Já dizia Marc Bloch: “O cristianismo é uma religião de historiadores”. Não sei ao certo o que ele quis dizer com isso dentro de seu contexto (um campo de concentração), mas passei a entender isso graças ao meu estágio na Ultimato. Participo do projeto “Xô traças!”, iniciativa em favor da limpeza e da conservação de bíblias e livros antigos que pertencem ao acervo da editora.

Tem sido uma experiência formidável passar oito horas semanais trabalhando em uma sala do Centro Evangélico de Missões (CEM) na companhia de Deus, dos livros e do meu MP4 (de vez em quando). Nunca me senti tão historiador nesse meu “longo” primeiro ano de graduação. E eu falo sério!

Desde quando a Klênia Fassoni, diretora de Ultimato, me falou dessa possibilidade, fiquei super empolgado (seria o “espírito de historiador”?) e, ao mesmo tempo, assustado com a responsabilidade de “ressuscitar” 177 documentos – entre eles bíblias de variados idiomas, de diversos países, de incontáveis línguas. Mas não iria desistir.

Como Deus sempre está dois passos (dessa vez, três) à minha frente, ele já tinha preparado um “medicamento” forte para elevar meu ânimo e me dar coragem. No momento em que a Lênia, filha do Rev. Elben César e idealizadora do projeto, contou a saga desse acervo de um jeito pessoal e intenso, venci o medo e a preocupação e busquei contribuir, ainda que em limitada porção, com essa história.

Para isso, recebi orientações do Mateus, historiador formado pela Universidade Federal de Viçosa, e da Ariane, secretária do Elben, que me socorria na falta de algum material. Foi mais que uma “mão” de ajuda, foram os dois braços!

Não há sensação mais gostosa do que saber que, a cada página sendo pincelada, o trato e o cuidado que os verdadeiros fundadores desse projeto tiveram e tem estão sendo honrados por um aluno de História. E, ao final de todo o processo de limpeza, morte das traças (sacrifícios precisam ser feitos), passagem pelo congelador e saída, vem a sensação de que fiz algo de bom não apenas pra mim, mas para todos que pensaram nesse projeto.

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Tiago Tardin é estagiário da Redação na Ultimato

  1. Marc Léopold Benjamim Bloch foi um Judeu que introduziu uma nova maneira de pensar e fazer história: não mais história como sequencia de fatos, nomes, datas, mas história pela via da construção de análises destes itens aí acima somados à uma complexa relação homem + sociedade + tempo. Pois bem, os Nazistas depois de o torturar, fuzilaram-no em 1944.

    Se vc perguntasse a ele o que é história, ele responderia algo assim: história é a ciência dos homens através do tempo.

    Exemplo.

    Jesus não deixou um único documento escrito seu, além de poucos vestígios de sua passagem pelo mundo. Todavia, sua vida e história é uma das mais conhecidas no mundo.

    Incrível, porém, é que não existem fontes documentais oficiais, a respeito de sua vida. Nada. Ele mesmo não deixou escrito algum.

    Alguns historiadores com isso afirmavam que Jesus Cristo não é, portanto, um personagem histórico. Para a história, nunca teria existido, porque o raciocínio é de que não havia fontes históricas.

    Entra Bloch aqui. Ele propôs que deveriam ser considerada outras fontes de estudo: fontes históricas que incluíssem agora não apenas documentos, mas depoimentos (está vendo os Evangelhos e Atos entrando aqui, Tiago?) fossem esses orais, escritos, vestígios arqueológicos, etc.

    Daí para a ‘interdisciplinaridade’ é um pulo, como geografia, arqueologia, antropologia, sociologia, economia, etc., e o seu trabalho aí.

    Acho que é por aí o sentido que ele dava à expressão pela qual vc citou acima.

  2. Parabéns, Tiago. Seu trabalho vai alcançar muita gente. Aliás, já alcançou. A mim.
    E, diga-se de passagem, você está fazendo história. Quem sabe, outro estagiário, em 2068, vai contá-la em uma das plenárias do nosso Encontro de 100 anos da Ultimato.

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