Se Cristo não ressuscitou, não temos nada para anunciar nem vocês têm nada para crer (1 Co 15.14)

A morte está morta: Aleluia! 

Em toda a Bíblia ninguém escreveu tanto sobre a ressurreição do corpo como Paulo, aquele a quem o Senhor, depois de ressuscitado, apareceu por último. O texto mais longo, mais explícito, mais encorajador e mais entusiasta sobre a ressurreição de Cristo e dos mortos é da lavra de Paulo. Assim como o mais bonito texto sobre o amor é o capítulo 13 de 1 Coríntios e o mais bonito texto sobre a fé é o capítulo 11 da Epístola aos Hebreus, nada supera o que o apóstolo escreveu sobre a ressurreição do corpo no capítulo 15 de 1 Coríntios. Ele começa de mansinho e termina com um grito de enfrentamento com a morte: “Onde está, ó morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?” (1 Co 15.55). Por pouco o profeta Oséias não se levanta do túmulo para cobrar seus direitos autorais sobre a frase de vitória (Os 13.14) ou para fazer um dueto com o ex-torturador dos cristãos (At 26.11).

Aleluia nº 1: Cristo ressuscitou!

Antes de dizer uma palavra sequer sobre a ressurreição dos mortos, Paulo fala sobre a ressurreição de Cristo, porque aquela depende desta. Ele reafirma a sua morte somatopsíquica (Jesus não se fingiu de morto) e vicária (“morreu pelos nossos pecados”), reafirma o seu sepultamento, reafirma a sua ressurreição no terceiro dia e reafirma as suas primeiras e posteriores aparições (1 Co 15.1-11). Paulo fornece também um dado de grande importância, até então desconhecido: Cristo “apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma só vez, a maioria dos quais ainda vive, embora alguns já tenham adormecido” (1 Co 15.6). E dá seu testemunho pessoal: “Depois destes apareceu também a mim, como a um que nasceu fora de tempo” (1 Co 15.8). Refere-se obviamente ao incidente que se dera vinte anos antes (35 d.C.) na estrada de Damasco, quando ele ouviu claramente a voz de Jesus, que lhe dizia “Saulo, Saulo, porque você me persegue?” (At 9.4).

Aleluia n° 2: A ressurreição de Cristo continua na ressurreição dos mortos

Depois de mencionar fatos históricos e comprovados ligados à ressurreição do Senhor, o apóstolo mostra que a ressurreição de Cristo está cimentada com a ressurreição dos mortos. Se já é corrente pregar a primeira, já não é possível negar a segunda. Se derrubarmos um pilar, somos obrigados a derrubar o outro. Não se pode escolher uma das doutrinas como aceitável e a outra como inaceitável. Ambas são inseparáveis, como o são os dois átomos de hidrogênio e o átomo de oxigênio na composição da água. “Se não há ressurreição dos mortos, então Cristo deve estar morto ainda” (1 Co 15.13, BV).

Aleluia n° 3: Não há lugar para o desespero porque não existe a hipótese da não-ressurreição do Senhor! 

Se na destruição do templo de Jerusalém não ficou uma pedra sobre a outra (Mt 24.1), na negação da ressurreição dos mortos ou na negação da ressurreição de Cristo não fica um fato sobre outro: tudo desmorona. Se Cristo ainda está morto, se não foi ressuscitado, então está tudo perdido! Paulo tenta fazer uma lista das demolições:

1) “Se Cristo não ressuscitou, não temos nada para anunciar nem vocês têm nada para crer” (1 Co 15.14, NTLH) ou “vazia é a nossa pregação, vazia também é a vossa fé” (BP) ou “nem a nossa pregação, nem a vossa fé têm qualquer significado” (Phillips)

2) Se Cristo não ressuscitou, “nós, os apóstolos, somos todos uns mentirosos porque dissemos que Deus levantou Cristo do túmulo e isto logicamente não é verdade se os mortos não voltam novamente à vida” (1 Co 15.15, BV)

3) Se Cristo não ressuscitou, “vocês são muito tolos, se continuam a confiar que Deus os salva, pois ainda estão sob condenação devido aos seus pecados” (1 Co 15.17, BV)

4) Se Cristo não ressuscitou, coisa horrível, “os que morreram crendo em Cristo, morreram e são perdidos por completo” (1 Co 15.18, Phillips)

5) Se Cristo não ressuscitou, nossa esperança em Cristo só vale para esta vida. Neste caso, somos, “sem dúvida, de toda a humanidade, os seres mais miseráveis!” (1 Co 15.19, Phillips). Paulo não se detém nas conjecturas sombrias e até mesmo sádicas da demolição dos alicerces da ressurreição. Porque não existe a hipótese da não ressurreição do Senhor, nem a da não ressurreição dos mortos. Ele queria apenas mostrar o tamanho da tragédia e a quantidade dos escombros decorrentes dela. A mudança da dúvida para a certeza, do desespero para a esperança, da heresia para a ortodoxia, começa com este pronunciamento: “Mas o facto mais importante é que Cristo realmente ressuscitou dos mortos [e] foi mesmo o primeiro a ressuscitar de todos aqueles que dormem o sono da morte” (1 Co 15.20, Phillips).

Aleluia n° 4: sob Cristo todos ressuscitaremos para a vida

Se o fio condutor do pecado e da sua irmã gêmea, a morte, é o Adão do jardim do Éden, o fio condutor da graça e de sua irmã gêmea, a ressurreição dos mortos, é o Jesus do jardim do Getsêmani (1 Co 15.21). Dois anos depois de escrever aos coríntios, Paulo escreveria aos Romanos sobre a desastrosa desobediência daquele que gosta de chamar de “primeiro Adão” e sobre a abençoada obediência daquele que ele gosta de chamar de “segundo Adão” ou “último Adão” (Rm 5.19). “Como descendentes de Adão e membros duma raça pecaminosa todos morreremos [mas] como membros do Cristo de Deus todos ressuscitaremos para a vida” (1 Co 15.22, Phillips). A ressurreição já começou, primeiro com Cristo (cerca de 30 d.C.) e depois com todos os que lhe pertencem, quando ele vier em poder e muita glória (em ocasião desconhecida de todos).

Aleluia n° 5: A morte está morta!

A ressurreição do corpo resolve o problema da morte, cancela a morte, desfaz a morte, devolve a vida roubada e devorada pela morte. Mas a morte não é o único inimigo de Deus e dos homens. É o pior de todos, o maior de todos e, na agenda de Deus, é o último a ser aniquilado. É por isso que Cristo tem de continuar a reinar até o fim da história, “até que Deus faça que ele domine todos os inimigos” (1 Co 15.25, NTLH), até a total destruição de todo domínio, autoridade e poder das pessoas e forças que se opõem à ele. O grand finale, porém, só virá depois da derrota da morte, depois da morte da morte, depois do enterro da morte, depois de a morte ser lançada no “lago de fogo”, depois do desaparecimento da morte (Ap 20.14). Para esta apoteose o primeiro de todos os mortos (Abel) e todos os outros, e nós, os vivos, estamos a caminho, cada vez mais próximos!

Aleluia n° 6: O corpo ressurreto será semelhante ao de Jesus!

A ressurreição do corpo no final dos tempos não será a ressurreição do corpo anterior, como aconteceu com o filho da viúva de Sarepta (1 Rs 17.17-24), com o filho da sunamita (2 Rs 4.32-35), com o filho da viúva de Naim (Lc 7.11-17), com a filha de Jairo (Lc 8.51-56), com Lázaro (Jo 11.38-44) e com Dorcas (At 9.36-42). Não será um mero prolongamento ou repetição da vida terrena. Será algo absolutamente novo. Paulo tenta explicar: “Nossos corpos terrenos, que morrem e apodrecem, são diferentes dos corpos que teremos quando voltarmos novamente à vida, pois estes nunca morrerão. Os corpos que agora possuímos causam-nos tropeço, pois ficam doentes e morrem; entretanto, estarão cheios de glória quando voltarmos à vida novamente. Sim, são fracos porque agora são corpos mortais, mas quando revivermos, eles serão cheios de força. Quando morrem são apenas corpos humanos, porém, quando voltarem à vida, serão corpos sobre-humanos. Como existem corpo naturais, humanos, assim também há corpos sobrenaturais, espirituais” (1 Co 15.42-44, BV).

Na tentativa de explicar a glória do corpo depois da ressurreição, Paulo chega a afirmar que Jesus “transformará os nossos corpos humilhados, tornando-os semelhantes ao seu corpo glorioso” (Fp 3.21). Em sua primeira Epístola, João afirma o mesmo: “Quando [Jesus] se manifestar, seremos semelhantes a ele” (1 Jo 3.2). O processo de salvação só termina com a glorificação (o contrário de humilhação) do corpo: “Aqueles que [Deus] de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8.29).

Cada um de nós, depois da ressurreição, teremos nossa identidade e história pessoal mantidas (isso é continuidade), embora em outro corpo, então glorioso (isso é descontinuidade). A biologia dos mortos que tornaram a viver no decurso da história bíblica é uma, mas a biologia do corpo da ressurreição final será outra, impossível, agora, de ser estudada, investigada e entendida!

Texto originalmente publicado na edição 304 de Ultimato.

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