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Nossos boletins Últimas de setembro serão ilustrados pelos traços do pintor, desenhista e artista plástico Alvaro Milanez. Ele, que já foi monge, vive atualmente em Curitiba e diz que faz arte para a “glória de Deus”, com olhar de criança descobrindo o mundo. Confira a entrevista abaixo.

 

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Fale um pouco sobre sua história pessoal, sua trajetória até á arte.

Meu pai era engenheiro. Veio de uma família de músicos. Havia um maestro Milanez há tempos. Tenho um primo e um sobrinho que são músicos profissionais. Minha mãe era “do lar”. Cuidava de 7 filhos (as vezes alguns `agregados`) e passava muito tempo costurando, inventando roupas, alem de tricô e crochê.

Minha mãe, principalmente, deu-me todas as oportunidades que alguém que tenha algum jeito para arte poderia sonhar. Estudei pintura e desenho desde os oito anos. Cursei a Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI), estudei no Parque Laje e fiz um mestrado em artes visuais na Inglaterra.

Criar, desenhar e pintar sempre foi para mim “como respirar”. Durante cerca de 25 anos só dedicava algumas horas por semana à arte, mas desde 2009 minha dedicação é exclusiva. Ultimamente, há cerca de 1 ano e meio, tenho me dedicado a escultura. Costumo dizer que escultura parece ser uma combinação do trabalho da minha mãe — recortando tecidos, escolhendo cores, etc — e do trabalho do meu pai — bolar e “colocar alguma coisa em pé”.

A ESDI (onde fiz meu bacharel em design) é muito influenciada pela escola de Bauhaus. Por isso, tenho uma admiração enorme por Paul Klee, Kandinsky (que escreveu um livro chamado “Do Espiritual na Arte”) e artistas da primeira metade do século 20, como Cezanne, Matisse, Picasso. No Brasil, tenho uma admiração por Volpi, pelo fato de ele ser uma “anti-celebridade”, fazer com suas mãos suas telas, etc. Descobri que admirava — e admiro — grandes escultores como Brecheret, Franz Weissmann e Amilcar de Castro. No exterior — entre os contemporâneos — Richard Serra (que faz enormes esculturas com aço usado em cascos de navios), Gerhard Richter e o arquiteto Frank Gerry, autor dos projetos dos museus Guggenheim.

alvaroQual sua história de fé? Participa de alguma igreja?

Minha mãe e meu pai eram muito religiosos. Conheceram-se em um grupo de jovens interessados na vida contemplativa e monástica. Dedicavam um bom tempo de suas vidas em oração. A experiência de viver na Inglaterra em meio a uma crise econômica (1981/1982) em uma cidade com muitos imigrantes da Índia, Paquistão e Caribe me fez adquirir uma visão nova sobre ser cristão, ser estrangeiro — de uma certa forma oprimido e discriminado. Larguei minha carreira aos 29 anos para viver uma vida consagrada a Deus, como monge. Tive durante 23 anos um diretor espiritual, um monge americano que me ensinou muito sobre “ser cristão” e, principalmente, sobre a pessoa de Jesus e vida de Jesus em nós.

Considero-me cristão. Para mim, as diferenças denominacionais são temporárias e provisórias. Há três anos passei a frequentar um grupo de estudo bíblico da Igreja Luterana da qual meu filho e a noiva fazem parte. Hoje sinto-me completamente em uma comunidade. É o grupo dos cultos e células em inglês, da Primeira Igreja Batista do Batel, a maior comunidade evangélica de Curitiba, PR.

Como você compreende a relação arte e fé? Podem caminhar juntas?

Não só podem, mas naturalmente caminham juntas. A distinção entre fé, ciência e arte é algo “recente”, dos últimos 1.500 anos. Criar — seja uma sonata de Mozart, uma missa de Bach, uma sinfonia de Beethoven — é ao meu ver algo divino e feito para glorificar a Deus.

Criar uma pintura ou escultura — como Giotto, Durer, Rafael, Bernini, Rembrandt e Van Gogh faziam — é, a um só tempo, contemplar a criação de Deus, “re-criar” essa criação e glorificar a Deus. Inspiro-me nos construtores das catedrais. Você pode imaginar o impacto visual de uma catedral com a altura de um prédio de uns dez andares, que, por vezes, levavam mais de 150 anos para finalizar, em meio a aldeias em que a maior construção não passava de dois andares, se tanto? Esses homens — que construíam catedrais — oravam antes de começar a trabalhar. Sabiam que morreriam antes que a catedral estivesse terminada. Antonio Gaudi, o arquiteto catalão, que projetou a Catedral da Sagrada Família, era um homem de Deus. A catedral será terminada daqui a alguns anos em um total de 134 anos que levou para ser construída. Gaudi dormia na própria catedral no final da vida.

Eu diria que ser “criança” é um tempo de ser criado e de criar. As crianças são criaturas onde Deus age mais livremente. E elas criam também livremente.

Finalmente, li recentemente em um livro de história da arte, de Ernst Gombrich, creio — que o máximo da abstração — no sentido de arte abstrata — é a música. Escuto frequentemente as sonatas de Mozart (embora goste de MPB, rock e jazz). Elas me parecem como que esferas que giram no universo, com a harmonia e a perfeição com que Deus criou o universo.

Resumindo: faço minha arte para a Glória de Deus. Os pássaros cantam, os lobos uivam e nos, seres humanos, continuamos a criação de Deus, como disse Ernesto Cardenal, em um livro que li há muito tempo.

Quais as características que marcam a sua obra?

Acho que a arte do nosso tempo reflete a falta de fé de muitos artistas. Incluem-se aí autores de novela, escritores, pintores. Procuro levar a alegria das cores, da experiência da criança ao descobrir o mundo — um livro de Clarice Lispector “A Descoberta do Mundo” –, de se alegrar com cada dia que nasce.

Hoje não existe fronteira ou movimentos de arte. Gerhard Richter faz pintura abstrata, figurativa, fotografia. Picasso fazia isso também.

A arte é a celebração da vida. Assim como são o amor e a liberdade.

 

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Veja algumas galerias do Alvaro Milanez:
No Flickr – 01 / 02 / 03.
No Facebook.

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