20 anos de Rede Mãos Dadas
Como uma brincadeira de criança
→ Leve-me direto aos materiais do Mutirão Mundial de Oração.
Uma das melhores lembranças de minha infância são as brincadeiras em grupo nas noites quentes do Norte do Brasil. Reuníamos todas as crianças da minha rua e nos dividíamos em duas equipes; uma era a “polícia”, a outra os “ladrões”. Éramos pobres, a rua não tinha asfalto, mas a vegetação ao redor se tornava um lugar ideal para a nossa imaginação. Assim era uma parte da minha vida na década de 80 na pequena cidade de Igarapé-Açu, no estado do Pará.
Essa memória ilustra um pouco do que eu quero ressaltar aqui sobre a trajetória da Rede Mãos Dadas, com quem tive a honra de trabalhar nos primeiros dez anos de sua existência (2000- 2010). Eu era aluno do Centro Evangélico de Missões (CEM), em Viçosa (MG), quando conheci a Elsie e a Klênia, propulsoras de um periódico diferente, a revista Mãos Dadas. Diferente porque a preocupação não era falar somente com os administradores das instituições sociais, mas, principalmente, com os trabalhadores da “linha de frente” (o educador social, a cozinheira, o porteiro…); pessoas quase sempre esquecidas nos projetos de capacitação, mas que exercem um papel fundamental no cuidado das crianças em vulnerabilidade social atendidas por ONGs.
Como jornalista, eu vibrei quando ouvia da Elsie o desafio de “escrever uma revista que o educador social entenda”. Comecei como estagiário, e me envolvi cada vez mais no projeto, que também, ao mesmo tempo, foi se ampliando. De uma revista, nos tornamos uma rede, graças ao trabalho fiel da equipe em dialogar e reunir presencialmente com os representantes das organizações parceiras. Nos preparávamos, ansiosos, para a data do Encontro Anual da Rede Mãos Dadas. Quando os parceiros chegavam, era como se reencontrássemos velhos amigos. Na verdade, era mais do que isso: éramos companheiros de uma jornada muito maior do que nós mesmos. Nossos encontros duravam em torno de 3 dias, sempre regados a muitos risos e sustento emocional e espiritual. E era nesse ambiente que traçávamos os planos para a Rede; planos cheios de esperança em favor das crianças que viviam em contextos de desesperança. Nossas orações eram alimentadas pelos rostos e histórias de meninos e meninas, e impulsionadas pelo vento do Espírito Santo nos lembrando que aquela era a nossa missão: vida abundante para todas as crianças!
Bem, a Rede Mãos Dadas completa 20 anos e, eu, olhando para tudo o que fizemos juntos, penso na maior lição que aprendi: a missão de Deus é uma missão em parceria. Nada do que realizamos teria sentido se não fosse feito de “mãos dadas”.
As discussões em grupo, o mutirão de oração, a doação de recursos para projetos em comum, a assistência a organizações parcerias mais necessitadas… foram tantas soluções encontradas coletivamente!
Volto então à minha lembrança da infância. Por que ainda me recordo das brincadeiras em grupo? Porque me lembro também das relações e dos rostos de meus amigos. Deus nos chama, fundamentalmente, para amar, e isso já é a principal base para o trabalho em rede. E quando olhamos para o cenário das crianças em vulnerabilidade, não dá para imaginar uma solução macro sem ajuda coletiva.
A Rede Mãos Dadas aprendeu ao longo desses anos que, mesmo sendo fundamental, a busca pela unidade não é algo fácil. Exige paciência, amor e convicção. Mas com
o tempo, tudo isso se torna um estilo de vida, começa a fazer parte do seu caráter ao ponto de se tornar tão natural como uma brincadeira de criança.
Lissânder Dias, 41 anos, é jornalista. Fez parte da primeira equipe editorial da revista Mãos Dadas. Atualmente trabalha como assessor editorial na UniCesumar. É blogueiro de www.fatosecorrelatos.com.br