Semana 36: Lucas 9.46-48

Os discípulos começaram a conversar sobre qual deles era o mais importante. Mas Jesus sabia o que eles estavam pensando. Então pegou uma criança e a pôs ao seu lado. Aí disse: — Aquele que, por ser meu seguidor, receber esta criança estará recebendo a mim; e quem me receber estará recebendo aquele que me enviou. Pois aquele que é o mais humilde entre vocês, esse é que é o mais importante.

Admito. Algumas “lições” destas devocionais são repetitivas. Vire e mexa, encontramos Jesus criticando ou até ignorando a arrogância dos escribas e fariseus insistindo que faça “exegese” (a análise das Escrituras) do jeito deles justamente para prendê-lo nas suas armadilhas. Outras vezes a sua atenção volve para a indisposição, incompreensão e falta de fé dos discípulos. E não me sinto na obrigação de definir melhor que fé é esta. Por que? Porque estamos seguindo uma narrativa, um relato ainda em andamento. E estamos apenas no capítulo 9. Faltam mais 15 capítulos! E a elaboração do enredo de toda boa história não revela tudo de vez. Pouco a pouco se revela, o suficiente para prender o leitor, mas não suficiente para astragar o relato. Nos dois pequenos versículos acima vejo um acréscimo do desdobramento da mensagem dos Evangelhos: temos um pouco mais de informação sobre a fé e que significa anda nela. (Embora variada as suas abordagens e preocupações menores, nisto os quarto Evangelhos estão de acordo.) E embora a informação seja visual—trata-se de uma criança—a lição não é tão patente quanto parece e certamente não “fecha” ainda o assunto. É preciso que leiamos mais.

Não desemelhante à postura dos líderes religiosos que se opunham a Jesus, os discípulos também associavam espiritualidade e religiosidade com poder. Mas não como estes lideres religiosos, tal poder não era disputado com Jesus e sim, entre si. Disputaram quem era o maior entre eles. (Algo que de modo velado ou não fazemos infelizmente até os dias de hoje. Tanto pastores—não sou exceição—quanto os outros líderes na igreja tendem a ter um olho gordo quando consideram o ministério dos outros. Aprender dos outros, em si, não é nada mal. É bom. Mas a cobiça e a inveja, isto é outra coisa.) Agora voltando a narrativa de Lucas.

Jesus viu a disputa dos seus discípulos e queria apontar os discípulos para uma direção melhor. Mas veja bem o que Jesus não fez. Ele não fez uma “exegese”. Não que tinha nada contra a boa interpretação das Escrituras. Sabia fazê-la e mais importante, sabia quando fazê-la. E este não era o momento. Ao invés disto, usou um exemplo vivo. Aliás, este era o seu procedimento didático predileto. E o exemplo era o acolhimento de uma criança…

Dois esclarecimentos importantes… Primeiro, a “lição” não era a criança em si, mas o ato de recebê-la. Expositores da Bíblia frequentemente erram quando tentam tirar lições das caraterísticas e do comportamento de uma criança. Aqui, este não é o ponto, mas o ato de “receber” a criança. Jesus não está dizendo que seus discípulos deverão ser infantis, imaduros, anti-intelectuais ou coisas semelhantes. Também aqui neste lugar ele não está dizendo, como muitos dizem, que devemos ser dependentes (embora um espírito de dependência de Deus seja um bom atributo). Não é isto. Ele está dizendo (mais uma vez, se presta bem a atenção a narrativa toda) que os seus seguidores devem fazer como ele (e não como a criança em si). E o que Jesus estava fazendo? Ele simplesmente “pegou uma criança e pôs ao seu lado”. Agora, confesso que a tentação de moralizar a partir deste ato é muito grande. Mas vou resistir porque acredito que a imagem do ato deverá comunicar por si só. Pensa tu no tipo e procedimento do teu ministério…

Em segundo lugar, reparemos a exortação de Jesus e novamente, a ênfase nem tanto na criança em si, mas no ato de recebê-la:

Aquele que, por ser meu seguidor, receber esta criança estará recebendo a mim; e quem me receber estará recebendo aquele que me enviou. Pois aquele que é o mais humilde entre vocês, esse é que é o mais importante.

Efetivamente Jesus está dizendo: “Quer mesmo ser importante? Então faça como eu. Priorize os mais negligenciados, mesmo quando estes menos contribuem, aos olhos dos homens, à sua importância.” E agora vem a lição com um detalhe que geralmente não não se vê: “Aquele que … receber esta criança”. Nem esta (NTLH) e nem as habituais traduções pegam bem a ideia deste verbo. Uma tradução melhor seria: “Aquele que … por começar a receber esta criança”. Talvez pareça estranho, mas estou sugerindo uma tradução mais ao pé da letra do verbo, hupárcō, um composto de humo, significando neste caso, “por”, e apárcō, significando “começar” ou “fazer um começo” (o substantivo é usado em João 1.1, “no princípio ero o Verbo”).

Entendeu? Se eu estou entendo direito (e claro, pode ser que não), Jesus está dizendo que os discípulos precisam começar a mudar a sua postura, treinar fazendo como Jesus, dando importância para os mais fracos e assim tirando os olhos da alta grandeza.

Mas quem sabe, você tem um outro enfoque e queira compartilhar…

Oração

Eterno Pai, há tanto que não entendemos porque o coração escurece a clareza. Que possamos seguir o exemplo de Jesus e não as próprias ambições. No nome dele. Amém.

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