O pioneirismo de Daniel Kidder no Nordeste
Um dos pioneiros do protestantismo no Nordeste foi o missionário congregacional Daniel Parish Kidder. Tendo como sua base a cidade do Rio de Janeiro, ele realizou viagens missionárias ao Norte e Nordeste brasileiro, entre 1830 e 1840. Não se pode afirmar que ele tinha como estratégia a plantação de igrejas, mas a de evangelizar as pessoas, através da venda e distribuição de folhetos e Novos Testamentos em português. Essa proposta não tem em Kidder o pioneirismo. Como ele mesmo registrou, os 50 primeiros Novos Testamentos foram distribuídos por um profissional inglês no Recife, em 1823, já impressos na língua portuguesa, tendo o bispo de Pernambuco, posteriormente, condenado tanto essa tradução para o português, quanto a que depois foi distribuída pela Sociedade Bíblica.
Sendo o trabalho evangelístico de Kidder caracteristicamente itinerante, dos seus registros das viagens que fez ao Recife, salientaremos apenas cinco aspectos missiológicos:
1. Apesar da liberdade dos estrangeiros poderem adotar a sua religião em solo brasileiro, existia uma forte e arraigada intolerância católica contra os emigrantes protestantes e de outras fés.
2. Instalou-se entre os religiosos da Igreja Católica uma tendência à “cultura da ignorância”, a ponto de padres afirmarem gostar mais de jogar do que de ler livros.
3. Havia severas críticas à ação do clero por parte dos políticos republicanos, os quais defendiam um Estado separado da Igreja. Tais políticos alegavam que nada conseguiriam fazer ou realizar sem a ajuda de um clero moralizado e inteligente. Kidder registra um relatório do Ministro da Justiça e dos Negócios Eclesiásticos datado de 1843, onde os padres são responsabilizados pelo desleixo para com o sacerdócio. Eis alguns trechos do relatório:
“É notório o estado de decadência em que se encontra o nosso clero. É também evidente a necessidade de se tomarem medidas capazes de remediar o mal. A 9 de setembro de 1842, o govêrno consultou, sobre êsse assunto, os bispos e os vigários capitulares. Conquanto não tenham sido completas as respostas de todos eles, não resta a menor dúvida sobre os seguintes pontos. É verdadeiramente alarmante a falta de clérigos que se dediquem com afinco aos trabalhos espirituais. Na província do Pará, paróquias existem que há doze anos e mais não têm vigário […]. No Maranhão, vinte e cinco igrejas foram, em épocas diversas, dadas como vagas, sem que jamais aparecesse um candidato… Mesmo os padres que se ordenam, poucos se dedicam ao sacerdócio propriamente dito. Uns voltam suas vistas para atividades seculares, em busca de maiores vantagens e posição…”
4. Kidder identificou que o primeiro programa adotado para a educação pública em Pernambuco possuía pouquíssimos recursos financeiros comparados com a renda da província. Tal desproporcionalidade, aos olhos daquele missionário, produziu graves prejuízos às cidades do interior, onde o programa raramente chegava e, quando chegava, era deficiente.
5. Por fim, Kidder destacou a marcante e inconfundível presença e forte influência da Igreja Católica Romana não apenas na vida religiosa e política, mas na própria forma de construir as cidades em torno da Matriz. Textualmente Kidder declarou: “Todas as cidades dos brasileiros têm duas particularidades: em primeiro lugar as casas são em geral, caiadas de branco; depois, todas as eminências ou pontos altos [perto das cidades] têm, para adorná-las, uma igreja [Católica] de construção antiga.” Assim, atualmente, em toda e qualquer cidade do interior nordestino, por menor que ela seja, há sempre uma igreja católica construída na praça central da cidade.
— Trecho do livro Cidades do Interior (Sérgio Lyra), da Editora Ultimato em parceria com o Betel Brasileiro.
Eduardo
Leio com regularidade artigos em ULTIMATO que tentam traçar um ponto de contato entre o passado (Simonton, Kidder) com o presente (educação, jovens).
Há dois problemas nessa tentativa. Primeiro é que não há estudos estatísticos comparativos entre o modelo missionário do passado com qualquer tentativa de abrir uma agenda evangélica no presente, sobretudo na área educacional.
Segundo que há anos, chega quase a um século, o fim da tentativa missionária de entrar na área educacional formando uma linha de pensamento, de ação, de formação de uma cultura evangélica. O Mackenzie foi inicialmente tudo isso aí.
No primeiro caso a contribuição foi feita e gerou muita coisa boa. Elben é um exemplo dessa herança e a força de ULTIMATO um exemplo moderno, muito embora hoje tenha um forte pendor para o marketing e não tanto pelo conteúdo.
No segundo porque educação no Brasil hoje além de estar em permanente crise — não conseguem nem definir o conteúdo daquilo que se deve lecionar no país afora — porquanto educação está nas mãos de entidades privadas em busca do lucro (nada contra) com o governo aparelhando as instituições públicas de ensino com uma orientação que não favorece em nada daquilo que os primeiros missionários tinham em mente.