Teologia: entender mais a respeito de quem e em que confiamos
Livro da Semana | Alister McGrath
Por que nós cremos que algumas coisas são verdadeiras e que diferença elas fazem na forma como vivemos
A fé, em sua base, é um assunto relacional; é sobre confiar em Deus. Apesar disso, parte da dinâmica mais íntima da vida de fé é o desejo de entender mais a respeito de quem e em que nós confiamos. Anselmo de Cantuária (c. 1033–1109) fez famosa observação de que a teologia é, basicamente, “fé à procura de entendimento”. O grande teólogo cristão Agostinho de Hipona (354–430) também deixou claro que há uma genuína empolgação intelectual em lutar junto com Deus.
Teologia é uma paixão da mente, um desejo de entender mais sobre a natureza e os caminhos de Deus e o impacto transformador que isso tem na vida. Nossa fé pode ser aprofundada e nossa vida pessoal, enriquecida por meio da reflexão teológica. Assim, como começamos a desenvolver essa paixão da mente?
Não podemos, entretanto, explorar a relevância da teologia sem, primeiramente, observar como tem sido ruim a sua reputação dentro das igrejas nas últimas décadas. Para alguns líderes cristãos, a teologia é irrelevante para a vida real. É como se retirar para torres de marfim quando existem coisas mais urgentes com o que se preocupar. Mas, entendendo corretamente, a teologia trata de possibilitar ações cristãs instruídas. Ela nos faz querer fazer coisas, e fazê-las de modo cristão. Ela nos ajuda a fazer julgamentos em relação a como agir melhor; ela nos encoraja a interagir com o mundo real.
Outros líderes cristãos expressam preocupação quanto à tendência da teologia em criar divisão e conflito na Igreja. J. I. Packer, uma das vozes mais influentes e sábias do meio evangélico, tem escrito sobre o problema dos “intelectualistas defensivos” — “cristãos rígidos, argumentadores e críticos, campeões da verdade de Deus, para os quais a ortodoxia é tudo”. Creio que todos nós conhecemos pessoas que parecem ter uma obsessão com o que Packer chama de “vencer a batalha para a precisão mental” e pouco interesse em qualquer outro aspecto da fé cristã. Eles podem amar a Deus, mas parecem ter problemas em amar outras pessoas — especialmente quando discordam delas. Não é sempre fácil discernir como essa fixação na precisão teológica se conecta com os registros do ministério de Jesus de Nazaré, encontrados no evangelho. Certamente, a melhor maneira é procurar uma ortodoxia generosa, vendo as divergências no contexto das harmonias maiores que nos unem.
Não podemos amar a Deus sem querer entender mais a seu respeito
A vitalidade da fé cristã está na empolgação e no completo prazer intelectual causados pela pessoa de Jesus de Nazaré. Aqui está alguém que a Igreja considera intelectualmente luminoso, espiritualmente persuasivo e infinitamente suficiente, tanto pública quanto individualmente. Os cristãos expressam esse deleite e maravilha em seus credos, e o fazem de forma mais especial em seu culto e adoração. Há séculos, Agostinho de Hipona refletiu sobre como as comunidades eram unidas pelos objetos de seu amor. A forma mais certa de aumentar a identidade, coerência e coesão de uma comunidade é ajudá-la a ver com mais clareza o que ela ama e, então, amá-lo com mais afeto.
Essa é a razão pela qual o culto é tão importante para a identidade cristã. Ele focaliza nossa atenção no que realmente importa e proclama que a fé cristã tem poder para capturar a imaginação — não meramente persuadir a mente — por abrir as profundezas da alma humana às realidades do evangelho. Ela sustenta uma grande paixão por Jesus Cristo, a qual nutre o dever teológico, mesmo quando este questiona sua capacidade de viver à altura do esplendor de seu propósito principal.
O apelo da visão cristã de Jesus de Nazaré à imaginação e às emoções dos discípulos nunca deve ser negligenciado ou menosprezado; porém, ainda assim, precisamos apreciar que a essência intelectual da fé cristã permanece. Não podemos amar a Deus sem querer entender mais a seu respeito. Nós somos chamados a amar a Deus com nossa mente, bem como com nosso coração e nossa alma (Mt 22.37). Não podemos permitir que Cristo reine em nossos corações se ele não guiar nossos pensamentos também. O discipulado da mente é tão importante quanto qualquer outra parte do processo pelo qual nós crescemos na fé e no compromisso.
A defesa da credibilidade intelectual do cristianismo tem se tornado cada vez mais importante nos últimos anos, mesmo com o registro do crescimento do novo ateísmo. Devemos nos ver como portadores-padrão da vitalidade espiritual, ética, imaginativa e intelectual da fé cristã, mostrando por que nós cremos que certas coisas são verdadeiras e que diferença elas fazem na forma como vivemos e nos relacionamos com o mundo ao nosso redor. Acima de tudo, devemos expandir nossa visão do evangelho cristão. Para alguns, perceber o quanto ainda existe para saber sobre a nossa fé pode parecer intimidante. Mas também, pode ser empolgante antecipar as descobertas futuras, como o rico cenário da fé cristã despontando diante dos nossos olhos.
Edna Célia
Texto maravilhoso! Estamos estudando aqui na IPB Mata do Jacinto, em Campo Grande MS, essa temática…em tempos difíceis, em que pensar?