica uma dica extra: Rookmaaker – Arte e Mente Cristã.

 

  • Amanda Almeida, 24 anos. É formada em Comunicação Social e faz mestrado em Estudos de Linguagem. Escreve para o blog Ultimato Jovem sobre cinema.
  1. Amei. Sou estudante de Artes Visuais. E estava procurando algo que falasse da relação entre Cristianismo e Arte.
    Acredito que estou no caminho.

    Obrigada, Amanda!
    Deus continue abençoando sua vida!
    Amei!!!!

  2. Amei as indicações! Vou correndo atrás de ler o primeiro livro indicado, parece ser o que estou procurando. Acabei de ler A Beleza Salvará o Mundo, de G Wolfe.

  3. Gente! Lendo um artigo como esse, pergunto-me: onde eu estava até agora? Tanta indicação preciosa, tanto papo edificador e inteligente, e eu perdendo tempo nesse Twitter com esse bando de “estrelinhas” arrogastes do jornalismo e de outras bandas. Seu texto determinou minha permanência no Twitter. Quanto aos livros, só li o do Schaeffer até agora. Grande abraço.

  4. Amanda que artigo top. Eu comecei fazer a disciplina de Artes, incluida na pedagogia e queria uma amarração com a religião algo que agregue e achei sua materia. Parabéns de verdade!!!

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