por Ruth Bancewicz (Faraday Institute)
Tradução: Leopoldo Teixeira (Cientista da Computação – UFPE e membro da rede Teste da Fé Brasil)

Quando eu era estudante de doutorado em Edinburgh, frequentava uma igreja que era convenientemente localizada ao lado de uma série de bons pubs. Um bom grupo costumava se encaminhar para um destes estabelecimentos após os cultos de domingo à noite. A conversa variava de um simples ‘Quem é você?’ (era uma igreja grande), às discussões sobre o sermão que acabamos de ouvir e outras questões mais filosóficas. Uma noite, me sentei ao lado de um estudante de fotografia, e quando me apresentei como estudante de doutorado em genética, ela disse algo como “Todos esses fatos e números não são para mim, eu sou uma estudante de artes.” Ao invés de apenas seguir em frente na conversa, o que teria sido infinitamente mais fácil, eu tentei explicar porque pensava que a ciência era interessante. Eu acho que ganhei aquela discussão, mas você pode julgar por si mesmo.


Começamos falando de livros didáticos. Não importa o quão bem escrito estes volumes sejam, ou o quão impressionante sejam suas ilustrações, é improvável que eles venham a parar na mesa de cabeceira, a não ser perto da época de provas. Salientei que os livros didáticos têm o seu lugar – um aluno tem de se atualizar no assunto escolhido – mas, pela própria natureza da ciência, eles estão desatualizados antes mesmo de serem impressos. Se ao menos o ensino de ciências pudesse refletir o que realmente acontece.

O trabalho de um cientista é ir até a prateleira de perguntas sem resposta, escolher uma que eles sabem alguma coisa a respeito e acham que podem resolver, levá-la para o laboratório e começar a encontrar algumas respostas. Na medida que trabalham, descobrem algumas coisas novas, mas também descobrem mais perguntas, algumas são respondidas e outras colocadas na prateleira para mais tarde. Assim que começam a chegar a algum lugar eles começam a montar um artigo científico. Depois de terem publicado seu artigo, comemorado, e
recuperado um pouco do sono, eles alegremente colocam seu artigo recém-publicado pra trás e correm para a prateleira de perguntas sem resposta. Qual será a próxima? O que fazer com aquela coisa que parecia estranha no último experimento, será que vale a pena dar uma olhada naquilo? Vamos testar ainda mais a teoria que acabamos de publicar – será que ela se aplica nestas outras circunstâncias? Cada etapa da investigação é um passo na direção de compreender o modo como as coisas realmente funcionam.

Minha amiga ficou surpresa com este relato a respeito de como a ciência funciona, e disse que teria achado a ciência muito mais emocionante se tivesse sido apresentada à area desta forma na escola. A ciência é um processo dinâmico, e embora às vezes seja difícil passar essa mensagem ao mesmo tempo em que enchem às cabeças dos estudantes de conhecimento, os professores de ciências
e professores universitários precisam gritar o mais alto possível antes que mais estudantes de artes sejam enganados ao pensar que ciência é algo chato.

Não sou só eu que tem essa imagem da ciência. Quando falei com o neurobiólogo Harvey McMahon, ele me contou sobre seu tempo fazendo pós-doutorado nos EUA. Ele tem uma reputação de questionador, e foi convidado a participar das reuniões do grupo de Michael Brown e Joseph Goldstein. Estes dois homens lideravam um laboratório em conjunto, colaborando na investigação do colesterol e vieram a ganhar o Prêmio Nobel por seu trabalho. Eles convidaram o jovem doutor para as suas reuniões por gostarem de pessoas que questionavam as coisas, pois só uma exploração minuciosa da prateleira de perguntas sem resposta ajuda um cientista a chegar em algum resultado. Como a astrônoma Jocelyn Bell Burnell disse: “Se assumimos que encontramos algo, paramos de procurar”. [1]

 

[1] Do programa ‘Beautiful Minds’ da BBC, 2010