Queda? O que é isso?

Queda? O que é isso?

Texto básico: Gênesis 3.6

Leitura diária

D Gn 1.26-31 Imagem e semelhança
S Gn 5.1-5 Gerado à semelhança de Adão
T Gn 9.1-7 Segundo a imagem de Deus
Q Gn 3.1-24 A Queda
Q Cl 1.13-23 A imagem do Deus invisível
S Tg 3.1-12 Feitos à semelhança de Deus
S Sl 17.1-15 Satisfação com a semelhança

Introdução

Neste trimestre, trataremos do tema “Os seres humanos e a Queda”. Em nossos estudos, concentraremos nossa atenção no capítulo 3 do livro de Gênesis, explorando detalhada­mente seu ensino sobre o primeiro pecado humano e suas graves consequências na vida de todas as pessoas em todas as épocas. O grande foco deste estudo é percebermos a gravidade do pecado e as consequências trágicas que ele traz para a vida humana. Somente quando tivermos uma boa noção deste assunto é que poderemos contemplar com sabedoria e profunda gratidão a obra graciosa de Jesus Cristo em nossa favor para nos dar o perdão de pecados e a salvação eterna. Mas não é só isso. Somente quando compreendermos as consequências do pecado em nossa vida diária compreenderemos a importância de sermos restaurados à imagem de Cristo e poderemos influenciar nossa igreja e nossa sociedade segundo o propósito de Deus.

I. Criados à imagem de Deus

Gênesis 1.26 relata a deliberação de Deus para criar o ser humano à sua imagem e semelhança. Embora dois termos sejam usados (“imagem” e “semelhança”), não há diferença de significado entre eles, de modo que “à nossa imagem” é uma expressão equivalente a “conforme a nossa semelhança”. Isso é percebido quando observamos o modo como estas expressões são usadas no livro de Gênesis. Em 1.26, encontramos as duas palavras, “imagem” e “semelhança”; em 1.27, encontramos apenas a palavra “imagem”; em 5.1, somente a palavra “semelhança’ é usada; em 5.3, as duas palavras são usadas novamente, mas, desta vez, na ordem invertida, isto é, “semelhança” e “imagem”; em 9.6, temos somente a palavra “imagem”. Portanto, percebemos que estas palavras são usadas de modo intercambiável, isto é, uma é equivalente à outra e é possível usar uma pela outra. As duas palavras juntas apontam para o fato de que o ser humano é um representante de Deus e tem um vínculo especial com Deus.

Nenhum dos textos mencionados acima descreve detalhadamente como o ser humano é uma representação de Deus. No entanto, existem certos aspectos desta representação que estão implícitos no texto.

Com base em Gênesis 1.26, podemos inferir que o domínio sobre a criação é um dos aspectos da imagem de Deus. Ao exercer este domínio, o ser humano age como uma repre­sentação de Deus porque Deus tem domínio absoluto sobre tudo e todos. O ser humano, porém, tem um domínio limitado e derivado, isto é, só pode exercer seu domínio sobre o restante da criação na medida em que Deus assim permite.

Em Gênesis 1.27, podemos ver que a criação do ser humano como homem e mulher também é um aspecto da imagem de Deus. O homem encontra sua complementação na mulher e a mulher encontra sua complementação no homem. Assim, o ser humano é uma representação de Deus porque Deus não é um ser solitário, mas subsiste em três Pessoas divinas: o Pai, o Filho e o Espírito. A comunhão harmoniosa entre as Pessoas da Trindade pode ser vista, por exemplo, na deliberação para a criação do ser humano: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (v. 26).

Em Gênesis 1.28, vemos que Deus dá ao ser humano um mandato: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a”. Aqui também está implícito um dos aspectos da imagem de Deus no ser humano: o ser humano é responsável diante de Deus e deve sempre responder a ele como seu Criador e Soberano. Deus toma decisões e governa. O ser humano recebe o mandato de fazer a mesma coisa, mas, novamente, de um modo limitado e derivado, não de um modo absoluto e independente.

Outro aspecto da imagem de Deus implícito neste texto é o fato de Deus ordenar que o ser humano seja fecundo, se multiplique e encha a terra. Deus criou tudo a partir do nada e criou a vida. Em um gesto gracioso, ele concede ao ser humano a capacidade de fazer surgir a vida não a partir do nada, mas a partir da união entre homem e mulher. O fato de o ser humano ser capaz de gerar vida é um dos mais notáveis aspectos da imagem de Deus.

Outros aspectos da imagem de Deus no ser humano são nossas capacidades racionais e morais, que nos permitem compreender o mundo em que vivemos e discernir entre o certo e o errado. Um dos aspectos mais negligenciados da imagem de Deus é nossa sensibilidade ao belo, que reflete o prazer que Deus tem na obra de suas mãos, nos vales e nas montanhas, nas flores e nos animais, no azul do céu e na imensa profusão de cores espalhadas pelo mundo. Até mesmo nossa capacidade nos alegrarmos é um reflexo da capacidade divina de manifestar alegria (Sf 3.17).

Por fim, o verso 31 diz: “Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom”. Se tudo que Deus tinha feito era bom, podemos afirmar com toda certeza que o ser humano foi criado bom. Quando o ser humano foi criado, não havia nele nada de mal, nenhuma mancha, nem uma falha, por mínima que fosse. Não havia nenhum tipo de pecado nem de conta­minação ou impureza: ele era perfeitamente puro, santo e bom.

Depois que o primeiro pecado foi come­tido, a imagem de Deus no ser humano foi contaminada, manchada, distorcida. Observe o contraste existente entre Gênesis 5.1 e 5.3. No verso 1, o texto relata que Adão foi criado à imagem de Deus. Já no verso 3, somos informados de que Adão “gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem”. Isso aconteceu porque, com o pecado, o ser humano caiu (por isso chamamos o advento do primeiro pecado de “Queda”) de seu estado original de perfeição e santidade e se tornou impuro, imperfeito. Esta imperfeição atingiu a imagem de Deus. Embora a imagem de Deus não tenha sido perdida, ela foi contaminada. Repare que, em Gênesis 9.6, a razão pela qual o assassinato é um pecado tão grave é que “Deus fez o homem à sua imagem”. Um ensino semelhante é encontrado em Tiago 3.9, sobre o dever de refrear a língua: “Com ela, bendizemos ao Senhor e Pai; também, com ela, amaldiçoamos os homens, feitos à imagem e semelhança de Deus”. Nas duas passagens, o fato de o ser humano ter sido criado à imagem de Deus torna o pecado mais grave. Podemos concluir, portanto, que a Queda não destruiu a imagem de Deus nos ser humano, mas a contaminou e manchou. Podemos imaginar a imagem de Deus no ser humano depois da Queda como uma televisão fora de sintonia. Ainda podemos identificar a pessoa que aparece na imagem, mas não com nitidez.

O ser humano caído ainda é um portador da imagem de Deus, mas esta imagem está fora de foco, manchada e contaminada. Portanto, há um sentido em que ele ainda é um portador da imagem de Deus e um sentido em que esta imagem precisa ser restaurada. Esta restaura­ção é realizada por Cristo, que é “a imagem do Deus invisível” (Cl 1.15).

II. O conhecimento do bem e do mal

Embora tenha criado o ser humano perfeito à sua imagem e semelhança, foi decisão de Deus colocar a humanidade no caminho perigoso da liberdade, em vez de elevá-la, por um simples ato de poder, acima da possibilidade de pecado e morte. Como parte de sua relação com Deus, Adão recebeu um “mandamento probatório”, isto é, um mandamento que tinha o objetivo de provar sua fidelidade. O texto bíblico não nos permite pensar que houvesse algo de especial no fruto proibido (Gn 2.16-17) e não nos diz que fruto foi esse. Isso acontece porque o foco da narrativa não é o fruto em si, mas a prova que girava em torno dele.

Alguns cristãos imaginam que o relato bíblico que narra o cometimento do primeiro pecado, isto é, narra o momento da Queda, mostra o momento em que os seres humanos passaram por um despertamento, isto é, por ti­veram um aumento em sua vitalidade e em sua percepção do mundo. Segundo estes cristãos, esta seria a mensagem transmitida pela narra­tiva de que, logo depois que o primeiro pecado foi cometido, os olhos do primeiro casal se abriram (Gn 3.6-7) e, assim, eles se tornaram conscientes de sua sexualidade, despertaram para seu instinto sexual e experimentaram um grande progresso humano. Esses cris­tãos acreditam que Gênesis 3 se refere ao desenvolvimento da raça humana a partir de um estado animal para a autoconsciência e a razão e, por isso, interpretam a queda como o primeiro empreendimento perigoso da razão, a gênese da vida moral, a origem da cultura, o evento mais feliz da história da humanidade. De forma geral, este pensamento sem funda­mento bíblico considera o primeiro pecado como uma espécie de “Queda para cima”. É preciso lembrar que toda queda é sempre para baixo, isto é, o pecado nunca traz nada que seja realmente proveitoso e santo. O pecado nunca gera nada que seja bom e seu salário é a morte (Rm 6.23). Além do mais, se o ato de comer do fruto proibido realmente trouxesse progresso e vida, por que eles teriam sido proibidos por Deus de fazer isso?

Outro ponto que precisa ser levado em consideração é que o primeiro pecado nada tem a ver com o despertar da sexualidade. O primeiro casal já havia recebido de Deus a ordem para se multiplicar e encher a terra (Gn 1.28) e os dois deviam se tornar uma só carne (Gn 2.24). Aliás, o ser humano foi criado por Deus como homem e mulher, isto é, o sexo foi criado por Deus. Além disso, não há nada em todo o texto que diga ou pelo menos sugira que o contato sexual entre o primeiro casal fosse impuro ou errado.

Portanto, podemos afirmar que o objetivo da narrativa do primeiro pecado não é apontar para um desenvolvimento humano, mas mostrar onde foi que o ser humano caiu. Ele foi criado por Deus santo e perfeito. O primeiro pecado provocou a sua queda deste estado de santidade e perfeição.

Violando o mandamento de Deus e comen­do do fruto do conhecimento do bem e do mal, o ser humano se faria semelhante a Deus no sentido de julgar por si mesmo o que era bom e o que era mau. O grande pecado foi a tentativa humana de seguir sua vida sem ter que depender de Deus para saber o que é certo e o que é errado. A violação do mandamento probatório foi uma tentativa humana de se manter sobre seus próprios pés e seguir seu próprio caminho, independente de Deus.

Conclusão

O ser humano, criado à imagem de Deus, era perfeitamente bom, mas o pecado causou danos à imagem de Deus nele, manchando-a e contaminando-a. Esta contaminação da ima­gem de Deus é a herança terrível com a qual todos temos que lidar. A grande mensagem do evangelho é que “assim como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cristo” (1Co 15.22).

Aplicação

Você percebeu que as consequências da Queda se alastram por todas as áreas da vida humana? Como essas consequências podem ser combatidas?

>>Publicado na Revista Palavra Viva Os seres humanos e a queda, 4º trimestre 2010.

>>AUTORIA DAS LIÇÕES: Vagner Barbosa

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