Histórias de esperança para quem vê o coração
Elsie B. C. Gilbert
Educadores em todos os tempos reconhecem que um dos caminhos mais diretos para o coração das crianças é uma história bem contada. Outro caminho é a brincadeira que muitas vezes vêm acompanhada de canções, cirandas e muitas risadas. E o terceiro caminho é o convite à participação. As crianças amam contribuir para uma causa maior, para melhorar o mundo ao seu redor.
E o que todo educador também sabe é que o coração da criança é algo misterioso, profundo e que demanda todo cuidado e reverência.
Veja como estes dois educadores poloneses, em situações extremas, ousaram insistir em seus esforços para acompanhar crianças em situações nunca vistas antes. Tanto Helen quanto Januzs agiram a mando de uma consciência ética altamente desenvolvida, a partir de valores que enxergam dignidade nos seres humanos, mesmo quando muitos ao seu redor só tinham ódio e desprezo.
Em situações de maldade extrema, a esperança está no fato de que aqui e ali se sobressai a incrível capacidade humana de colocar o outro em primeiro lugar.
Helen – Recentemente Neil Gaiman, escritor inglês radicado nos Estados Unidos cujas obras literárias lhe dão um lugar de destaque na Sociedade Real de Literatura da Grã-Bretanha, contou para o mundo como a história de uma prima lhe serviu de inspiração para continuar criando histórias.
A prima Helen (ele não dá o sobrenome), introduziu-se no Gueto de Varsóvia na Polônia, porque queria alcançar as meninas que viviam ali de forma muito precária. Os corpos dos que morriam dentro do Gueto eram levados para fora todas as manhãs e os caixões voltavam vazios. Helen conseguiu entrar num caixão vazio no caminho de volta e desta forma se infiltrou no pior lugar que alguém poderia estar na Polônia subjugada pela Alemanha Nazista. (Antes da vitória das Forças Aliadas e liberação da Polônia, a grande maioria dos judeus que viviam no Gueto de Varsóvia, uma população estimada em 370.000 pessoas, seguiram para campos de extermínio como a Treblinka onde morreram em câmaras de gás.)
Ela passou a dar aulas de matemática e gramática para as meninas ali. Neste tempo, a posse de um livro se tornou ilegal e passível da pena de morte. Ela contrabandeou consigo uma cópia em polonês do livro E o Vento Levou escrito por Margaret Mitchell. Lia o livro tanto quanto possível até tarde da noite, escondia o livro, e contava para as meninas no dia seguinte mais um capítulo na vida da heroína Scarlett O’Hara. Era uma forma de transportar as meninas por apenas uma hora daquela realidade tão dura e cruel para um outro mundo. Ao final da guerra, Helen e duas irmãs conseguiram fugir da Polônia para um campo de refugiados no sul da Europa e de lá emigraram para os Estados Unidos. Em 2015, quando Neil Gaiman contou esta história, ela tinha 96 anos de idade e morava na Flórida.
Janusz Korczak (1878 – 1942), judeu e polonês, também teve que enfrentar os horrores do Holocausto em Varsóvia. Foi médico pediatra, filósofo da educação, escritor, autor infantil, publicista, ativista social, oficial do exército da Polônia e diretor de dois orfanatos. Um homem brilhante cuja maior dedicação sempre foi voltada para as crianças. Seus métodos de trabalho com as crianças no orfanato Dom Sierot (A Casa dos Órfãos), instituição fundada e governada por ele, gerou admiração de pessoas como Jean Piaget. Ele acreditava nas crianças. Instituiu entre elas um “tribunal” onde seus problemas eram deliberados e decididos coletivamente. Chegou a publicar uma revista com os escritos das crianças.
Nos anos iniciais da Guerra, quando o horror nazista começou a se revelar e as esperanças por um dia melhor começaram a esmorecer, Janusz escreveu a história de um rei menino cujo nome era Matt. Este rei, resolveu criar em seu país um parlamento regido por crianças ao lado do parlamento dos adultos. Assim, Janusz, ao contar uma história, comunicava com as crianças o seu sonho por um mundo melhor para elas. Vários de seus amigos não judeus em lugares de influência tentaram orquestrar uma fuga para ele do Gueto de Varsóvia à medida em que o inimaginável se tornava realidade: o genocídio sistemático de centenas de milhares de judeus. Mas Janusz nunca aceitou a ajuda porque dizia: “Não se abandona uma criança doente no meio da noite, não se abandona as crianças em tempos como estes”.
E foi assim que em agosto de 1942 ele marchou acompanhado de 200 crianças do orfanato para a estação de trem que os levou para a Treblinka onde foram exterminados.
Entre seus muitos escritos, encontra-se uma frase relevante para todo Educador Social Cristão: “A alma de uma criança é tão complicada e cheia de contradições quanto a nossa”. Estes dois educadores poloneses são admiráveis porque souberam levar a sério o coração das crianças em circunstâncias em que talvez a maioria de nós optaria por soluções práticas e quem sabe autoritárias.
Participe da Campanha Meu Educador Social Cristão, (clique aqui!)