A história do empobrecimento do Nordeste brasileiro
Seja qual for o critério adotado pelas pesquisas — PIB, renda per capita, número de famílias pobres ou indicadores sociais — o Nordeste sempre aparece como a região mais pobre do Brasil.¹
Na década de setenta, quando ainda se dividia o mundo em três regiões econômicas, o economista Celso Furtado classificou o Nordeste como pertencente ao Quarto Mundo, pela sua condição de extrema pobreza. Desde então, a situação só tem se agravado. Mesmo na década de noventa, quando o Nordeste manifestou um crescimento maior do que o Brasil considerado em sua totalidade, a pobreza da região ainda assim aumentou, resultado de um sistema de distribuição de renda perverso, baseado na exclusão.
Dez das cidades mais pobres do Brasil situam-se no Nordeste, sendo sete delas no Estado de Alagoas. São José de Tapera, no sertão das Alagoas, é considerado o município mais pobre do país; sua mortalidade infantil é de 71,94 a cada mil nascimentos e a taxa de analfabetismo de 36,28%. A título de comparação, a taxa de mortalidade infantil do Brasil é de 35 por mil nascimentos (considerada alta) e a taxa de analfabetismo é de 15%.
De acordo com dados da Unicef (1999) 150 das cidades com maior índice de desnutrição se encontram no Nordeste, sendo que 33,66% das crianças com menos de cinco anos apresentam sinais claros de desnutrição. Cerca de 30% da população de todo o país se encontra no Nordeste, e ali se concentram 62% dos pobres do país. Metade de sua população possui uma renda familiar de meio salário mínimo.
Entretanto, ao lado desses altos índices de miséria social, o Nordeste possui uma grande reserva de recursos minerais, como jazidas de granito, pedras preciosas e semipreciosas. O Estado do Rio Grande do Norte produz 95% do sal consumido no país e o Estado de Pernambuco 95% do gesso, além de produzirem gás natural e petróleo. Aliás, o Estado do Rio Grande do Norte é responsável por 11% da produção de petróleo do Brasil, sendo o segundo Estado produtor, atrás apenas do Rio de Janeiro.
Portanto, considerado isoladamente, o Nordeste não apresenta nenhum déficit energético. Apesar de sofrer as consequências da aplicação de uma política neoliberal caracterizada por uma onda voraz de privatizações e pela omissão de investimentos para ampliação e manutenção da rede, seu sistema hidrelétrico permanece eficiente, mesmo diante da escassez de chuva em várias partes da região.
O povo nordestino tem sido vítima de preconceitos e considerado um povo preguiçoso, característica atribuída à influência da miscigenação com o negro e, principalmente, com o índio. Como resultado dessa mistura de raças surgiu um povo apático e modorrento. Essa imagem é totalmente falsa, pois não reconhece o esforço do trabalhador braçal, do campo ou da cidade, que começa a trabalhar ainda criança, muitas vezes em condições desumanas, sujeito à doenças, subnutrição e desemprego. Além disso, essa visão revela um completo desconhecimento da história das lutas travadas pelos negros e índios contra o colonizador branco, interessado apenas em usá-los como mão-de-obra escrava.
A produção cultural erudita e popular do povo nordestino também não permite que se atribua à pobreza sua falta de capacidade criativa. Criativo na arte popular e erudita, na literatura e na busca de soluções para os problemas políticos, econômicos ou de outras áreas, o povo nordestino tem demonstrado inquestionáveis realizações, apesar das condições adversas. O sistema de alfabetização desenvolvido por Paulo Freire e celebrado no mundo inteiro é um bom exemplo da capacidade do povo nordestino.
Portanto, a miséria do Nordeste não decorre da ausência de recursos naturais, muito menos da má vontade ou incapacidade do seu povo, como sugere o preconceito de alguns pensadores. De acordo com a análise de Manoel Correia de Andrade, essa situação seria fruto de um desenvolvimento histórico, político e social desfavorável². O deslocamento do eixo de influência política do Nordeste para o Sudeste, em um processo gradual e inexorável, condenou o Nordeste a uma situação de dependência e definiu o seu progressivo empobrecimento. A exploração do ouro nas Minas Gerais e a valorização do café no mercado internacional foram os dois grandes acontecimentos históricos, do ponto de vista econômico, responsáveis por esse deslocamento. Do ponto de vista político, a instalação da família real no Rio de Janeiro e a política oligárquica do café com leite, com Minas, Rio de Janeiro e São Paulo se revezando harmonicamente no poder, garantiram e consolidaram aquilo que os fatores econômicos já haviam sugerido. Acrescente-se a tudo isso a falência da política agrária de monocultura, engolida pela multiplicação das culturas de cana-de-açúcar pelas colônias do mundo todo, e teremos o quadro quase completo do processo devastador da hegemonia nordestina na história do Brasil.
Um fato ocorrido na cidade de Recife revela o que isso significou na prática. No começo do século 19, antes que a cidade tivesse qualquer tipo de iluminação nas ruas, seus moradores pagavam uma taxa para a iluminação pública da cidade do Rio de Janeiro. Desse modo, a corte imperial desfrutava de uma boa iluminação nas ruas da cidade que havia se tornado a capital da colônia transformada em Reino Unido, enquanto que os recifenses permaneciam no escuro. Portanto, a vinda da família real para o Rio de Janeiro consolidou a instalação do sistema colonial nas relações políticas internas. O Nordeste, na prática um exportador de matéria-prima e de mão-de-obra barata e repassador de tributos arbitrados pela família real, firmava sua posição de colônia interna do Sudeste do Brasil.
NOTAS:
¹. ARISTÓTELES. A Política.São Paulo: Martins Fontes, 1998.
². ALMANAQUE ABRIL 2001 – MUNDO
Trecho do Capítulo 6 do livro “Um Jumentinho na Avenida – A Igreja e as Cidades”, de Marcos Monteiro.
EDUARDO
Celso Monteiro Furtado, paraibano, foi um dos maiores economistas brasileiros, falecido em 2004, seu norte econômico era: intervencionismo estatal na economia. Talvez seja por isso que o Nordeste onde eu moro, por opção, é a região do Brasil mais dependente do governo, não por conta de sua pobreza, mas de parte da ideia e leitura de pobreza que Furtado fez que aos poucos os nordestinos vão deixando de lado nesse formato de assistencialismo crônico.
Jean Oliveira
Sou do RN. Nosso Estado é rico em turismo. A geografia local nos dá um litoral Norte e um Sul com belas praias históricas que atraem turistas de todo Brasil e diversos lugares do mundo. Com exposto produzimo 11% do petróleo nacional fora a produção de sal, etc. Mesmo assim ainda continuamos um Estado pobre. Os recursos continuam mal aplicados. Enfrentamos constantes greves e mobilizaçãos das instituições Estatais em busca de melhorias. S ó Jesus. A violência e desemprego aumentam.
Lindenberg Guedes
Temos que nos unir e lutar para tornar o nordeste um pais independe,e assim livralos desses políticos corruptos que so pensam em roubar e nada fazem por nosso amado nordeste e assim transformalo em uma grande nação
Petra Ariely
Concordo com o Eduardo. O auxílio aos mais pobres pelo governo pode ser benéfico até certo ponto, mas o Estado interferir na economia não funciona. É entregar riqueza nas mão de gente safada e inescrupulosa.