capa_363_cruz_vazada_portalHá muitos anos, o “Mineiro com Cara de Matuto” encontrou uma cruz diferente de todas as cruzes que ele vira até então. Ela estava fincada no gramado da Universidade Gwynedd-Mercy, católica, nos arredores de Filadélfia, Estados Unidos. O Mineiro ficou apaixonado por essa cruz. Desde então, o Mineiro convidou entusiasticamente: “Coloque uma cruz vazada em sua cidade. Ela anuncia o mais puro evangelho: o sucesso da morte vicária de Jesus, o segundo advento de Jesus, a ressurreição dos mortos, os novos céus e a nova terra”.

Leia a seguir mais dessa história.

 

A cruz vazada

Elben M. Lenz César

Quando vim para Viçosa em 1960, fiquei chocado com a procissão do enterro realizada na sexta-feira da Semana Santa. Puseram Jesus num caixão de defunto, a banda de música tocava a marcha fúnebre e os fiéis caminhavam com um semblante sombrio.

Na Semana Santa do ano seguinte, um presbítero da Igreja Presbiteriana de Viçosa encontrou duas faixas na entrada da cidade de Ervália, aqui perto. Na primeira estava escrito: “Silêncio! Estamos de luto”; na segunda, a explicação: “Jesus morreu!”.

Depois, li o livro O Outro Cristo Espanhol, de John Mackay, e entendi melhor a questão. Tudo era influência do catolicismo ibérico, que enfatizava demasiada e lugubremente a morte de Jesus na cruz, sem contrabalançá-la com o túmulo vazio. Essa maneira sombria de encarar a crucificação de Jesus mais faz parecer que Jesus é um pobre coitado, um mártir, uma vítima da maldade, primeiro de Judas, depois e Caifás e de Pilatos e, por último, da multidão que gritava freneticamente: “Crucifica-o” (Mt 26.23). Mas isso não é verdade, pois os evangelhos mostram que Jesus é imatável. Ele mesmo deixa isso bem claro: “Eu sou o bom pastor e o bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (Jo 10.11). Jesus é mais enfático ainda quando nesse mesmo discurso afirma peremptoriamente: “Ninguém tira a minha vida de mim, mas eu a dou por minha própria vontade, [pois] tenho o direito de dá-la e tornar a recebê-la” (Jo 10.17).

À vista dessa forte imagem de um Jesus mártir, fizemos vários movimentos em favor da ênfase tanto na morte vicária como na ressurreição de Jesus. Primeiro colocamos no domingo de ramos em centenas de postes a mensagem Ele vive!, sem nenhuma outra explicação, despertando a curiosidade do povo. Uma semana depois, no domingo da ressurreição, espalhamos de casa em casa o folheto Ele vive, com pequenas frases sobre a ressurreição de Jesus, cada uma escrita por algum membro da igreja. Em outra semana santa, fincamos três cruzes enormes em alguns pontos estratégicos da cidade. No alto da cruz do meio havia uma tabuleta com a inscrição: “Ele Vive!”.

O último esforço talvez tenha sido o mais incisivo. Num gramado na entrada da Universidade Federal de Viçosa, construímos um pequeno cemitério fictício. Fincamos ali 40 cruzes de madeira. Em cada uma, colocamos o nome do “morto” e a data de seu nascimento e morte, como se faz. Por ser uma cidade universitária, os “mortos” eram pessoas como Galileu, Newton, Copérnico, Simpson etc. Por cima dessas “sepulturas” estendemos uma faixa enorme com os dizeres: “Por que vocês estão procurando aqui aquele que está vivo?” (Lc 24.5).

Hoje, percebo que deveríamos ter incluído o resto da mensagem do anjo às mulheres da Galileia: “Ele não está aqui, mas ressuscitou!”.

Em maio de 1994, numa viagem de volta ao Brasil, passei pelos Estados Unidos e fiz questão de percorrer os lugares históricos ligados Ashbel G. Simonton, pioneiro do presbiterianismo brasileiro, no estado da Pensilvânia. Quem me levou a esses sítios, foi Cristina DeMoss, filha de Francisco Leonardo Schalkwijk, que estudou em Viçosa por algum tempo e conhecia essa ênfase demasiada e sentimental na morte de Jesus. Por essa razão ela fez questão de me levar à Universidade Gwynedd-Mercy, uma escola católica, nos arredores de Filadélfia. No gramado da Universidade havia uma cruz enorme, diferente de todas as outras. Diferente porque estava vazado o lugar onde deveria estar o corpo de Jesus.

Jay J. Dugan, o artista que desenhou essa cruz, sem dúvida é um cristão muito piedoso. Para ele, nesses dois mil anos de cristianismo, a cruz tem revelado só o sofrimento e a morte de Jesus. Ela não tem simbolizado também a sua ressurreição, o que é uma lástima. Com essa preocupação, Jay J. Dugan projetou a cruz vazada: “Eu removi todo vestígio de seu sangue e agonia ao remover o seu débil corpo. A cruz é literal o suficiente para retratar a crucificação. No lugar do seu corpo, apliquei uma silhueta abstrata, uma declaração de que ele deixou a cruz e este mundo para preparar e aguardar o nosso reencontro com ele”.

Pouco depois, conseguimos com a direção da universidade católica uma cópia do desenho da cruz vazada (não sei se é o nome que os americanos dão a ela) e autorização para construir uma cruz igual a essa no gramado do Centro Evangélico de Missões (CEM), em Viçosa, inaugurada em agosto de 1966. Quando publiquei o livro Não Perca Jesus de Vista (1995), solicitei ao pessoal da Editora Ultimato que colocasse o retrato da cruz vazada na capa.

Desde então, através da revista Ultimato, temos enviado graciosamente o projeto para muitas igrejas protestantes e católicas que o solicitam. Ela está em templos, cemitérios, escolas e lugares públicos. Essa cruz tem o grande valor de anunciar o sucesso da morte vicária de Jesus, a ressurreição de Jesus, o sacrifício de Jesus, o sacerdócio de Jesus e o segundo advento de Jesus em poder e muita glória, a ressurreição dos mortos, os novos céus e nova terra, a plenitude de todas as plenitudes e o início da eternidade. É por esta razão que gosto muito dela.

Por coincidência, não achei no Diálogo da Fé (o primeiro catecismo a ser usado no Brasil) nenhuma referência à ressurreição de Jesus. As perguntas e respostas preparadas por José de Anchieta terminam lamentavelmente com a morte e sepultamento de Jesus.

 

“Ele vive”: a mensagem e o meio

Jay J. Dugan*

Há duas mensagens essenciais inerentes à Cruz de Cristo. Mas uma é tão gráfica, tão poderosa , que passou a obscurecer a outra por mais de 2.000 anos.

A primeira, o sofrimento e morte comoventes de Cristo, têm sido retratadas milhões de vezes nas igrejas e lares pelo mundo todo. Neste contexto, a sua Cruz está indelevelmente fixada nas mentes de toda a humanidade como o símbolo eterno de sacrifício e dor.

Mas a segunda imagem é igualmente vital a todos os cristãos: sua ressurreição miraculosa quase que diretamente da cruz e a promessa gloriosa que ela traz a todos nós. Este acontecimento supremo raramente é retratado.

Uma razão para tal acredito é que o acontecimento desrespeita as leis de representação gráfica. A pedra rolada para o lado da tumba não faz jus ao acontecimento. O mesmo acontece com a sua Ascensão radiante numa nuvem lúcida. Mas será que não poderíamos ser capazes de ver a cruz como o símbolo maior do cumprimento de sua promessa de vencer a morte, e sua garantia de uma vida eterna para nós?

E não foi ela o propósito e a consequência, assim como a expiação dos nossos pecados, como o qual Cristo entregou sua vida por nós?

Como escultor, este tema já vem desafiando o meu pensamento e a minha imaginação há muito tempo. Eu a vejo como uma mensagem magnífica de consolo para as nossas vidas conturbadas, uma mensagem que dá o único sentido verdadeiro e aceitável para a nossa existência.

Mas ainda não acredito que séculos de criatividade nas artes sacras tenham conseguido capturar esta progressão da morte e ressurreição de Jesus Cristo. Esta cruz é a minha modesta contribuição com vistas a uma solução. Eu removi qualquer vestígio de seu sangue e agonia ao remover o seu corpo débil. A cruz é literal o suficiente para retratar a Sua crucificação. No lugar deste eu apliquei uma silhueta abstrata de Seu corpo, uma declaração poderosa de que Ele deixou a cruz e este mundo para preparar e aguardar o nosso reencontro consigo no céu.

E, ao invés do escárnio vergonhoso contidos na mensagem INRI na Cruz original (Jesus de Nazaré, o rei dos Judeus), entalhei um reconhecimento simples de um acontecimento estremecedor: “Ele vive”.

*Escultor do projeto original da cruz vazada fincada no gramado da Universidade Gwynedd-Mercy, nos arredores de Filadélfia, EUA.

 

Os que anunciam a mensagem da cruz vazada

Jesus Cristo: Sou aquele que vive. Estive morto, mas agora estou vivo para todo o sempre! (Ap 1.18, NVI)

Os dois anjos de Deus: Por que vocês estão procurando no túmulo alguém que está vivo? Jesus não está aqui! Ressuscitou! (Lc 24.5, NBV)

Pedro: Deus livrou seu Filho dos horrores da morte e o trouxe de volta à vida, pois a morte não podia segurar aquele Homem nas suas garras (At 1.24, NBV)

Paulo: [Davi] morreu, foi sepultado ao lado dos seus antepassados e apodreceu na sepultura. Mas isso não aconteceu [com Jesus,] com Aquele que Deus ressuscitou (At 13.36-37, NTLH). O fato é que Cristo realmente ressuscitou dentre os mortos, e tornou-se o primeiro entre milhões que algum dia voltarão novamente à vida (1 Co 15.20, NBV)

James Dunn (professor emérito da Universidade de Durham, na Inglaterra): [Na teologia de Paulo] sem a ressurreição, a cruz seria um motivo de desespero. Sem a cruz, a ressurreição seria uma fuga da realidade (A teologia do apóstolo Paulo, p. 281)

Michael Green (pregador inglês): A ressurreição [de Jesus] foi a fé que transformou o coração partido dos seguidores de um rabino crucificado em corajosas testemunhas e mártires da primeira igreja… Eles podiam ser presos e açoitados, mas ninguém conseguiu fazê-los mudar a convicção de que “no terceiro dia, ele ressuscitou” (Cristianismo, fraude ou fato histórico, p. 26)

Aleksandr Mien (sacerdote ortodoxo russo): Desde a manhã da ressurreição [de Jesus], os séculos passaram num relâmpago. Impérios surgiram e se foram, civilizações inteiras desapareceram, revoluções militares, convulsões nacionais e políticas mudaram a própria ordem do nosso mundo. Mas aquela pequena comunidade de pescadores fundada pelo judeu Jesus, da aldeia de Nazaré, a sua igreja, permanece de pé até hoje, como um rochedo firme no meio de um mar em contínuo movimento (Jesus, Mestre de Nazaré, p. 307)

Vladimir Solovev (teólogo e filósofo ortodoxo russo): A verdade da ressurreição de Cristo é uma verdade íntegra, plena, não só verdade da fé, mas também verdade de intelecto. Se Cristo não tivesse ressuscitado … o mundo seria um absurdo, seria o reino do mal, do engano e da morte (Jesus, Mestre de Nazaré, p. 293)

Jürgen Moltmann (teólogo protestante alemão): A ressurreição de Jesus caracteriza o crucificado como Cristo e o seu padecimento e morte como evento de salvação para nós e para muitos. A ressurreição não esvazia a cruz, mas a preenche de escatologia e significado (Os grandes teólogos do século vinte, p. 288)

Urs von Balthasar (teólogo católico suíço): A ressurreição de Cristo é o acontecimento mais decisivo e significativo da história (Os grandes teólogos do século vinte, p. 689)

Lucien Cerfaux (teólogo católico francês): Cristo é chefe de fila na ressurreição dos mortos (Cristo na teologia de Paulo, p. 334)

Reinhold Niebuhr (teólogo luterano americano): A vida, a morte e a ressurreição de Cristo representam na história um evento através do qual se abre um espiral sobre o significado total da história e no qual todas perguntas encontram uma resposta (Os grandes teólogos do século vinte, p. 165)

John Stott (escritor episcopal inglês): Não devemos considerar a cruz como derrota e a ressurreição como vitória. A cruz foi a vitória conquistada e a ressurreição foi a vitória endossada, proclamada e demonstrada. (Porque sou cristão, p. 67)

 

Instruções sobre a construção da cruz vazada

Daison Olzany Silva*

As medidas do projeto em anexo são para uma altura total de 4,6 metros, que corresponde exatamente à cruz que está no jardim de entrada do Centro Evangélico de Missões (Viçosa, MG). Basta então multiplicar a altura desejada pelas medidas dos detalhes e dividir por 4,6 metros.

A parte crítica do projeto está na fragilidade das peças que correspondem aos braços da cruz. Para uma cruz de 4,6 metros de altura, sugere-se que se construa em volta outra cruz de metalon em calha do tipo “u”. Aliás, a cruz de metalon deve ser feita antes da cruz de madeira. Mesmo utilizando-se a calha de metalon, para esta altura, é necessário colocar quatro semi-círculos de barras de ferro no centro da cruz para dar estabilidade. Pode-se também colocar uma barra de ferro no topo de cada braço da cruz. Sugere-se que tanto o metalon como as barras de ferro sejam revestidas de madeira.

Finalmente, caso a abertura na altura do ombro esteja se fechando, pode-se colocar um tarugo de aço bem fino (3/16 polegadas ou mais fino), com as bases projetadas para não penetrar na madeira, com o passar do tempo. (Esta última sugestão deve ser evitada na medida do possível para não comprometer da idéia do vazio.)

* Professor aposentado da Universidade Federal de Viçosa

 

Baixe aqui os moldes da cruz vazada.

 

Foto: Rosana Otto

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