Chris Wright. Foto: Lissânder Dias

Chris Wright. Foto: Lissânder Dias

O teólogo irlandês Christopher Wright é considerado por muitos como o “sucessor” de John Stott. De fato, ele foi seu “braço direito” e atualmente é quem lidera a “Langham Partnership”, organização fundada por Stott. Chris, como é conhecido, esteve no Brasil em outubro e foi o preletor principal do 7º Congresso Brasileiro de Missões, em Águas de Lindoia (SP). Ele aproveitou para lançar o livro “A Missão de Deus: desvendando a grande narrativa da Bíblia” (Edições Vida Nova). Wright também é autor de O Deus Que Eu Não Entendo (Editora Ultimato) e Povo, Terra e Deus (ABU Editora), entre outros.

O estudioso, que é um dos responsáveis pelo mais recente documento do Movimento Lausanne (O Compromisso da Cidade do Cabo) caminhada bem tanto na Teologia quanto na Missiologia. Leia a seguir a entrevista que fizemos, por e-mail, com ele.

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Ultimatoonline – Como você gostaria de ser apresentado aos cristãos brasileiros?

Chris Wright – Simplesmente como companheiro e irmão na fé. Antes da Segunda Guerra Mundial, meus pais foram missionários no Brasil por vinte anos na região amazônica. Por isso, ouço falar do Brasil há muitos anos. Eu coleciono selos e tenho alguns selos maravilhosos do Brasil!

 

Você foi um dos líderes da redação de “O Compromisso da Cidade do Cabo” (CCC) em Lausanne 3 (2010). O documento é mais completo que o Pacto de Lausanne? O CCC teve o impacto que se esperava?

Chris Wright – O Compromisso da Cidade do Cabo é bem mais extenso do que o Pacto de Lausanne, porém mantém o mesmo objetivo: articular as convicções bíblicas e cristãs fundamentais que sustentam nossa missão cristã no mundo. A Parte 1 une mentes (“o que cremos”), corações (“nossos compromissos”) e mãos (“nossa resposta prática”), na linguagem de um compromisso de amor. A Parte 2 surgiu durante o próprio Congresso e relaciona trinta questões sob um vigoroso “Chamado à Ação”. O CCC oferece um “roteiro” para o Movimento Lausanne para as próximas décadas. Ele foi traduzido para mais de 25 idiomas. Além disso, há redes temáticas que estão se engajando efetivamente em discussões sobre a maioria das questões relacionadas na Parte 2.

 

O Primeiro Congresso de Lausanne ficou marcado como um espaço magnífico para a compreensão mais integral da missão da Igreja. No entanto, 40 anos se passaram e ainda hoje se discute em vários ramos da igreja a natureza da missão. Como você definiria a missão da Igreja?

Chris Wright – A igreja é chamada por Deus para participar no que Deus está fazendo no mundo em cumprimento da redenção realizada por Cristo na cruz e ressurreição – em favor dos indivíduos, da sociedade e da criação. Somos enviados ao mundo para tornar Cristo conhecido e amar e servir no nome de Cristo. Procurei expor isso mais detalhadamente nos meus livros “A Missão de Deus” e “A Missão do Povo de Deus”.

 

Muito se fala sobre a “igreja perseguida”. Em Lausanne 3, esta questão também ficou bem evidente, principalmente, nos testemunhos. Recentemente, surgiu o chamado Estado Islâmico atacando minorias religiosas no Oriente Médio. O mundo está mais intolerante contra as religiões e, particularmente, contra o Cristianismo?

Chris Wright – Sim. Isso é hoje reconhecido por comentaristas seculares, não somente cristãos.

 

Como você está envolvido com o Movimento Lausanne, deve experimentar então a necessidade de dialogar com diversas denominações cristãs, e talvez com não-cristãs. Há um caminho sábio para desenvolver este diálogo, sem perder a identidade cristã?

Chris Wright – John Stott acreditava na importância do diálogo. É possível conversar com qualquer pessoa, com respeito, mas ao mesmo tempo manter suas convicções.

 

Se fosse possível fazer um retrato da igreja cristã global hoje, seria uma fotografia bonita?

Chris Wright – Depende de onde você olha e quem está olhando. Há muitos cristãos maravilhosos na igreja de Deus – muitos dos quais são completamente desconhecidos da igreja como um todo, mas são conhecidos de Deus. Também há diversas igrejas, líderes etc, muito impressionantes e famosos, os quais se comportam de maneira não tão atraente. Em última instância, é Deus quem decide o que é belo aos seus olhos, e assim também farão os que se parecem mais com Cristo. Jesus mesmo disse que, infelizmente, muitos fariam todo tipo de coisas espetaculares em seu nome, porém, no último dia, não pertenceriam a ele. Nós olhamos o exterior, mas Deus olha o coração.

 

O Brasil é um país muito grande e com uma igreja evangélica em crescimento numérico, mas multifacetada. Em sua opinião, que desafios globais a igreja brasileira ainda não enfrenta?

Chris Wright – Penso que é difícil, vindo de fora, eu responder isso. Eu ouço que a igreja evangélica brasileira envia muitos missionários para outras partes do mundo, mas, lamentavelmente, muitos não são devidamente mantidos ou preparados; por isso voltam desiludidos. Se este é o caso, é lamentável. Toda missão transcultural requer muito mais do que mero entusiasmo. As pessoas precisam ser muito bem ensinadas, preparadas, e precisam saber como entender outras culturas com humildade e autocrítica.

 

Você está envolvido diretamente com Teologia e Missiologia. Há grandes tensões entre teólogos e missiólogos? Se sim, quais?

Chris Wright – Não vejo que há sérias “tensões”, mas falta profunda integração e interação. Muita teologia é feita de modo puramente acadêmico, de acordo com as categorias clássicas que surgiram na Europa medieval; desse modo, a “missão” é acrescentada como aspecto adicional – quando o é de fato. Precisamos reconhecer que a teologia, e a educação teológica, são intrinsecamente missionais uma vez que servem à igreja, e a igreja existe no mundo em função da missão de Deus. Mas, de igual forma, aqueles que se envolvem na missão não devem desprezar a teologia. Há muito “zelo missionário sem conhecimento” – ação sem reflexão. Precisamos de uma teologia missional e uma missão orientada teologicamente.

 

Como você avalia o papel dos jovens no movimento missionário global?

Chris Wright – Eles são tão importantes na missão quanto na igreja como um todo.

 

Sem rogar papel de profetismo, mas considerando a realidade atual dos cristãos e do mundo, como você acha que a igreja de Cristo caminhará nos próximos 10 anos?

Chris Wright – Certamente a perseguição aumentará. A influência da igreja ocidental diminuirá. Cristãos evangélicos precisarão se tornar mais plenamente bíblicos. A China e a Índia serão países com enorme população cristã, competindo com a África e a América Latina.

 

Você foi um amigo próximo de John Stott e ainda hoje lidera alguns dos ministérios iniciados por ele. Você poderia descrever um pouco o seu amigo Stott? Em que aspectos você sente falta dele?

Chris Wright – Ele foi como Moisés – um dos grandes líderes do povo de Deus, contudo uma das pessoas mais humildes da Terra. Sua humildade era genuína. Ele foi a pessoa mais semelhante a Cristo que já conheci. Ele também tinha um fascinante senso de humor. Ele vivia de modo muito simples e rejeitava toda tentação de riqueza e “glamour”. Eu sinto falta de sua calma sabedoria e capacidade de tornar todas as coisas muito claras e simples. Ele era generoso e tinha incrível capacidade de fazer amigos. Como Jesus, ele amava crianças e se lembrava de seus nomes.

 

Você é “apresentado” como sucessor de John Stott. Você concorda com este título?

Chris Wright – Não exatamente. Eu assumi a liderança da “Langham Partnership”, fundada por ele. Por isso, sou o sucessor dele neste ministério. Mas, em muitos sentidos, ele não precisava de um único sucessor. Ele tem milhares de sucessores em todo o mundo – pessoas a quem ajudou, aconselhou, guiou e inspirou.

 

Quais os planos do ministério Langham para manter vivo o legado de John Stott no mundo?

Chris Wright – Langham Partnership tem o objetivo de ajudar igrejas de países em desenvolvimento a crescer em profundidade – não só em números – por meio do ministério de pastores e líderes que creem, ensinam e praticam a Palavra de Deus. Queremos fortalecer o ministério da Palavra de Deus, estabelecendo movimentos para treinamento bíblico de pregadores e professores (atualmente está presente em sessenta países), oferecendo e ajudando desenvolver literatura evangélica para pastores, estudantes de teologia e bibliotecas, e patrocinando aqueles que desejam fazer doutorado em teologia para depois lecionar em seminários, nutrindo assim a próxima geração de pastores.

 

Tradução: Billy Lane.

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