Talvez, por sua dramaticidade, a celebração da Páscoa por Jesus seja o momento mais visível da ação reconciliadora de Deus. Sim, naqueles dias de paixão é possível perceber que “Deus estava, em Cristo, reconciliando consigo mesmo o mundo” (2Co 5:19). Entretanto, fico perplexo com a ideia de que naquelas conversas do monte da transfiguração, no Cenáculo ou no Getzêmane, Jesus estivesse sendo aperfeiçoado. Vejam:

Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as coisas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse, por meio de sofrimentos, o Autor da salvação deles. (Hb 2:10).

Ousando um paralelismo de linguagem, eu diria que Deus estava, em Cristo, aprendendo sobre o sofrimento humano (Hb 5:7-10). “Embora sendo Filho, aprendeua obediência pelas coisas que sofreu” (Hb 5:8).

Imagino o espanto dos primeiros cristãos, diante desses trechos da Carta aos Hebreus. Jesus sendo aperfeiçoado?!

Meu pensamento é que Deus, em Cristo, estava amando o mundo de uma maneira difícil de compreender (Jo 3:16). Não apenas com um amor imenso; aquele que vê o necessitado, compadece-se dele e toma providências, ainda que sacrificiais (esse é o significado da palavra caridade). Mais que isso, vejo na Páscoa um Deus que deseja ser amigo; que quer estar tão próximo que se oferece ao aperfeiçoamento e à aprendizagem que provêm da convivência conosco, em nosso dia-a-dia. Oferece-nos uma aliança do tipo “tudo o que é meu é teu”.

Ele já não se contenta em nos ser “apenas” Senhor; quer mais; quer muito mais, quer ser pai amoroso, abba; quer que seu Filho seja o primogênito entre muitos irmãos; quer fazer-se o servo da casa, e também fiel sumo sacerdote, quando tiver aprendido, por meio de sofrimentos, a compadecer-se das nossas dores e mazelas. Agora, “pelas coisas que sofreu” entre nós, por nós e à nossa semelhança, tornar-se-ia capaz de uma intercessão misericordiosa e perfeita.

Deus estava, em Cristo, penso eu, maravilhado, aprendendo com nossas dores, do mesmo modo que um obstetra gostaria de aprender sobe a maternidade, engravidando. Mas, se for um homem, não lhe será dada a parte mais rica desse conhecimento: a experiência. Entretanto, se ele fosse Deus, escolheria fazer-se mulher e dar à luz um filho. Então ele saberia o que não está nos livros.

O exemplo de Jesus ficou. À sua semelhança, devemos permitir que o Pai transforme nossas dores relacionais em aperfeiçoamento, ensinando-nos a lavar os pés uns dos outros com alegria.

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