Sobre o Tempo, Crombie

Quase tudo é temporal
Temporal porque está sujeito
Ao sujeito chamado Tempo
Que é mais que momento

Que não se confessa
Pois não sente culpa de nada
Não vê minha pressa
Em displicente caminhada

Segue a pé passeando
Deve ser por isso que demora
Parece que tá brincando
Pensando que não tem hora

O tempo que vivo aqui
O tempo de agora
O tempo que está por vir
Que venha sem demora

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A música Sobre o Tempo, do grupo Crombie, é uma delícia de ser escutada. Além da melodia que nos embala, as ambiguidades e personificações presentes na letra da canção tratam de forma leve de um assunto que geralmente nos é pesado.

Logo na primeira frase há um jogo de sentido com a palavra “temporal”. Quase tudo pode ser tempestade, duro de se viver. Porém, ainda que difícil, “temporal” é também passageiro. A efemeridade da vida é resultado da ação do tempo que, na canção e quiçá na vida, apresenta-se como sujeito e não predicado, senhor e não servo. Na ilusão de que o temos, como muitas vezes dizemos, “estou com pouco tempo”, somos, na verdade, submetidos a ele.

Ao seguirmos cantarolando, entretanto, percebemos que o Tempo não é um inimigo. É certo que anda em sentido contrário àqueles que se preocupam tanto com ele, “segue à pé passeando” enquanto vê os pobres humanos em ritmo apressado. Contudo, ele está mais para amigo gozador que para tirano. Quem sabe, ri da loucura humana, desconhecedor que é dos ponteiros do relógio que os rege, como dele se diz: “parece que tá brincando”. Ou, talvez, sejam os próprios humanos que veem ironia naquele que, diferentemente deles, não pode sentir culpa por nada, pois simplesmente passa, sem muito sofrer.

Tempo e ser humano andam em caminhos opostos na canção, estão dissociados um do outro. Enquanto aquele vive plenamente, “pensando que não tem hora”, este segue “em displicente caminhada”, sem prestar atenção à vida que deveria ser vivida.

Na última estrofe, todavia, o homem assume seu papel de sujeito da história. Ele vive o tempo do aqui e do agora. Mais do que isso, faz as pazes com o seu “rival”, e diz a ele que “venha sem demora”. Seu “sem demora” talvez seja mais um desejo de que ele aconteça de modo pleno do que um simples não tardar da sua chegada.A letra faz-nos refletir sobre o atropelo das atividades cotidianas que muitas vezes podem sufocar o verdadeiro sentido de se viver. Para Paulo, esse sentido é bem claro: “Para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro (Fp 1.21)”. Precisamos viver o tempo do aqui e do agora voltados para Cristo. Não apenas na expectativa da sua volta, mas de modo que nossas ações sejam cristocêntricas. Ainda que não nos tornemos missionários como o apóstolo de Tarso ou que nossas tarefas cotidianas não estejam diretamente relacionadas com a propagação do reino, carregar o título de cristão é viver diariamente como um “pequeno Cristo”. Jesus soube aproveitar as oportunidades. Nas conversas que travava, nas festas e nos jantares em que participou ele manifestou a glória de Deus. Sabia que chegaria a sua hora. Entretanto, não viveu na angústia da cruz, sofrendo por antecipação. Que inspirados nele vivamos para servir a nossa geração, independente do que nos espera, e confiantes que este é o tempo que Deus nos deu.
 
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Mariana Furst tem 29 anos, é mestre em Teoria Literária pela UFMG, assistente editorial de Ultimato e estuda no Centro Evangélico de Missões.

  1. Muito bom o texto, nos demonstra o verdadeiro sentido do tempo, que por fim nos levara aonde devemos chegar… A presença de Deus!
    E se ele as vezes demora a passar é para termos “tempo” de nos preparar…

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