E também pôs a eternidade no coração do homem (Ec 3:11)

Sabemos o que é eternidade? Se a resposta for negativa, é coerente que não saibamos lidar com ela.

Começo por dizer que a eternidade não é um tempo muito comprido; na verdade, trata-se de uma medida de distância. Bem compreendida, transforma-se em uma medida de proximidade. Porque encontramos meios de trazer para o presente o que está distante no passado e no futuro, como o fazemos com a saudade e com a esperança, por meio da fé. 

A eternidade é um lugar. Melhor dizendo, um espaço — presente e de presença. Quando atinamos com ele, e o acessamos; quando entramos nele, conseguimos vencer, em grande parte, os limites, as correntes, as cadeias do tempo.

Nesse lugar, que às vezes acessamos por acidente, estão presentes — e acessíveis — as realidades mais verdadeiras, concretas e permanentes da experiência humana. Nesse lugar permanecem momentos, afetos, pessoas, abraços, sorrisos, gestos e fatos que nossas vidas construíram. Ali estão com o sinal, com o carimbo da onipresença. 

Nesse lugar estão guardadas as “obras das nossas mãos”. Não todas; apenas aquelas que tenham sido confirmadas pelo Autor do tempo.

Aqueles que pertencem à eternidade, ou seja, em cujo coração ela foi semeada, são como flechas de fogo que cortam horizontalmente, como um meteoro incandescente, os céus do tempo. Deixam nele as suas marcas, o seu rastro, mas vêm de muito longe e seguem seu curso, depois de terem atravessado as eras.

O que Deus colocou no coração do homem foi um dom; ali ele plantou a semente da eternidade. Assim como nos presenteou com sua imagem e semelhança, em termos da capacidade de amar, de desenvolver afetos e misericórdias; de escolher o bem e o belo (e aborrecer o mal); assim como nos deu o dom da criação (artes e ofícios, procriação, perdão, reconciliação, devoção e adoração); assim também nos presenteou com o dom de habitar certos lugares que chamamos de “lugares celestiais”, onde o que foi ainda é; e o que está por vir já nos é acessível. 

Ainda exilados no tempo e no espaço, manifestamos em nós capacidades, habilidades e competências que denunciam nossa natureza extra-temporal; nossa capacidade — hoje tão limitada, tão atrofiada — de “nos ambientar na eternidade”. 

Nem sempre percebemos que há coisas que fazemos e sentimos na eternidade; ou seja, coisas que não passam, não ficam para trás no tempo, nem estão distantes no futuro. 

Há gestos, palavras, sentimentos e emoções que ficam; que são; que estão; que estão aqui; estão agora. Que têm mais proximamente a natureza de Deus, porque vieram dele. Nesse sentido, a eternidade é o lugar onde os reencontramos. Estão lá; permanecem eternos. 

Um dia as correntes do tempo serão rompidas e, retirado o véu, essas pessoas, esses sentimentos, esses momentos, essa verdade e concretude que hoje não sabemos definir, mas que percebemos como sonhos, visões, saudades, esperanças e memórias, caras e únicas, tudo isso estará presente novamente — eternamente. E perceberemos que, à semelhança daquele que nos criou, quase que inconscientemente, dissemos “haja” a realidades eternas, que passaram a ter a nossa marca — e, claro, o carimbo do Senhor do Tempo.

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