Imagem ilustrativa (CCO/Pixabay.com)

Eu sempre quis viver aqui perto do interior, porque eu queria viver com meu pai. Durante a minha infância, ficar longe dele muito pesado pra mim. Eu tive uma consciência muito triste, angustiado… Perdi boa parte da minha vida, vivendo quase quinze anos longe. Eu sempre tive esse peso dentro de mim. Eu pensava que quando eu casasse, se eu fosse viver na cidade, eu nunca ia ter essa convivência com meu pai, porque eu sei que ele não gosta de viver na cidade. Eu só poderia ver ele algumas vezes… Aí, como eu decidi viver como um índio, mesmo. Viver como um índio, com a minha cultura, e dessa maneira poder ajudar meu pai, isso me fez escolher a pessoa com quem me casei. A minha esposa, eu escolhi ela porque… Eu não sei bem o porquê. Eu escolhi por causa de um sentimento. A gente acabou se gostando e foi levando a coisa mais a frente e assumiu um compromisso. Escolhi ela para ser minha esposa porque ela é a única pessoa que eu procurava. Eu procurava uma indígena, que estudasse. Não como outras. A gente se conheceu em um curso e se encontrava escondido. Namoramos uns três anos e decidimos não contar para ninguém. Não contamos nem para os meus pais. A minha mãe queria que eu casasse com uma mulher da cidade. Mas eu quis viver dessa maneira. Agora ela entende o porquê. Eu morei com minha irmã na cidade e sei como é viver lá. É pesado. Não tem tempo para nada. Minha irmã quer viver como branca. Ela tem direitos e muitas políticas educacionais a favor dela, mas faz faculdade como se fosse uma branca. Eu acho errado. Se tenho direitos, para que jogar fora? Eu morei em várias casas, com várias pessoas. Por isso, quando eu voltei pra minha família, não quis mais ficar longe deles. Meu objetivo é ter um terreno lá no interior e construir uma casa. Depois, conseguir uma casa na cidade também. Não quero ter um rótulo de um índio que se urbanizou. Não quero ser um índio que deixou tudo lá… Tem muita gente fazendo isso. Eu quero viver as duas coisas, misturando, mas sem deixar de ser índio. 

Nota: Relato de um jovem indígena Sateré Mawé, escrito e adaptado por Phelipe Reis.

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