Mesmo sendo mau por natureza, egocêntrico, causador de injustiça social, responsável por todo ódio e guerras que há no mundo desde o início da história — o ser humano é admirável!

Ele pensa e fala. É capaz de falar muitas línguas, de famílias e ortografias diferentes. Mesmo cego é capaz de ler (com os dedos). Mesmo surdo, é capaz de ouvir (com os olhos). Mesmo deficiente físico, é capaz de participar de várias competições (com ou sem próteses).

Ele é capaz de abrir o corpo de alguém que acabou de morrer e retirar de lá o coração, o pulmão, o fígado, o estômago, o rim e colocá-los no corpo de outra pessoa, que de outro modo morreria quase em seguida. É capaz de fazer outros transplantes, de córnea, de pele, de ossos e até de cabelos.

Ele é capaz de curar o corpo e a mente por ter criado ciências como a medicina, a psiquiatria, a psicologia, a fisioterapia, a nutrição e a farmacologia. Ele é capaz de fabricar uma variedade quase incontável de remédios para aliviar a dor, para prolongar a vida ou para curar quase qualquer doença (nem em todos os casos).

Ele é capaz de aprender e ensinar os segredos da engenharia, da arquitetura, da matemática, da física, da química, da biologia, da economia, da agronomia, da administração, da pedagogia, do direito, da filosofia, da sociologia, da informática e de outras ciências.

Ele é capaz de inventar o macarrão, a linguiça, a salsicha, o açúcar, o adoçante artificial, o óleo vegetal, a manteiga, o cachorro-quente, o chá, o café, a goiabada, a batida de coco, o refrigerante, o milho de pipoca, o iogurte, o sorvete, o chocolate e muitas outras coisas mais agradáveis ao paladar do que benéficas à saúde. Tudo por acaso ou graças à engenharia de alimentos.

Ele é capaz de inventar a lira, o pandeiro, a harpa, a flauta, o órgão de tubos, o teclado, o violino, o violoncelo, o piano, a trompa, o trompete, o trombone, o contrabaixo, o oboé, o clarinete, o violão, a bateria e outros instrumentos de música. Ele sabe compor sinfonias, oratórios, óperas, marchas, chorinhos, valsas e outros ritmos. Ele produz música clássica, música sacra, música popular, música fúnebre, música romântica, música alegre, música triste, música militar, música de Carnaval. Ele sabe orquestrar e reger orquestra de câmara, orquestra de cordas, orquestra sinfônica, corais e bandas de música. Ele sabe gravar tanto o som como a imagem, colocando a música para além do teatro, do palco, do conservatório, da igreja.

Ele sabe assoviar, sabe cantar, declamar, discursar, pregar, orar, gritar, sussurrar. Ele sabe cantar sozinho, em dueto, em quarteto, em coro, em uníssono, com ou sem acompanhamento. Ele sabe chorar, com muita razão ou sem razão alguma. Ele sabe pintar coisas que vê ao seu redor (pessoas, animais, natureza e objetos inanimados), acontecimentos históricos, cenas religiosas ou qualquer coisa que flua em sua mente.

Ele sabe escrever cartas, documentos, discursos, aulas, sermões, romances, livros didáticos, poemas, dramas, documentários, tratados de história e de filosofia, obras científicas, peças de teatro, letras de música, roteiros de cinema.

Ele inventa o balão, o aeroplano, o dirigível, o planador, o avião sem piloto, o turboélice, o cruzador, o transatlântico, o porta-aviões, o submarino, a nave espacial, o robô. Inventa o telégrafo sem fio, o cabo submarino, o código morse, o telefone, o celular, o rádio, a televisão, o computador, o “datashow”, o GPS, o paraquedas, as armas de fogo, o trem, o automóvel, a bicicleta, o carrinho de mão, o elevador, o portão que se abre à distância com um simples comando manual, o perfume, a tesoura, os cosméticos, a cirurgia plástica, o cortador de unha e de grama e cada vez mais outros instrumentos necessários ou supérfluos. Ele extrai e armazena eletricidade da natureza, inventa a lâmpada, a lanterna, o farol, os holofotes, o pisca-pisca, a luz vermelha, a luz verde, o fio, a tomada, o interruptor, o aquecedor, a geladeira, o freezer, o frigobar, a torradeira, o liquidificador, o micro-ondas e muitos outros aparelhos que diminuem o esforço manual e nem sempre simplificam a vida.

Ele inventa e aperfeiçoa a máquina fotográfica, a câmera digital, a filmadora. Ele é capaz de construir edifícios com dezenas de andares, pontes sobre rios e mares, viadutos, torres (gêmeas ou não), ilhas artificiais, obeliscos, monumentos, favelas, casas populares e condomínios de luxo, túneis sob as montanhas e os mares. Ele inventa o tijolo, a argamassa, a serra, a madeira compensada, a cerâmica, a tinta, o guindaste, a tubulação, a caixa d’água, a torneira que abre e fecha só com a aproximação das mãos.

O ser humano é admirável porque ele cava a terra e encontra areia, rios subterrâneos, água mineral, minério de ferro, pedras preciosas, prata, ouro e petróleo. Na crosta terrestre ele ainda encontra carvão mineral, alumínio, estanho, manganês, mercúrio, níquel. Misturando uma coisa com outra ele pode obter, por exemplo, o aço e outros produtos e subprodutos. Do petróleo ele tira gasolina, combustível de aviação, óleo diesel, graxas com as quais ele fabrica lubrificantes, detergentes, plásticos, explosivos, pneus de borracha e muitas outras coisas.

Se a vaidade não fosse um risco perigosíssimo, o ser humano poderia se gabar de ser “apenas um pouco menor do que Deus”, como dizem as próprias Escrituras (Sl 8.5). O que complica tudo é que “o coração humano é terrivelmente sombrio e enganoso, um enigma que ninguém consegue decifrar” (Jr 17.9)!

Texto originalmente publicado na edição 338 de Ultimato.

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