Vivendo para a glória do reino, entre flores e espinhos
Por Amanda Luiza Ferreira D. Montes
Meu nome é Amanda Luíza. Nasci na cidade de Serrita, no Sertão Central de Pernambuco, onde a maioria esmagadora da população era e ainda é devota de Padre Cícero ou de Frei Damião. É a terra natal da família de minha mãe, Armania Maria, ao passo que meu pai, José Leôncio, é natural do município paraibano de Santa Luzia.
Devido a complicações no parto, sofri uma luxação no ombro esquerdo com paralisia braquial, e, por isso, nasci sem movimento no braço. Levaram-me a vários médicos, e todos eles deram o mesmo prognóstico, isto é, que não havia cura possível para mim e que, provavelmente, meu braço ficaria atrofiado. Meus pais ficaram muito abatidos, mas não tardou para que soubessem, por meio de uma médica, em Recife, de um novo procedimento de cirurgia de ombros em recém nascidos, chegado fazia pouco tempo ao Brasil, e, embora fosse um procedimento complicado, de altíssimo risco, esta notícia lhes reavivou a esperança.
Por volta dos meus três meses de idade, um pouco antes de esta cirurgia ser marcada, minha avó materna, Maria Nila, já convertida ao Evangelho, pediu autorização aos meus pais, que na época ainda não eram cristãos, para que o pastor Francisco das Chagas Amorim fizesse uma oração em meu favor. Trata-se de um grande homem de Deus, cheio de fé, íntegro, equilibrado e muito querido e respeitado por todos.
Meus pais consentiram, e minha avó, tomando-me no colo, levou-me até a casa do pastor Chaguinha, como é conhecido na região, e ele, bem firmado na Palavra e na Sã Doutrina, vendo o meu braço sempre imóvel, colado ao corpo, como que sem vida, lembrou que tudo é possível àquele que crê quando pedimos em harmonia com a vontade do Senhor. E, então, elevou sua mansa voz ao Pai celeste, intercedendo por minha cura e por minha vida. Tendo orado, ele manifestou à minha avó que, pela testificação interior do Espírito Santo, cria piamente que a arriscada cirurgia seria desnecessária, porquanto antes disso, pela graça de Deus, eu já estaria curada.
Dias depois desta oração, minha mãe me levou a Recife para uma revisão e para marcar a cirurgia. Hospedamo-nos na casa de parentes que residiam no bairro do Rio Doce, em Olinda, e ali, consoante as palavras do amado pastor de Serrita, Deus realizou, aos olhos de minha mãe e de todos, um milagre na minha vida: de repente, passei a mexer normalmente o braço esquerdo, e, inclusive, o levantava acima da cabeça, coisa que eu jamais havia feito.
Impressionada, minha mãe me levou à médica que faria a avaliação, e esta, depois de todos os procedimentos e exames, disse que não havia mais necessidade de qualquer cirurgia, pois eu estava curada, e que a única explicação que ela como médica podia dar é que, realmente, havia acontecido um milagre.
Este caso impressionou de tal modo minha mãe que ela passou a me levar à igreja de minha avó, que era liderada pelo pastor Chagas, e cuja capela, a propósito, havia sido apedrejada algumas vezes, por conta do ambiente hostil de intolerância religiosa que ainda imperava ali. E, quando minha mãe não me levava, pedia à minha avó ou a uma tia que o fizesse.
Minha história foi relatada no livro “Semeadores”, lançado em João Pessoa, Paraíba, pela Editora Betel Brasileiro, e eu cresci ouvindo a respeito desse Deus que me curou, tendo muito prazer, mesmo ainda criança, em estar em Sua casa. Aos nove anos de idade, eu era tão convicta quanto à salvação em Jesus que manifestei o meu desejo de ser batizada, o que, de fato, aconteceu sem muita demora. Completei os meus 10 anos no dia 7 de outubro de 1997 e desci às águas batismais menos de três semanas depois, ou seja, no dia 25, ensejo em que também foram batizadas outras pessoas, entre as quais minha mãe.
Da adolescência ao seminário
Aos 11 anos, aprendi a tocar violão, e já trabalhava auxiliando o meu pastor em diversas atividades da igreja, bem como no programa que tínhamos na rádio comunitária da cidade, aos domingos à tarde, e ainda me envolvia intensamente tanto em trabalhos com crianças como em ações evangelísticas realizadas nos sítios vizinhos, aonde íamos de “pau de arara”, desconfortáveis, mas felizes pelo rico privilégio de servir ao Senhor que nos resgatou.
Não sei precisar a data, mas eu tinha uns 12 ou 13 anos quando, certo dia, ao ler o profeta Isaías, deparei-me com o capítulo 6, que relata a sua visão e chamado, e então fui fortemente tocada por aquela passagem. Lembro-me que orei de joelhos em meu quarto, respondendo ao Senhor com as mesmas palavras do profeta: “Eis-me aqui, envia-me a mim.” Talvez não tivesse noção tão profunda do que tais palavras significavam, mas no meu interior havia um desejo sincero e ardente de dedicar minha vida inteira ao Senhor Jesus.
Cresci e fui batizada na Igreja Missionária Evangélica do Betel Brasileiro. Enquanto todas as adolescentes e jovens que ali congregavam comigo ansiavam ir para o Seminário Teológico Evangélico Betel Brasileiro, em João Pessoa – PB, eu era a única que dizia que não queria ir, pois acreditava que era vontade do Senhor que eu O servisse na área da música. Mas, por incrível que pareça, a única daquele grupo que não almejava ingressar no referido seminário foi a única que de fato ingressou, anos mais tarde, a saber, em fevereiro de 2005, com a idade de 17 anos. Isto se deu porque seria oferecido ali um curso de Teologia com Concentração em Música Sacra, que muito me interessou, mas, por fim, o Senhor me guiou a cursar Teologia com Concentração em Missiologia.
A partir daí, passei por muitas experiências. Tive grandes dificuldades financeiras para me manter no seminário e fui acometida de muitas crises, longe da minha terra e dos meus familiares. Surgiram, ainda aos 17 anos, as minhas primeiras composições musicais, porque eu sempre respirei música. Meu sonho, na verdade, desde criança, era ser pianista, mas por conta da marca que aprouve a Deus deixar em meu braço para que eu nunca esquecesse o que Ele fez por mim, não consegui aprender a tocar o tão sonhado piano. Em contrapartida, aprendi a tocar violão, que desde então se tornou o meu “Doce Companheiro” em todos os lugares para onde o Senhor me leva ou por onde passo anunciando o Seu amor e salvação por meio da palavra cantada e pregada.
Tempo de espinhos
Em dezembro de 2008, aos 21 anos, concluí o curso teológico, sem ter certeza alguma do que viria pela frente. Em princípios do ano seguinte, quando menos esperei, estava indo para Exu – PE, a 79 km de Serrita, minha terra natal, com a missão auxiliar em diversas frentes, incluindo a secretaria da extensão do curso teológico do seminário de João Pessoa – PB. Ali, trabalhei com jovens e crianças, além de coordenar o ministério de louvor e cuidar do som da igreja.
Mas, para falar a verdade, aqueles foram os três anos mais espinhosos da minha vida. Passei por terríveis situações de injustiça e decepções em relação a alguns líderes locais da minha confissão. Machucada, indignada e desiludida, tomei a dura decisão de sair do ministério. Percebi que o tão florido quadro pintado aos nossos olhos na época do seminário difere muito do que, não raro, verificamos na prática. Os textos bíblicos que me acompanhavam, como Isaías 40:31, Salmo 126:6 e 2 Coríntios 4:7 (texto da minha turma) pareciam não fazer sentido no contexto que vivenciei naquele período.
Quis fazer outra faculdade, e acabei por ingressar no curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas do Centro Universitário Doutor Leão Sampaio, em Juazeiro do Norte – CE. Passei por muitas dificuldades, mas Deus foi gracioso com Sua filha desencantada e ferida. Fosse por meio de uma circunstância ou de Sua Palavra, ele sempre me fazia ver claramente Seu cuidado, fidelidade e amor para comigo, reacendendo no altar do meu coração a flama da paixão pelo Seu Reino e fortalecendo a convicção de que Ele, deveras, tinha um chamado para a minha vida. Prova disso é que, quando eu menos esperava, perto do final do segundo ano do meu curso, por volta de novembro de 2013, Ele me proporcionou a oportunidade de coordenar o Curso de Capacitação de Obreiros Sertanejos. Era uma parceria do Movimento Nacional de Evangelização do Sertão Nordestino com o Seminário Teológico Evangélico Betel Brasileiro, ou seja, o mesmo no qual eu havia me formado e para o qual trabalhara na extensão, em Exu, também no formato modular. Assim, feliz e grata, tive então mais uma oportunidade de dizer sim ao chamado do Senhor!
Do sertão a Minas Gerais
Em dezembro de 2017, casei-me, em minha cidade natal, Serrita – PE, com o pastor batista Glicério Montes, que até ali, pelo período de nove anos, havia atuado como missionário nos campos sergipano, fluminense, mineiro e pernambucano. Era nosso propósito, desde o início, nos estabelecermos em Minas Gerais, mas, antes de nos mudarmos, laboramos juntos pelo período de sete meses naquela parte do Sertão Central de Pernambuco, desenvolvendo diversas atividades missionárias com a Igreja Evangélica Missionária do Betel Brasileiro, minha igreja de origem, e também com a Congregação Batista de Serrita, que dirigimos interinamente, por ocasião da ausência da missionária Jocélia Feitosa, que estava sem tirar férias fazia quase 10 anos.
Quando, por fim, fazíamos os nossos preparativos com vistas à nossa vinda para Minas Gerais, ambas estas igrejas prepararam emocionantes cultos de despedidas com lindas homenagens, lágrimas e, sobretudo, orações em favor desta nova etapa de nossas vidas, de modo deixamos Pernambuco profundamente tocados com tantas demonstrações de amor e carinho.
Chegamos à Viçosa, Minas Gerais, no dia 3 de maio de 2018, e, mal tendo acabado de colocar meus pés pela primeira vez nesta graciosa e acolhedora cidade, fomos recebidos com flores, presentes, lágrimas, muitos abraços e até um carinhoso e tocante cartaz de boas-vindas pelos irmãos da Igreja Batista Memorial, da qual meu esposo era membro muito amado e estimado por todos. Alguns irmãos da Igreja Presbiteriana também participaram desta tão amorosa e inesquecível recepção, e depois, reunidos em torno de uma mesa bonita e farta na casa de nossos novos e tão gentis senhorios, todos nos alegramos e rendemos graças ao Senhor por Sua bondade para conosco.
Julgo oportuno destacar que fiquei, realmente, emocionada e impressionada, já nestes primeiros contatos, com o comovente cuidado e o amor contagiante dessa tão querida igreja do Senhor Jesus que tão bem nos acolheu, e que tem marcado tanto as nossas vidas com seu belo e inspirador exemplo e fiel modelo de autêntica comunidade cristã, a exemplo daquelas que deixamos em minha terra natal.
Ainda tenho e rego com carinho, todos as manhãs, as flores que deles ganhei naquele maravilhoso dia de primavera fora de época. Mas nem tudo são flores nas vidas dos filhos de Deus. À luz das palavras do Senhor Jesus em João 16:33, devemos estar preparados também para os espinhos que ferem a alma e o corpo ao longo de nossa caminhada terrena, como forasteiros que somos, em direção ao nosso verdadeiro País.
Os desafios continuaram… e o desejo de servir também!
Um desses lancinantes espinhos, no meu caso, foi a recente descoberta de que sou portadora de artrite reumatoide (AR), uma doença inflamatória, degenerativa e incapacitante, que muito maltrata e limita a pessoa que a tem, e cujo tratamento, não raro, é um tanto traumático, pois as crises de dores são muito frequentes.
O caminho até a remissão da doença, que é quando não há mais atividade da mesma no organismo, é longo. E foi exatamente com esse diagnóstico, quando atravessava a fase de maior fragilidade e dependência da minha vida, que Deus me presenteou com um marido maravilhoso, igualmente apaixonado pelo Reino, e nos enviou juntos ao campo missionário. A jornada não tem sido nada fácil, pois às vezes sou acometida de crises de dores tão intensas que tenho muita dificuldade de locomoção, mesmo dentro de casa. Mas, com a graça de Deus, a despeito desta realidade, temos conseguido vencer cada barreira, cada etapa, e trabalhar com gratidão e alegria em prol da expansão do Seu Reino!
Eu nunca questionei o Senhor sobre o porque desta doença justamente agora, ou reclamei com Ele por conta de qualquer uma de minhas muitas crises. Mas certa vez estava lendo um texto em que uma pergunta me saltou aos olhos: “Que resposta eu estou dando a Deus com a minha vida?” Uau! Como isso mexeu comigo! E eu perguntei a Deus: Por que o Senhor escolheu uma pessoa doente? A resposta que tive é que Ele não escolhe baseado nas aparências e padrões humanos. Não foi diferente com Davi, Isaías, Jeremias, Moisés e tantos outros – na verdade, até hoje é assim. E, então, eu rememorei todos os textos bíblicos supracitados que eu trazia gravado nas tábuas do meu coração, a saber, Isaías 40:31, Salmo 126:6 e 2 Coríntios 4:7.
Sempre tenho conversado com Deus, dizendo-Lhe que quero fazer muito pelo Seu Reino. Sempre que ando pelas ruas de Viçosa, meu coração fica tão apertado! Pois é possível ver a depravação espiritual, emocional e moral da maioria desses jovens que aqui estudam, vindos de várias partes do Brasil ou do exterior. Eles precisam ser amados, acolhidos e amparados sem julgamentos, com muito amor. Precisam de oração, de serem vistos como vidas preciosas em um campo missionário que está branco para a ceifa. Eles precisam conhecer o amor de Jesus e o perdão que o Pai oferece por Seu intermédio!
Quero fazer muito mais para Deus, pois não sei o tempo de vida que ainda me resta, e urge trabalhar enquanto é dia, quer entre flores, quer entre espinhos, porquanto a noite logo vem, quando já não poderemos mais trabalhar. (João 9:4)
Sei que Ele não nos trouxe em vão para Minas Gerais, e eu continuo dependente e confiante n’Ele, meu Amigo e Mestre, Rocha minha e Redentor meu, que é poderoso para fazer por nós e por meio de nós “tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou sonhamos , segundo o poder que em nós opera!”. (Efésios 3:20)
Por Cristo, por vidas, pelo Reino!
• Amanda Luiza Ferreira Duda Montes, Musicista, compositora, cantora, bacharel em Teologia com Concentração em Missiologia, tecnóloga em Análise e Desenvolvimento de Sistemas, pós-graduanda – MBA em Gestão de Projetos.
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Cleonilson
Historia e Testemunho que inspira. Louvado seja Deus.