O Meu Lugar no Mundo: “Não há mapas”, por René Padilla
Fui criado em um lar cristão e recebi o ensino por parte de meus pais desde que era menino, mas quando cheguei ao ensino médio, recebi muitas perguntas difíceis dos professores que eram ateístas. Isso despertou em mim o interesse em encontrar respostas a essas perguntas. Por que, por exemplo, em um continente que é tido como cristão, há tanta injustiça social, tanta exploração e opressão? Eu não sabia o que dizer.
Com o desejo de encontrar uma resposta, fui começando pela literatura. Sempre gostei muito de ler, mas não encontrei nada. Fui aos Estados Unidos para estudar e nos meus anos lá também não encontrei resposta. Mas na universidade em que recebi o título de filosofia também tive os instrumentos para estudar teologia.
Voltei à América Latina para trabalhar com a Comunidade Internacional dos Estudantes Evangélicos (CIEE) e vi que as mesmas perguntas que eu havia escutado antes estavam sendo feitas nas universidades. Isso provocou em mim o desejo de encontrar uma resposta a partir de minha própria situação, como uma nota pastoral aos estudantes e sobre a base da Bíblia, das Escrituras.
Junto com os outros membros do CIEE, como Samuel Escobar e Pedro Arana, ambos peruanos, começamos todo um processo de reflexão que nos levou à conclusão de que interessa a Deus a totalidade da vida humana. Não só a alma, não somente o espiritual, mas cada aspecto da vida humana e da pessoa em comunidade. Não sozinha, mas na comunidade.
Foi esse o nascimento da missão integral, nos anos 1960, pelo menos no mundo evangélico. Depois, muito tempo depois, descobrimos que havia autores evangélicos que já haviam escrito sobre isso antes de nós, não com a termologia que usamos, de “missão integral”, mas realmente com a ideia de que o evangelho é para a totalidade da pessoa.
Caminhos para as novas gerações
Quando jovens, queremos mudar o mundo. Quando se chega à minha idade, já sabemos que a mudança não é tão fácil. Mas sempre é possível plantar a semente da inquietude, semear perguntas e questionar o que está acontecendo. Não com o propósito de fazer uma crítica negativa, mas de ver sinais do reino de Deus e manifestações locais em um contexto de injustiça global. Creio que esta é a nossa tarefa. Jesus Cristo não mudou as coisas no Império Romano globalmente, mas seu ministério foi de sinais do reino de Deus. E esta é a nossa missão.
Sempre há possibilidade de que a nova geração construa sobre tudo que é positivo da geração passada. Obviamente nenhuma geração é perfeita. Há pontos positivos e negativos. É preciso tomar o que há de positivo e sobre esta base construir algo que realmente dê a resposta aos problemas que afetam negativamente a humanidade.
Tenho muita esperança na nova geração. E creio que esta esperança tem a ver não somente com a possibilidade de que construam sobre os acertos da geração passada, mas também que se atrevam a fazer coisas novas. E isso está acontecendo. Creio que a nova geração tem muitas vantagens em relação à passada. A nós, da geração anterior, cabe a tarefa de abrir brechas e lutar contra a atitude negativa a respeito de toda ideia de mudança. Agora, muitos “velhos” reconhecem tal necessidade de mudança. Então a nova geração tem a oportunidade de oferecer novas respostas.
À juventude cabe o papel de conscientizar o povo de Deus sobre os problemas que afetam toda a humanidade, não somente a igreja. Às vezes o problema é que nós cristãos ficamos preocupados em conseguir garantias para igreja, mas não pensamos em termos mais amplos.
Quando eu tinha mais ou menos 20 anos, um amigo missionário me disse: “René, não se esqueça disso. Deus não nos dá um mapa. Deus nos dá sua mão”. Entende? Se temos um mapa, vamos sozinhos. Mas Deus não nos dá um mapa, Deus nos dá sua mão. Temos que aprender a caminhar pela mão de Deus. Confiando em Seu Espírito e abertos a todo discernimento não somente pessoal, mas também comunitário. Deus nos dá sua mão e nos conduz passo a passo em seu caminho, se estamos dispostos a sermos obedientes ao que Ele quer de nós. Que confiemos em Deus e avancemos em tudo que tem a ver com o desenvolvimento de nossa vocação, como participação na missão de Deus no mundo.
C. René Padilla, 83 anos. É nascido no Equador e residente em Buenos Aires, na Argentina. Bacharel em Filosofia, mestre em Teologia pelo Wheaton College, EUA, e doutor em Novo Testamento pela Universidade de Manchester, na Inglaterra. É fundador da Rede Miqueias, membro-fundador da Fraternidade Teológica Latino-Americana e diretor de Ediciones Kairos, editora ligada à Fundação Kairós. É ex-presidente internacional da Tearfund, e autor e organizador de vários livros publicados em diversos idiomas.
Juliano Souza
Caro René,
Gostaria de saber porque muitos associam a Missão Integral à Teologia da Libertação, existem alguns pontos em comum?
Pedro Pardal
TMI é marxismo puro.
Antonia Leonora van der Meer
TMI não é marxismo. É a mesma eologia defendida pelo Pacto de Lausanne. Se puder leia o livro do Samuel Escobar sobre diálogo entre Cristo e Marx. O que tem em comum é a preocupação com a realidade social e a necessidade de uma resposta cristã, mas a TMI é evangélica, fiel à Palavra de Deus.
Antonia Leonora van der Meer
Cometi um engano, quando escrevi que o marxismo também busca uma resposta bíblica. O Marxismo rejeitou a Deus e a sua Palavra. Quem também busca uma resposta bíblica é a Teologia da Libertação, e essa, sim, tem muita base filosófica no Marxismo.