Um Deus que descansa
O ritmo divino de descanso legitima o trabalho em sua essência
Por Lea Ferreira
Em alguns versículos das Escrituras vemos um Deus que não cochila nem dorme (Sl 121.4; Is 64.4; 1Co 12.6). Se lermos os textos sem uma exegese adequada, teremos a impressão de que Deus trabalha sem valorizar ou priorizar o descanso. Porém há uma diferença entre ver e olhar. Ver é um processo passivo, quase que mecânico; o olhar exige mais atenção, exige análise, dedicação e interesse. Ao analisarmos esses textos, aprenderemos algumas lições muito importantes sobre o descanso e o trabalho.
A lição inicial a ser aprendida é que o ritmo divino de descanso legitima o trabalho em sua essência. Existem várias passagens bíblicas que nos incentivam a trabalhar e a aproveitar os frutos que são colhidos por meio disso. Entretanto, devemos considerar que, de acordo com as Escrituras, o trabalho e o descanso seguem um ritmo distinto, o ritmo natural da graça. Uma graça que nos incentiva a perceber o trabalho e o descanso de maneira distinta da que a sociedade percebe.
Vejamos isso de forma prática. No verso de Marcos 6.31 em diante, os discípulos de Jesus estão de volta após uma viagem de intenso trabalho e, preocupado com eles, o Senhor os convida para irem a um lugar deserto a descansarem um pouco. Entusiasmados com a ideia de estarem a sós com o Mestre depois de terem passado dias trabalhando, eles veem suas expectativas serem frustradas ao desembarcarem do outro lado da margem e serem surpreendidos com uma grande multidão os esperava. Provavelmente, isso gerou frustração, já que desejavam um tempo de privacidade. O Mestre, todavia, olhou para a multidão com compaixão. Os discípulos, preocupados com seu próprio descanso, pediram-lhe que despedisse a multidão, mas Jesus, por outro lado, desafiou-os a alimentar aquelas pessoas. Parece haver uma certa discrepância no convite de Jesus feito aos discípulos: ele os convida para descansar e em seguida os desafia a trabalhar? Perceba que ao desafiá-los a alimentar a multidão o Mestre estava ensinando-lhes uma lição importante. A ênfase aqui não estava apenas no descanso em si, porém, estava no fato de que junto ao Mestre aprendemos que o descanso, a compaixão, o amor e o serviço, podem caminhar juntos.
Outra lição importante que esta passagem nos ensina é não desprezar o lugar da oração no descanso. Seguindo o fio da história em Marcos 6, após despedir a multidão e os discípulos, Jesus se retirou para orar, buscando ficar a sós com o Pai, assim como em vários outros momentos. Alguém já disse que a oração coloca no mesmo trilho os pensamentos e o coração. O poder renovador e regenerador da oração, diminui o barulho da multidão, das vozes externas e internas, das “multidões para alimentar”. Nela somos guiados para o gozo e paz que este momento nos traz. No tempo a sós como o Pai, deixamos tudo nas mãos dele e então podemos nos esvaziar das preocupações, das ansiedades da vida cotidiana. A oração é um excelente benefício que nos ensina a descansar no Pai. Jesus usou este recurso e nos encoraja a usar também. Lições importantes que muito provavelmente já conhecemos, mas porque as vezes, esquecemos de colocar em prática. As vezes demoramos a aprender porque o nosso coração fica endurecido. Você conhece o restante desta história.
Então, se entendemos as vantagens do descanso, por que precisamos ser constantemente lembrados para descansar? No próximo texto relacionado ao tema, falaremos sobre a síndrome de super-herói ou heroína que alguns de nós carregamos.
- Lea Ferreira é ligada à AMIDE (Associação Missionária para Difusão do Evangelho); já viveu no Sudeste da Ásia para uma experiência transcultural, serve na área do cuidado integral do missionário há cerca de 10 anos, atua como voluntária em projetos relacionados ao cuidado como o Movimento Irmãs Amigas, CIM TERE (Cuidado Integral do Missionário para Teresópolis/RJ e região) e CIM BRASIL (Departamento de Cuidado Integral do Missionário da Associação de Missões Transculturais Brasileiras). Atualmente é estudante de psicologia, cursando o 7º período.
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Preciso ser lembrado de descansar?, por Léa Ferreira