Conteúdo oferecido como “Mais na Internet” na seção Ponto Final da revista Ultimato edição #368.

Com a chegada do período das festas natalinas, crianças e adultos começam a sonhar com os presentes que gostariam de ganhar. As crianças chegam a escrever cartas para Papai Noel; os adultos nem tanto, porém não é incomum enviarem mensagens ou deixarem recados muito claros àqueles dos quais poderia surgir uma “surpresa”.

Os campeões de pedidos, considerando todas as faixas etárias de consumo, são os aparelhos eletrônicos. Entre estes, reinam absolutos os smartphones e tablets. Pesquisas encomendadas pelo mercado revelam que mais da metade dos “pedidos a Papai Noel” envolvem esses pequenos aparelhos maravilhosos.

É nesse momento que se alarmam as pessoas antenadas ao efeito da tecnologia sobre o comportamento humano. No caso específico, o temor é que os celulares aprofundem ainda mais o fosso que se criou entre as pessoas. Hoje, noticia-se que os jovens passam mais tempo de olho em suas telinhas do que nos rostos das pessoas. Isso, considerando relacionamentos profissionais e familiares, pode ser representado pela cena comum de uma linda mesa posta, cheia de gente, e todos em silêncio, olhando para baixo, com os rostos levemente iluminados pela luz de tablets e smartphones.

Mas e se for eu o Papai Noel da vez? Como não atender ao pedido de um parente querido? Como vou lhe dar uma camisa em vez do seu sonhado iPhone novo? E olha que nem se está pedindo um aparelho “do zero”; deseja-se apenas um upgrade de modelo. Ou seja, o sonho significa somente a diferença de preço entre o usado e o novo.

“Não vou colaborar com a separação da minha família!” pensa você. “Esses aparelhos são ‘coisa do diabo’! Depois que apareceram, ninguém mais fala com ninguém; são presentes de grego” (alusão ao cavalo de Troia, que trazia o inimigo escondido no seu interior).

Talvez valha lembrar que tivemos reação semelhante com o cinema e sua licenciosidade; com a televisão dentro de nossos lares e o perigo da programação imprópria para as crianças. Reagimos também à internet e ao seu conteúdo sem censura, a distribuir material pornográfico, e, de tantos modos, impróprio. Tememos por nossos filhos com o advento das redes sociais, naquela época acessadas apenas pelo computador da família, a exemplo do Orkut. Lembro-me de que o surgimento do YouTube deixou muita gente apreensiva, pois era uma janela aberta para vídeos de todo tipo: fossem pornografia, fossem sobre fabricação de bombas caseiras, fossem tentativas de aliciamento por radicais islâmicos.

Antes de jogar o celular (ou a televisão, ou o computador) no lixo, devemos considerar que esses recursos são como os ídolos: “Têm boca e não falam; têm olhos e não veem; têm ouvidos e não ouvem” (Sl 115). Nada são, se nossos corações não se deixarem dominar por eles. Caso contrário, tornam-se tiranos impiedosos.

Isso quer dizer que, tal como com um ídolo, um smartphone “nada é”, se nossos corações não lhe tiverem erigido um altar, para depois gemer sob seu chicote. E, como todo ídolo, seu alvo são as relações – com Deus, primeiramente, e com nossos irmãos, em seguida. Percebemos inclusive um paradoxo: nunca nossa comunicação foi tão fácil, e nunca ela esteve tão sucinta e superficial. Aliás, não é assim com o dinheiro? A princípio, facilita e até alegra a nossa vida, mas, ao ser invocado como Mamon, transmuta-se em demônio devorador da paz e da felicidade.

Creio que não devemos temer os ídolos, quando nada são. Os smartphones e tablets nada mais são que tecnologia. O poder que eventualmente tenham de nos isolar, de nos silenciar e nos separar lhes foi concedido por nós mesmos. E podem ser revogados, a qualquer momento. Basta que nossa conversão e devoção a Cristo cheguem a essa área prática da vida também. Quem sabe se nos escondemos atrás da telinha porque somos tímidos? Ou introvertidos? Quem sabe se já não éramos assim, muito antes de eles existirem?

É possível sim voltarmos a ter uma linda, cheirosa e barulhenta mesa de Natal, onde o tema de honra seja aquele menino que o velho Simeão reconheceu e carregou no colo. Basta que se combine assim. Dispostos os corações, alguém dirá: “Esta noite, nesta mesa, celulares, smartphones e tablets serão colocados no seu lugar – em nome de Jesus”. E todos dirão: “Amém!”.

Se for uma casa de músicos, certamente alguém se lembrará do cântico sobre o Salmo 138:

“Eu te louvarei, Senhor, de todo o meu coração;

Na presença dos deuses te cantarei louvores.”

Quem sabe, ali, surja a exortação de que devemos cuidar dos nossos corações, para que jamais tiremos os olhos do Criador, como nossa fonte de segurança, significado e esperança.

  1. Obrigado pela reflexão, Professor. Para mim smarfphones tem sido uma ferramenta para me aproximar de Deus e do próximo. Ou seja, do alvo supremo: “Amarás ao Senhor teu Deus sobre todas as coisas e ao próximo a ti mesmo”.

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