Experiências de jardim
Por Laís da Silva e Ariane Gomes

Tiê-Sangue

O período de inverno tem sido de grande expectativa para mim. Desde que aprendi que nesta época o tiê-sangue visita a região em que trabalho, ao aproximar-se o finalzinho de maio minha atenção logo se volta para as árvores e pequenos arbustos do quintal à espera de sua visita. Devo confessar que a avezinha é difícil: demora a vir e quando vem, vem depressa, discreta, sem polvorosa.

O tiê-sangue é uma ave sul-americana da família Thraupidae, reconhecida pela beleza de sua plumagem vermelha. Desta família são as saíras, saís, tiês, sanhaçus e outros e, entre os tiês, há o tiê-galo, o tiê-bicudo, o tietinga, o tiê-caburé, o tiê-preto, o tiê-preto-e-branco e o tiê de topete. É tiê pra não acabar mais.

Além de ser reconhecido pela beleza da plumagem vermelha, o tiê-sangue coleciona outro laurel: é a ave símbolo da Mata Atlântica.

Mas, antes de saber essas coisas da avezinha que me faz esperar, apenas fiquei deslumbrada com sua beleza e raridade desde a primeira vez que a vi. As penas vermelhas são de um vermelho sem igual, quase fluorescente, e, de fato, só em junho e julho consigo vê-la por aqui. Se vejo vejo. Se não vejo só daqui a um ano outra chance, quem sabe.

Neste ano, no início de julho, depois de já ter visto o tiê-sangue duas vezes no quintal – na primeira vez, bem escondido em uma mexeriqueira e, na segunda, vasculhando migalhas de pão em uma área bastante aberta – ao passear entre os papiros e uma área de várzea pantanosa em busca de mais uma chance de contemplação, deparei-me com tantas outras aves que me coloquei a perguntar se enquanto esperava o tiê estava perdendo qualquer outra visita, outra beleza, outro vislumbre. Como quem não sabe responder se “sim” ou se“não”, parei quieta para ver quem estava por ali. Eram cambacicas, bem-te-vis, lavadeiras-mascaradas, pardais, sabiás, canários, tiês-pretos, sanhaços, maritacas e saracuras. Quantas aves, quantos cantos e movimentos – umas bem à vontade, outras, ariscas, rápidas em fugir da presença estranha em seu lugar.

Mesmo não abandonando o motivo inicial do passeio guardei tempo para observar a passarada desejando que dali em diante os olhos ficassem sempre dispostos para outros encontros.

Passear sem pressa entre o encontro e a surpresa torna a espera mais leve. Admirar a alvura da viuvinha-mascarada e das garças, o amarelo da cambacica e o colorido tão inusitado das saracuras enquanto aguarda o vermelho do tiê enche o coração de alegria. Dar mais espaço ao inesperado abre as portas da afeição para muitos outros e dissipa o medo de que o esperado não venha hoje, seja adiado, chegue de outra forma.

• Laís e Ariane são colaboradoras na Editora Ultimato. Laís fez os desenhos e Ariane escreveu o texto.

Leia mais: 
» “Olhai as aves do céu!”

  1. Antonia Leonora van der Meer

    Lindo relato que mostra como somos privilegiados com tamanha variedade de aves em nossa região, Que possamos ser mais atentos e louvar ao Criador por essa beleza.

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *


The reCAPTCHA verification period has expired. Please reload the page.